segunda-feira, 9 de novembro de 2020


 

 

O PAÍS DA JUVENTUDE

(Skaz (Conto de Fadas) Russo, recontado por Victor Hugo,

adaptado e versificado por William Lagos, 5 SET 2019)

 

O PAÍS DA JUVENTUDE – Segunda Parte (Final)

 

O PAÍS DA JUVENTUDE VII

 

“Eu mesma estive já nesse país,

mas essa água é muito perigosa;

a prova sou dessa cura perniciosa,

sou Dmitrievna! – E por orgulho, eu quis

tomar a água mil anos para atrás!

Era uma jovem de coraçao vaidoso,

uma princesa, mas de pendor maldoso...

Tinha saúde, beleza e quanto apraz...

 

Mas eu queria a meu povo dominar,

após a morte do senhor meu pai;

tomei a água, julgando que me vai

dar longa vida, que queria conquistar!

Pois de fato, a vida longa consegui,

mas como tinha o coração impuro,

outro destino conferiu-me duro:

deixei a ilha e para aqui parti...

 

Já na viagem senti-me envelhecer;

os marinheiros me olhavam, desconfiados,

por minha presença a se sentir amaldiçoados

e nesta praia deixaram-me a morrer;

qual um castigo, o seu barco naufragou

e não morri, mas dez séculos já faz,

a juventude que a alegria nos traz

perdida foi, que tal castigo me tocou!

 

O PAÍS DA JUVENTUDE VIII

 

“Naturalmente, não me reconheceram:

Você não é Dmitrievna, afirmaram;

as jóias e as roupas finas me tomaram

e nem meus pais me aceitar puderam;

alguns queriam que eu fosse condenada

por Dmitrievna ter assassinado,

mas como nada disso foi provado,

somente fui nesta praia aqui exilada...”

 

“Mas vejo bem seu coração ser puro,

que só deseja a cura de seu pai;

a água da vida lhe fazer mal não vai,

caso não seja a seu ideal perjuro...

O que eu desejo agora é só dormir,

pois já vivi demais nesta velhice...

Se novo frasco da água conseguisse

de mais mil anos conseguiria fugir!...”

 

“Desse modo, vou ajudá-lo, meu rapaz,

pois sua missão merece o meu apreço,

mas no retorno deverá pagar-me o preço:

será metade dessa água que enfim traz!

Mas antes disso, vou-lhe dar mais um aviso:

há uma fada na fonte adormecida,

por dois dragões ferozes protegida,

adormecer aos quais será preciso...”

 

O PAÍS DA JUVENTUDE IX

 

Assim falando, foi seguindo pela praia,

até encontrar a concha mais formosa:

“Música toca, se soprada cuidadosa;

cada dragão fará que em sono caia...

Vamos agora providenciar sua condução...”

Disse Dmitrievna, num esgar brejeiro.

Soprou depois na concha, bem ligeiro,

E uma baleia aproximou-se então.

 

“Vamos ver se realmente é corajoso”

disse-lhe ela, seu sorriso mais aberto.

“Essa baleia o levará, por certo,

até a ilha do elixir tão milagroso...”

Vladimir, meio receioso, embora,

montou nas costas da vasta baleia,

que o levou até a praia em que se apeia,

o animal a esperá-lo nessa hora.

 

E avançou, com o máximo cuidado,

até a fonte, os dois dragões a enfrentar,

mas quando foi a melodia assoprar,

uma fera adormeceu de cada lado...

Também estava ali adormecida,

Vassilissa, a fada dessa fonte:

teve o efeito contrário esse desponte,

pois ela abriu seus olhos para a vida!...

 

O PAÍS DA JUVENTUDE X

 

Vladimir logo dela enamorou-se,

meiga a doçura dessa fada bela

e também dele se agradou essa donzela:

por muitos dias o casal acarinhou-se,

os dragões a vigiarem mansamente,

sem representar a Vladimir qualquer perigo...

“Não posso mais continuar no seu abrigo,”

disse o príncipe, bastante tristemente.

 

E reiterou-lhe o motivo da viagem,

de que modo Dmitrievna o ajudara;

depois que tantas peripécias escutara,

Vassilissa deu apreço à sua coragem

E dois frascos lhe deu da água da fonte,

com seu retrato um custoso medalhão:

que o guardasse bem junto ao coração,

que a lembraria por mais longe o seu remonte.

 

Assim Vladimir se despediu, saudoso já,

jurando à fada que somente a morte

o impediria de retornar, consorte,

para o lugar em que o veraz amor está...

e retornando, no dorso da baleia,

chegou à praia em que Dmitrievna estava;

deu-lhe um dos frascos e viu se transformava

em linda jovem que a tentação lhe ateia...

 

O PAÍS DA JUVENTUDE XI

 

De fato, a jovem o prendeu num beijo,

mas em seus braços a seguir desfalecia

e nesse beijo assim lhe agradecia

pela morte recebida nesse ensejo...

Vladimir sepultou-a com cuidado

e encetou a viagem de retorno,

cruzou as montanhas e, num dia morno,

em Samarkand ingressou, já bem cansado...

 

E ao encontrar ali seus dois irmãos,

ingenuamente lhes narrou o acontecido;

pelos malvados foi então ferido,

dado por morto e jogado nuns lixões...

Mikhail e Alexander retornaram

e descobriram que seu pai ainda vivia:

logo da água da vida ele bebia;

que Vladimir morrera, lhe contaram,

 

durante a empresa que os três realizaram,

para obter essa água tão preciosa;

ante seus olhos, mudança houve, portentosa:

curou-se o Tzar e seus traços remoçaram,

parecendo ser um jovem novamente...

Por boa sorte, assistiram os conselheiros

e ao Tzar, em tons alvissareiros,

reconduziram ao trono, alegremente!

 

O PAÍS DA JUVENTUDE XII

 

Então o rei, em sua gratidão,

nomeou os seus dois filhos vice-reis:

“As duas metades do país governareis,

até que chegue de minha vida a conclusão!”

Mas Vassilissa, estranhando essa demora,

recordou de Vladimir a fiel promessa

e seu buscar por ele nunca cessa,

até que enfim o encontrou em triste hora...

 

Porém serviu-lhe mais água da vida

e o bom principe recobrou-se inteiramente;

a traição foi descoberta facilmente,

e a punição dessa maldade decidida:

voaram ambos no dorso dos dragões,

até encontrar os dois irmãos malvados,

pelo fogo dos dragões foram queimados,

indo ao Tzar explicar as suas ações.

 

Depois voltaram ao País da Juventude,

onde casaram e até hoje vivem,

com muitos filhos e netos já convivem,

sem doença sofrer ou senectude...

Já o Tzar, que tanto remoçara,

casou-se novamente e novo herdeiro,

para ocupar seu trono bem certeiro,

com a nova esposa gerou que desposara!

 

 


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