A ÁRVORE DO INFERNO I – 26 ABR 20
Segundo o Alcorão, cresce árvore no inferno
de folhagem atraente e frutos saborosos:
é a árvore Zakum, mas de efeitos impiedosos,
que o suplício aumenta aos hóspedes do Averno,
pois quem comer seus frutos, terá castigo eterno,
porque sua sede aumentam os frutos deliciosos,
de forma imponderável seus efeitos pavorosos,
a provocar no infeliz perpétuo fogo interno!
Não sei se existe mesmo essa árvore Zakum
e de fato nem sei se existe esse lugar
que chamavam de Hades os Helenos
ou de Orco os Romanos, também lugar-comum
ao Sheol se referir, na intenção de castigar
não a nós, mas aos inimigos, pelo menos!
A ÁRVORE DO INFERNO II
Também ao Abaddon existe referência
e mais ainda à Gehenna de Fogo;
mesmo no Hades há o Tártaro sem rogo,
em que não há qualquer mercê ou leniência
e é mesmo possível que exista tal ardência
em universos paralelos, para atender o rogo
dos que rancores sustentam e esperam, logo,
seus adversários punir com veemência!
Mas não está neste universo que eu habito
E em absoluto não será ponto de fé:
o Hades do Credo não é mais do que a mansão
dos mortos e mesmo lá a maioria concita,
segundo a Anastasis, a abandonar tal sé, (*)
mediante a oferta de sua redenção!...
(*) Libertação, a doutrina da pregação de Cristo aos mortos.
A ÁRVORE DO INFERNO III
Porém nos Credos e nos Dez Mandamentos
ou no Pai Nosso para nós deixado,
nenhum ponto de fé será indicado
de que existam satanases tão odientos;
tão impertérrita crença tendo assentos
no medo que se quer ver despertado
no povo humilde e não-alfabetizado,
para à hierarquia dar seus assentimentos.
Terrível mesmo é a descrição dantesca
das almas que no Estígio chega e pesca
esse Caronte que será dos mortos guia;
comer da árvore Zakum será terrível,
porém é voluntário e bem pior seria
inalar o ar fervente que evitar não se podia!
A ÁRVORE DO INFERNO IV
Não creio no diabo e nem disso preciso,
que o mal se encontra nos homens suficiente
para preencher mais de um inferno permanente,
nesta Terra material em que hoje piso;
sei que o que existe após a morte é impreciso,
mas a questão não me incomoda realmente,
que essa resposta estará subjacente
à pluralidade dos mundos, em conciso,
mas claro afirmar de que todo o imaginado
em algum ponto do Pluriverso está criado
e se eu decido descrer de haver inferno,
outro de mim talvez até creia bastante
e assim comprove a descrição de Dante,
no masoquismo de amargar suplício eterno!
PERENIDADE I – 27 ABR 2020
Eu reconheço ser pura
fantasia
os “para-sempres” que
emprego tanto,
quer seja a referência a
amargo pranto,
quer a um amor permanente
que sentia.
O “para-sempre” chega às
raias da heresia:
nenhum humano encontrará
um canto
de amor terreno ou mesmo
de amor santo
que de algum modo
eternamente duraria.
Eterna sendo tão somente a
Divindade
e tudo mais fugaz fogo de
palha,
a reluzir por certo tempo
portentoso,
mas consumido em sua
totalidade,
toda apagada sua luz sem
qualquer falha,
apenas cinzas ou um tição
mais tenebroso...
PERENIDADE II
Contudo, nesse tempo em que
amor dura
e nos consome com tal
intensidade,
parece um fulgor ser de
eternidade,
uma fagulha do divinal segura...
E sendo apenas feromônios
em loucura,
não se esgota a sua imensa
intimidade,
enquanto é intensa e
imensa essa vontade,
enquanto essa ilusão em
nós perdura...
Sendo entretanto um amor
mais permanente,
caracterizado mais pela
brandura,
traz sensação de gentil
perenidade...
E não se espera tornar-se
mais potente
que a duração dos dias que
se apura
em seu trânsito tão veloz
quanto inclemente...
PERENIDADE III
Assim não espero que para
sempre possa
amar qualquer mulher,
sequer a idolatrada
que por nós é diariamente
acompanhada,
em seu carinho que a alma
nos adoça...
Espero muito mais amor de
louça,
que se comprou na hora
dedicada
ao princípio desse amor e
conservada
por décadas a fio, sem
qualquer mossa,
porém que um dia, muito
certamente,
irá mostrar-nos pequena
rachadura
ou na beirada alguma
indentadura,
até que, enfim, se quebre
totalmente,
tal como racha e quebra a
vida humana,
mesmo a que o amor com
persistência irmana.
FAIANÇA I – 28 ABR 20
Se amor for louça, que seja de faiança,
da mais pura e escolhida porcelana,
colorido em furtacor que não se empana,
do heliotrópio à mais gentil garança,
esse amor que de mutar-se não se cansa,
mas que a cada nuance ainda se irmana,
a diferença de humor, por mais insana,
aceitando como passos de sua dança...
não uma valsa ou polka acelerada,
mas sob o ritmo de canção romântica,
executada lentamente por orquestra
e a cada década de novo renovada,
os “eu-te-amos” a repetir de forma mântrica,
em cálices tilintando a cada festa...
FAIANÇA II
Que seja então amor à moda antiga,
em que se lembra cada aniversário,
não só do casamento, mas do vário
repertório de cada data que consiga
representar um evento que se abriga
bem fundo ao coração; em cada horário
do despertar em qualquer dia ordinário,
quando ao bem adormecido a vista siga...
esse amor de uma baixela rendilhada,
que se conserva com o máximo cuidado
e se retira tão só em dia especial,
pela calma de um carinho acompanhada,
junto a um vinho em adega conservado,
que traga a data do amor original...
FAIANÇA III
Após a festa, a ser lavada com cuidado
e reservada em abrigo e pleno dó,
em que não pegue umidade e pouco pó,
até no próximo momento a ser buscado
e novamente empregada no indicado
momento de ambrosia e pão-de-ló,
em companhia ou pelo casal só,
um dia de amor a ser de novo relembrado.
E se for assim cuidada essa baixela
resistirá por décadas a fio,
contemplada muitas vezes com amor,
à luz de velas refulgindo como estrela,
sobrevivendo muito além do cio,
enquanto o sangue conservar o seu vigor.
FISICALIDADE I – 29 ABR 20
A dor que sinto de te ver
atinge
diretamente o cerebelo, a
base
de meu cérebro e o próprio
crânio range
ante o impacto. É como se me abrase
de forma incandescente,
que me arrase
todo o equilíbrio e
controle que me cinge:
o inesperado coloca-me em
estase
e escorre a calma que meu
controle tange.
Não é no coração: a nuca é
que me dói
e desce do pescoço,
espinha a baixo,
os músculos dos ombros em
tensão;
que nada existe de sensual
nessa emoção,
nem sequer de romance um
leve facho,
só esse golpe que a mente inteira
rói.
FISICALIDADE II
Antes quisera nunca mais
te ver,
sabendo não serás de mim
jamais
qual no passado foste,
tantos ais
silenciosos pelos lábios a
perder;
mesmo que houvesse
esperança de reter
entre meus braços teus
beijos fatais,
ainda queria poder ver-te
nunca mais,
acalentando de novo o meu
sofrer.
Sem que sentisse uma
emoção de fato,
o que me fere é mais o
desencanto,
um desalento que guardo
com recato,
um melancólico penhor
insatisfeito,
sem ter alívio de demorado
pranto,
o corpo inteiro magoado e
contrafeito.
FISICALIDADE III
Sei muito bem não ter
qualquer direito
de algo te pedir. O rompimento
causou em mim definitivo
desalento,
fino estilete cravado no
meu peito,
que na ocasião retorceste
bem a jeito,
de forma tal que me
feriste o pensamento
e embaralhaste para sempre
o julgamento:
não há retorno desse ato uma
vez feito.
E no entretanto, por mais
que o corpo doa,
existe brilho no ônix
profundo,
até mesmo se não for bem
lapidado.
E dentre o mal encontro
fração boa,
um linimento sutil e
vagabundo,
que dentre a mente
conservo acalentado...
LUAR LUNAR 1 – 30 ABRIL 20
Onde se encontra a Árvore da Lua?
Em algum penhasco pode estar presente,
Mais do que tantas estrelas
surpreendente,
Que certamente no ar leve não
flutua...
Em sua prata argentina a mente estua
E nalgum galho eu devo estar pendente...
Por que essa imagem é sempre
reincidente
E assim me fere qual adaga nua?
Pois essa Lua acompanha a Terra
inteira:
Deve, por certo, possuir qualquer
corrente,
Caso contrário, se desprenderia!...
E alguma noite seria a derradeira,
Para o espaço a fugir-nos,
tristemente,
Essa luz pálida que nos consolaria...
LUAR LUNAR 2
Dessa Árvore da Lua penderiam
Os enfeites de uma noite sideral,
Cada cristal e cada bola de metal,
Quaisquer estrelas ali se guardariam
Nesses galhos que heréticos fulgiam,
Enquanto o Mandamento contratual
Era quebrado, sem intenção de mal,
Mas por fervor de encantos que
ornariam
A arcaica Astarteia, que a esta Gaia,
Que decidiram um dia chamar Eva,
Rival seria em nebulosa Maya. (*)
(*) O mundo material, que é pura
ilusão.
Amor de tanta mulher reclamaria,
Sempre que quebra esse poder da treva
E numa réstia de luz lhes desceria...
LUAR LUNAR 3
Onde está hoje essa Árvore da Lua?
Teria sido derrubada para a cruz
Que no arcano confeccionaram a Jesus?
Ou simplesmente para construir grua
Que as pedras das pirâmides atua?
Ou então serviu de andaimes tanta luz
Que aos templos ancestrais ainda
conduz,
Cada coluna a rasgar da pedra nua?
Dizem que a Lua pertence aos
namorados,
Talvez em seus corações enraizada
E em cada atroz separação
desarraigada.
Ou então se encolhe entre os
desencantados
Da luz do Sol, cujo fulgor requeima
Para a Lua a se voltar em antiga
teima?
Nenhum comentário:
Postar um comentário