domingo, 13 de dezembro de 2020



TRANSFUSÃO


 

NASTASSIA KINSKI VINTAGE

 

TRANSFUSÃO I – 7 jan 2020

ao longo das andanças, és glóbulo em meu sangue;

sem ti não sobrevivo, hemácia de minha vida,

proteges qual plaqueta, ante qualquer ferida

e impedes que minhalma se escoe e torne exangue;

em tua ausência a mente e o corpo todo enlangue,

fatal leucopenia abrindo ao mal guarida;

porém se te pressinto junto de mim, querida,

um novo impulso faz que o espírito arremangue,

só de pensar em ti, afastado da anemia,

cadeia perniciosa, que as fibras de meu ser

embranquecia em fome e emurchecer de nostalgia,

mas esse pensamento revitamina o ter,

linfócito gentil de quem eu mais queria,

que a própria natureza enfrenta em meu viver.

 

TRANSFUSÃO II

deixado a mim somente, desgasto meu vigor;

macrófagos que tenho não são ilimitados

e nessas mil batalhas vão sendo exterminados,

sem a medula produzir em quantidade superior

ou mesmo igual às dos assaltos do invasor,

nas combates diários em mim sendo travados,

quaisquer portões abertos a serem encontrados

por tantas bactérias em múltiplo furor!

contudo, bem mais fácil defende-se o organismo,

mantida a pele íntegra e ileso cada acesso,

do que o couro da alma cortado em romantismo;

somente o teu amor reforça a proteção,

da inveja o vírus a impedir o ingresso,

tuas tropas de carinho a envolver-me o coração!

 

TRANSFUSÃO III

meu espírito de igual modo envolve-se no teu,

para da vida enfrentar os ataques quotidianos,

maléficos que sejam os seus ideais profanos,

com seus sorrisos falsos de esperto fariseu;

assim só tua presença fará íntegro o meu

organismo espiritual, brotado dos arcanos

atos de amor na vida, somente soberanos

contra qualquer fraqueza que no peito se escondeu;

por isso te procuro, na espera de que aceites

fundir teu corpo ao meu em mágicos deleites,

fundir tua alma à minha em mística vertente,

que o sangue de tua alma ao meu se unifique

e que nossa defesa assim se multiplique

e juntos enfrentemos qualquer mal que se apresente.

 

RAÍZES DO VENTO I – 8 JAN 20

 

SE O CONTATO DOS OLHOS NOS CEGAVA,

O SILÊNCIO ERA TOTAL ESCURIDÃO,

NOS TÍMPANOS A TANGER CRUA EMOÇÃO

QUE AOS OLHOS AFASTADOS DOMINAVA.

A AUSÊNCIA DESSE OLHAR DESCONCERTAVA,

LEVE MOLDURA SOBRE A ORLA DA PAIXÃO;

SE REALMENTE PERCEBIA A GRADAÇÃO,

AS CORES EM NUANCES PERCOLAVA.

 

O SOM SE INSURGE EM MALGA DE MARTÍRIO

E A IMAGEM SE ALICERÇA NUM DEGREDO,

A LÍNGUA MUDA OLFATA MAIS PERFUME,

CADA NARINA A ABRIR-SE COMO UM LÍRIO

E A GLOTE A AMPLIFICAR ESSE SEGREDO,

IRÁ MOSTRAR AO MUNDO A DOÇURA DO AZEDUME

 

RAÍZES DO VENTO II

 

SE  O VENTO NOS TRANSPORTA QUALQUER IDEAL ALENTO

DE FORMA ALGUMA BROTA DE SECAS TEMPESTADES,

DESÉRTICAS AREIAS RESSUMBRADAS DE MALDADES

E NEM DE CATARATAS DE HÍDRICO PORTENTO;

O VENTO QUE NOS TRAZ O MEIGO SENTIMENTO

DE TEUS CABELOS BROTA EM PERFUMADAS GRADES

E EXALA DE MINHA BARBA ENVOLTO EM MIL SAUDADES,

EM MÚTUO REDEMOINHO A GERAR DOCE MOMENTO.

 

OS OLHOS O PERCEBEM POR MAIS SEJA INVISÍVEL

E A LÍNGUA PROVA O AR IGUAL QUE COBRA O FAZ,

BEM MAIS PERFEITA ASSIM A IMAGEM QUE PERFAZ

ESSE VENTO SUTIL DE AMOR INEXAURÍVEL,

QUE VOLTA PARA TI DEPOIS QUE ME ABENÇOE

E VOLTA PARA MIM COM QUANTO AMOR ME DOE.

 

RAÍZES DO VENTO III

 

SOMENTE UM VENTO PODE A BÊNÇÃO NOS TRAZER,

ESSE VENTO A CRESCER DIRETO DA RAIZ

QUE TRAZES NO TEU PEITO E QUE PLANTAR EU QUIS,

TOMADA EM DISTRAÇÃO, PRESTES A ADORMECER;

ESSA SEMENTE EU TINHA, MAS SEM PODER CRESCER,

DE TI ME APROVEITEI, TOCAIA QUE TE FIZ;

NÃO SEI SE JÁ ESPERAVAS, ANSIOSA NA CERVIZ

OU FOSTE INADVERTIDA MEU SOPRO A RECEBER.

 

MAS CERTAMENTE EM MEU PEITO ERA PEQUENO

E SOMENTE NO TEU PODERIA SE ABRIGAR

E INVISÍVEL CRESCER DESMESURADAMENTE;

EU O ABANEI COM LEQUE E LHE DESTE TEU ACENO

ATÉ O PONTO EM QUE SE FEZ DESABROCHAR

E AGORA NOS ENVOLVE EM RITMO INDOLENTE...

 

OLHOS CANIBAIS I – 9 JAN 20

 

Acreditavam os povos primitivos

que tinha a própria imagem sua magia:

ao ver-se refletida, a gente cria

que sofresse de danos abusivos.

 

De modo igual, qualquer fotografia

parte da alma tomava em seus arquivos,

quiçá a alma inteira em tais esquivos

meandros que essa imagem percorria!

 

Assim reflexo possuiria tal poder

que do ser vivo tomaria seus espólios,

cobrando-lhe obediência, fé e sexo...

 

e me percebo assim, em meu querer,

já que levaste minha alma nos teus olhos

e de mim eu só guardei fraco reflexo...

 

OLHOS CANIBAIS II

 

Porém guardo dentro em mim o teu reflexo,

que é no interno das vistas dominante

o olhar inteiro a me levar por diante,

minha própria imagem em solitário nexo.

 

E se busco em bacia outro complexo,

nessa magia de pobre hierofante,

contemplo apenas tua imagem, delirante,

de minha própria sequer achando amplexo...

 

então, ansiado, vou buscar o espelho

e lá estou eu, em pálida figura,

estendo os dedos a tocar o vidro frio...

 

e lá do fundo, a brandir teu relho,

firme se encontra a tua imagem pura,

meu próprio rosto um contorno como fio...

 

OLHOS CANIBAIS III

 

Pois nesse relho meu reflexo dominas,

mas sem qualquer intenção de chibatear,

são suas cordas sobrancelhas a piscar,

seu cabo o beijo com que me assassinas

 

qualquer busca infiel de alheias sinas

e me contento somente de ali estar,

quase forçoso para mim te contemplar,

de tuas expressões coletando vastas minas...

 

Mas não me importo se o reflexo devores

com teus olhares de afagos canibais,

pois dentro deles me vejo refletido,

 

ali encontrando pleno abrigo dos temores

de que outros olhos me devorem mais,

dentro dos teus todo o meu ser mantido.

 

AUSÊNCIA DE MIM I – 10 JAN 2020

 

Quando olho no espelho, meu reflexo

Não mais se manifesta.  Ali vejo, através

De mim mesmo a dor e as cruas fés

Desses livros que perderam todo o nexo;

Só ali vejo das paredes o amplexo

Das emoções que se tornaram rés,

Esvaziadas de mim, em seus sopés

Que me sugaram teus olhos cor de sexo...

 

Não tenho mais de mim que a transparente

Casca vacúa de sonhos mortos e prazeres,

A refugiar-me troglodita em meus deveres...

 

Porque nunca dominarei a indiferente

Mente irrequieta que roubou-me a alma

E me deu tranquilidade sem ter calma...

 

AUSÊNCIA DE MIM II

 

Enquanto estava perto, seu amplexo

Adstringente e ácido de fruta

Afastava de mim, nessa permuta,

Qualquer desejo de buscar alheio sexo;

Mas afastada de mim, perdeu-se o nexo,

Meu reflexo armazenado nessa gruta

De seus olhos, sem qualquer ânsia de luta,

Só habitando das pupilas o convexo.

 

E se partiu para qualquer lugar distante,

Ou apenas se fechou dentro da mente,

Consigo me levou inteiramente...

 

Sem haver como escapar-me desse guante

E só me resta contemplar o meu vazio

Nesse espelho em que não choro e que não rio.

 

AUSÊNCIA DE MIM III

 

Assim eu busco no reboco das paredes

As antigas emoções que se apegaram

E pelos interstícios se alastraram,

Restos de mim em solitárias redes;

E em todo o tempo que de mim ausente quedes

Nada posso encontrar do que restaram

Nesse espelho vazio, de que saquearam

A minha imagem para alheias sedes.

 

As paredes eu contemplo, compelido,

Aqui acho trecho, ali acho retalho,

Que vou pregando em tal vidro arredio.

 

Formo uma imagem do rosto perseguido,

Porém sem vida, um vasto rebotalho

Do que restou, trapo apenas de vazio...

 

AS MÃOS DOS REIS I – 11 JAN 2020

 

ZEBA E ZALMUNNA ERAM REIS DOS AMONITAS

E SE APRESTARAM PARA O SAQUE DE ISRAEL;

ERA GIDEÃO ENTÃO JUIZ EM JEZREEL

E LHE DISSERAM: “POR QUE TROPAS NÃO CONCITAS?”

ASSIM ARAUTOS ENVIOU AOS ISRAELITAS

E MUITOS HOMENS DEMANDARM SEU QUARTEL,

MAL ARMADOS, DESTREINADOS, SEM BROQUEL, (*)

QUERENDO APENAS DEFENDER AS PRÓPRIAS DITAS.

(*) Escudo.

 

PORÉM GIDEÃO OUVIU A VOZ DE JEOVÁ

E DECLAROU, SEM A MENOR MALDADE,

QUE QUEM QUISESSE, A SEUS LARES RETORNASSE:

VERGONHA ALGUMA EM RETIRAR-SE HAVERÁ:

DEUS GANHA BATALHAS E NÃO A HUMANIDADE,

SABE ESCOLHER A QUEM CONSIGO BATALHASSE.

 

AS MÃOS DOS REIS Ii

 

MUITOS SE FORAM, MAS AINDA ERAM DEMAIS

OS QUE FICARAM; E ENTÃO GIDEÃO PENSOU;

SEMPRE HAVERÁ, APÓS VENCERMOS, QUEM CONSIDEROU

QUE OS DERROTAMOS POR ARTES NATURAIS.

E ASSIM SELECIONOU OS TREZENTOS MAIS MARCIAIS,

POR ARTIFÍCIO QUE IGUALMENTE IMAGINOU

(TALVEZ TUDO AOS ESCOLHIDOS INFORMOU)

E COM OS TREZENTOS ENFRENTARAM OS RIVAIS.

 

MAS ANTES QUE À BATALHA ELES CHEGASSEM,

A FOME OS ACOMETEU, POIS JÁ ESCASSEAVA

NA LONGA MARCHA SUA POUCA PROVISÃO;

INDO A SUCCOTH POR QUE AUXÍLIO DEMANDASSEM,

MAS A CIDADE INTEIRAMENTE SE TRANCAVA

E NÃO LHES DERAM SEQUER CÔDEA DE PÃO!

 

AS MÃOS DOS REIS III

 

ENTÃO OS CHEFES DA CIDADE CONTESTARAM:

“ACASO TENS EM TEU PODER AS MÃOS

DE ZEBA E DE ZALMUNNA, QUAIS COMPROVAÇÕES

DE QUE SUAS TROPAS EM COMBATE SE ACABARAM?”

ASSIM GIDEÃO E SEUS HOMENS SE AFASTARAM,

MAS O JUIZ PROMETEU A SEUS ANCIÃOS:

“QUANDO EU VOLTAR, DERRUBAREI VOSSOS PORTÕES

E A CASTIGO SUBMETEREI QUANTOS NEGARAM.”

 

DE FATO, A BATALHA ELES VENCERAM,

ZEBA E ZALMUNNA FORAM EXECUTADOS

E AS MÃOS CHEIAS DE ANEIS DOS DOIS CORTARAM;

PARA SUCCOTH EM BREVE RETORNARAM,

SENDO COM ESPINHOS E URZES FUSTIGADOS

TODOS OS HOMENS QUE DA TROPA ENTÃO ZOMBARAM.

 

AS MÃOS DOS REIS IV

 

AS MÃOS DE ZEBA E DE ZALMUNNA SÃO SINAL

DO PODERIO QUE SÓ TEM DIVINA MÃO;

DE NADA SERVEM PARA NOSSA PROTEÇÃO

NOSSO PODER E NOSSA FORÇA MATERIAL.

E O CASTIGO SE COBRARÁ FINAL

DE QUEM RECUSA APOIO E ACEITAÇÃO

AOS QUE CUMPREM FIELMENTE SUA MISSÃO:

CAIU SUCCOTH ANTE A FORÇA DIVINAL...

 

DAS MÃOS ARREBATARAM SEUS ANÉIS,

A CARNE E OS OSSOS LANÇADOS AO RELENTO,

QUANDO GIDEÃO RETORNOU A SEUS QUARTÉIS;

ZEBA E ZALMUNNA A OUSAR POR AMBIÇÃO

ATACAR A QUEM DEUS EMPRESTA ALENTO,

SENDO SUAS MÃOS DECEPADAS SEM PERDÃO.

 

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