QUEIMA
DE PALHA 1 -- 13 JAN 18
Quem
diria, afinal? Tudo o que faço
torna-se
palha, por mais doce seja!
Esse
é o problema do ouro que se enseja
da
palha transformada em meu regaço...
A
palha, ao menos, traz da relva o traço
e
até pode ser comida. A palha beija
minha
língua, embora a arranhe enquanto esteja
entre
meus dentes ocupando espaço...
Porém
o ouro em que a transformo não se come,
apenas
se açambarca e se entesoura,
enquanto
eu, a mãos cheias, distribuo...
Sou
ourives da vida e a vida some
tudo
o que crio. É outrem que o devora,
pagando
apenas com seu desdém e amuo!
QUEIMA
DE PALHA 2
Mas
pouco importa o que a vida nos devore.
O
quanto faço se amalgama em ouro,
meus
percalços transformados em tesouro,
Que
diferença se é só latão que eu doure?
Que
o pasto murcho com meu sangue enflore,
que
da carcaça eu conserve o melhor couro,
que
dê ao sonho injustiçado melhor foro
ou
torne do outro em luz o que deplore?
Pois
sou o ourives de qualquer cilada
e
com a mínima coisa me comovo,
de
tal forma que a transforme em arrecada
entrelaçada
de quimera em desvairada,
que
o barro e a poeira de um rubi removo
e
os lanço ao vento, sem guardar mais nada!
QUEIMA
DE PALHA 3
Sobre
o Rei Midas afirmaram no passado
que
tudo em ouro podia transformar,
para
de fome finalmente se acabar
a
sua existência, após o pão ter transformado.
Também
o Toque de Sadim foi mencionado,
um
irmão seu, o qual tudo iria mudar
em
pura palha, sem sua fome mitigar:
embora
opostos, no final o mesmo fado...
Mas
não é assim comigo. Eu tomo a palha
de
minha vida e a transformo em verso,
em
alimento do mundo assim converso;
tristezas
e obstáculos, cada falha,
sem
que por isso me prive de algum pão,
por
mais que lascas te dê do coração.
QUEIMA
DE PALHA 4
A
esta altura, pensarás, talvez
em
como é presunçoso esse poeta!
Tem
pretensão que a alma te completa
com
tantos versos inúteis que já fez!
Tudo
depende da forma como os vês:
cada
verso é destinado a alma inquieta;
se
não à tua, a outra fez repleta,
talvez
pirita e não ouro em seu jaez.
É
só essa a pretensão. Que se destina
cada
soneto indo a qualquer desconhecida,
para
quem essas palavras tragam bem;
Tenho
esmeraldas e rubis na vasta mina
e
se um não pode enriquecer tua vida,
quem
sabe um outro se destine a ti também?
Agradáveis leituras!
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