(FOTO RARA DA ATRIZ FAY WRAY, PRIMEIRAS DÉCADAS DO SÉCULO VINTE)
SOMENTE I - 26 AGO 19
Eu não quero fazer
qualquer soneto agora,
só depois que eu voltar:
aí, então, farei,
dependendo de como o
tempo desgastei,
se foi contigo ou na
sombra de um outrora...
Eu não quero fazer
nenhum poema à hora
de partir para ti,
inconsciente se terei
os teus olhos de vinho,
se beijos ganharei,
se juntos gozaremos
orgasmo que amor doura.
Eu não quero fazer, mas
versos assanhados
me sobem desde as
gônadas, assim descompassados,
e se entregam a ti, num
beijo de martírio...
Queria então saber se a
dúvida conversa
em certeza seria, à luz
do meu delírio,
ou em versos apenas
seria então dispersa...
SOMENTE
II
Possui
toda mulher qualquer sabedoria
que
falta ao homem movido por razão,
pior
ainda, no controle da emoção:
conhece
coisas que só ela saberia.
E
salvo algum a quem a vida ensinaria
como
burlar a mulher em direção
que
mais conduza ao que tem por intenção,
que
busca mesmo obter por vilania,
é
a mulher que demonstra maestria
nesse
jogo de amor, mesmo inconsciente,
por
mais que hormônios a queiram dominar
peças
movendo na aparência de folia,
mas
cuja inconsequência é apenas aparente,
pois
o alvo reconhece e bem sabe alcançar...
SOMENTE
III
O
homem, no entretanto, por mais seja romântico,
por
mais pretenda agir racionalmente,
contra
o impulso hormonal vê-se impotente,
em
torno dela a entoar constante cântico,
“Eu
te amo!” a repetir, em verso quântico,
sempre
na espera de obtê-la totalmente,
com
mil agrados na busca assim frequente,
repetição
constante de um som mântrico.
E
assim sou eu, por mais seja veraz
o
mantra que repito diariamente,
a
cada vez que meu olhar se embaça,
em
nosso encontro a desfrutar da paz
que
após o amor no corpo se apresente,
nessa
certeza que o tempo descompassa!
DECLÍNIO
I – 27 AGO 19
Amei
profundamente, como nunca
Amara
antes ou hei de amar um dia:
Aquele
amor de entrega, que te junca
De
ansiosas intenções de rebeldia,
Contra
o mundo, o dever e a sociedade,
Aquele
amor que enfrenta e que escolhia
Trocar
pela mulher, sem mais saudade,
Tudo
quando no antanho se queria!...
Mas
esse amor se foi desvanecendo,
Foi
morte delicada, sem trovão,
Por
mal correspondido e por descaso,
Sendo
amor somente inútil, cujo ocaso,
Por
ser mal retribuído, foi doendo,
Até
que enfim murchou no coração...
DECLÍNIO
II
Há
tanto amor como esse neste mundo!
Há
tanto homem que insiste até morrer,
Sem
ter em conta seu imenso padecer,
Nessa
aguardança do prêmio mais profundo...
E
que se afoga em pensar meditabundo,
Por
alcançar o antigo alvo e perceber,
(Maior
ainda o espasmo do sofrer!),
Que
não era em absoluto assaz rotundo,
Como
esperava, após tanta insistência...
A
dama cede, talvez por desfastio,
Ou
por nada de melhor ter conseguido,
Ainda
assim a tratar com impaciência
Esse
amante e a destroçar-lhe o brio
Por
nessa esmola de amor ter insistido!
DECLÍNIO
III
Amor
nos vem, amor se vai, risonho,
Tantas
flechas que tem no seu carcaz,
Quanta
ilusão qual verdadeira faz
No
coração que domina assim bisonho...
E
em tudo isso, o que há de mais medonho
É
que esse amor defunto nunca jaz
Na
sepultura que o seu declínio traz,
Mas
alevanta a face em novo sonho,
Perturbando
o novo amor recompensado
Pelo
amor de quem se encontra a nosso lado
E
a quem amamos até sinceramente,
E
como zomba esse fantasma do passado,
Que
nosso corpo atravessa, de inclemente,
Por
mais que o novo amor tenha chegado!
ESPASMO I – 28 ago 2019
Por ti serei capaz de mil proezas
tentar: por conservar-te do meu lado;
meu coração já foi despedaçado,
mas recompôs depressa suas defesas,
a um ponto de as tornar de novo tesas,
estava mudo e cego, desconfiado,
ou antes certo que amor atribulado
as emoções não deixaria ilesas...
É de espantar que eu tente novamente!...
--- depois de tanto esgar, de tanta mágoa,
encher de ti de novo o coração;
depois de ver em ti, indiferente,
a voz e o olhar, uma seca, outro sem água,
nesse estertor sutil de uma ilusão...
ESPASMO II
E contudo, como é forte essa quimera
que o peito infunde num esgarçar de sonho!
Quanto esforço nessa busca então reponho,
por mais que enxergue derretida a cera
de meu círio, no momento em que se abeira
de ti, num riso alvar, triste, bisonho,
quando minha alma sem temor exponho,
quando a certeza desse amor jamais se altera,
por mais que falecida se encontrasse
de seu realizar toda a esperança...
Até que ponto numa ilusão se alcança!
Até que ponto amor pode ser cego,
nessa sua busca febril por mais apego,
onde apenas mais desdém ali se achasse!
ESPASMO III
O fato é que esse amor foi espasmódico,
por cada vez que desisti, recomecei,
na mesma senda em que tanto tropecei,
para colher maior sofrer sendo metódico...
enquanto foi para ela apenas lúdico,
talvez somente a sua piedade achei,
se nisso existe amor, vencer não poderei,
nem mesmo no ideal mais puro e búdico!
Porque esse amor requestado em demasia,
recalcitrado em laivos de paciência,
nunca obtém a sua completa fruição,
pois no final, quando a dama consentia,
logo partia ante a primeira desavença,
sem sentir nada enraizado ao coração.
ESTOPIM I – 29 ago 19
Atualizei o amor, como um arquivo,
Que se baixa da rede... mais sinais
Do que se pode perceber, fanais
Das possibilidades que revivo
De um começo novo, de um altivo
Mostrar ao mundo tudo, quanto mais
Se está disposto a pagar pelos totais
Prazeres de um querer tão redivivo...
Porque é estranha, afinal, é caprichosa,
Nem sequer a si mesma se compreende,
Dominada, por sinal, pela emoção
Que apela a mim também: é contagiosa
Esta musa fatal, que só se acende
Quando sente algum tremor no coração...
ESTOPIM II
Não que pretenda, no real, ser minha musa,
Pois ela insiste em ser si mesma, apenas
E assim me envolve em laços às centenas,
Sem sequer apresentar qualquer escusa...
E no inesperado de afeição profusa,
Aceita os ramalhetes de açucenas,
Contudo é pertinaz como as dracenas
E nenhum corte afeta a sua recusa...
Somente quando quer é carinhosa
E muita vez enrola-se em mutismo,
Tal e qual se a estivesse a aborrecer...
Mas no momento seguinte, caprichosa,
“Estou atacada!” – declara, sem sofismo,
Um sorriso a me mostrar de bem-querer...
ESTOPIM III
E desta forma, sempre que me achego,
O seu amor por mim eu atualizo,
Algumas vezes sem razão ou siso,
Enquanto afirma conservar-me apego...
Mas que isso me perturbe jamais nego,
Por mais que seja meu coração altivo,
Esse constante atualizar revivo,
Não manipulo tal arquivo cego...
Então ressurge nela esse tremor,
Que a compele, enfim, para meus braços
E rendo graças, porém de pé atrás,
Por ver a estranha constância desse amor,
Manifestado em tão diversos traços,
Mas cuja posse plena nunca traz...
INADEQUADO
I – 30 ago 19
de
certo modo, eu sou inexperiente:
há
certas situações, certos momentos
por
que nunca passei, atos nojentos
que
partilham os outros, tão frequente!
não
me agrada mentir, nem caluniar,
nada
fiz proposital que a alguém magoasse,
nunca
quis competir, por mais buscasse
o
mesmo bem que os outros alcançar.
e
assim, se alguém diz que me acredita,
eu
creio de inocente; e então me altero,
ao
passar outra vez por desenganos,
ao
perceber, enfim, que em mim palpita,
no
fim das contas, um coração sincero,
que
conserva a pureza de oito anos...
INADEQUADO
II
não
que o esteja de fato a lamentar,
pois
tenho meus valores e os conservo;
das
influências alheias não sou servo,
nem
fico os comerciais a acompanhar.
contudo,
vejo tanta coisa a se mudar!
esses
valores que fiel preservo
são
meio antigos, mas nisso me reservo,
tenho
o direito de o que amo conservar.
pois
até hoje não comprei um celular!
minha
esposa e meus filhos têm os seus,
até
mesmo meus netos já têm um...
temo
que o mundo venha a me obrigar;
tantos
aplicativos há que não são meus,
porque
jamais desejei baixar nenhum!
INADEQUADO
III
e
reconheço como nisso estou atrasado:
não
posso acompanhar o falatório
de
what’saps, instagrams e palanfrório,
talvez
eu seja realmente ensimesmado!
por
videogueimes nunca fui interessado,
nem
joysticks, que empregam qual
cibório,
sacudindo
diariamente esse velório
de
mil horas de tempo descartado!...
ao
invés disso, o meu perene apego
é
pela música erudita em elepê (*)
ou
em cedê, mas não em devedê...
não
que me mostre para um filme cego,
mas
na verdade, sou mais um auditivo
e
para a estética sou bem mais sensitivo.
(*) LP, o que hoje estão chamando de vinyl.
INADEQUADO
IV
muitas
horas já passei a contemplar
algum
quadro ou escultura num museu
ou
simples cópia que o pecê me recolheu,
à
qual concedo este meu pleno apreciar...
e
ao mesmo tempo aprecio classificar
meus
milhares de selos... como ateu,
em
simples culto ao tesouro que foi meu,
por
muitas décadas nesse esforço de juntar...
e
leio ainda livros aos milhares,
quase
sempre em sua língua original,
todos
eles com bom cheiro de papel!...
sem
apreciar os seus modernos pares,
esses
pixels de qualquer livro
digital,
inadequado
como um monge de burel!...
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