segunda-feira, 29 de março de 2021


 

 

 

NON SUM QUALIS ERAM I (*) – 25 MAR 2021

(*) Não sou mais como eu era.

 

Embora seja ainda forte, nunca fiz

musculação, nem busquei qualquer esporte;

os músculos que trago no meu porte

ganhei pelo trabalho que condiz

com o uso do machado e da pá, que quis

utilizar para terra e lenha ao corte;

usei enxada e picareta e toda sorte

desse trabalho que braçal se diz.

 

Ao mesmo tempo, desenvolvi a mente,

qual no ditado, que é “sã em corpo são”,

sem que uma coisa a outra me impedisse;

foi assim que vivi, frequentemente

a trabalhar com a mente e o coração,

conquanto em versos a minha alma abrisse.

 

NON SUM QUALIS ERAM II

 

Eu sempre fui artista e os companheiros,

colegas e outros homens preferiam

esportes, futebol ou contariam

de seus sucessos reais ou verdadeiros.

Eu nunca fui assim.  Os meus sendeiros

buscaram livros, poemas, se perdiam

pelas pinacotecas e museus, corriam

as bibliotecas de velhos mosteiros...

 

E muito embora tenha tido meus seis filhos,

sinto ter mais em comum com as mulheres,

com quem possa partilhar dos pensamentos,

não que aprecie modas, memes e outros trilhos,

porém amo crianças e há prazeres

bem femininos nos meus sentimentos...

 

NON SUM QUALIS ERAM III

 

Sempre me dei melhor com as mulheres

do que com homens – bem poucos amigos,

desses sinceros para quaisquer perigos

eu encontrei pelo mundo em meus viveres;

que namorador me declare não esperes,

pois nunca o fui, desde meus dias antigos,

mas contentei-me a ceifar somente os trigos

que surgiram à minha frente, sem misteres.

 

Foi sempre assim, esperei que me buscassem

e que deixassem bem claro o que queriam

e tais desejos muita vez nem percebi,

talvez por isso seus lábios meus se achassem,

pois se me buscam é porque de mim se fiam,

que uma ameaça eu nunca constituí.

 

NON SUM QUALIS ERAM IV

 

Trago uma estrela na palma de minha mão,

que dizem ser sinal de profecia,

especialmente se na esquerda reluzia

o talismã dessa esplêndida visão;

porém bem cedo me chegou desilusão,

ao perceber que na direita se inscrevia,

menos potente sendo tal magia,

por não se achar na mão do coração.

 

Mas ali está ela, bem clara e definida,

na mesma mão em que trago a letra A,

ao invés do M que os demais ostentam;

e muita vez, ao longo de minha vida,

eu escutei aquela voz: “Não Vá!”

quando algum dano os fados me portentam.


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