ILUSIONISTAS I – 12 MAI 2020
C. S. Lewis declara, firmemente
que os demônios nos inspiram, astuciosos,
dois erros especialmente perigosos,
para melhor devorarem nossa mente:
que não existem, se crer inicialmente
e assim podem mostrar-se sediciosos
e te engazoparem com impulsos maliciosos,
que irás supor serem teus, naturalmente...
Ou ao contrário, demonstrares teu temor,
quando te pões à sua disposição,
toda fera a atrair cheiro do medo;
a cobrar então de ti o teu fervor,
nesse sofisma sussurrado num segredo:
que “Deus perdoa, mas o diabo não!”
ILUSIONISTAS II
Nesse primeiro erro cairia eu:
não vejo por que havia de existir um mal,
contraposto ao bem mais divinal,
isto não passa de antropocentrismo fariseu!
Nunca pude recair no maniqueu:
que um poder haja supernatural,
oposto ao bem da graça espiritual,
com um poder que se compare ao Seu.
Se o mal existe, está dentro de nós,
não vem de algum capeta mais cruel,
as nossas culpas se enredam em mil nós!
Não precisamos de que algo a alma nos ganhe,
se qualquer raiva ou um rancor de fel
para o ódio facilmente nos assanhe!
ILUSIONISTAS III
Não é só isso.
Deus Pai é infinito,
dentro dele está absolutamente tudo
e ainda se projeta como escudo
muito além da matéria em que eu habito;
se por tal coisa dita mal eu sou aflito,
perante Deus apenas me desnudo:
que me projeta com seu amor veludo,
e Lhe agradeço com fervor contrito.
Pois certamente existe a tentação
e sem dúvida algum mal reveza o bem,
mas bem e mal são apenas ilusão,
mal sendo aquilo que nos desagrada,
as catástrofes e rancores que nos vêm,
não uma esfinge assim mal-encarada!
TEOLATRIA I – 13 MAI 2020
Quem ama a Deus, comete idolatria?
Parece um oxímoro a pergunta,
alguma coisa que ao oposto seu se ajunta,
como um frio quente ou calidez que é
fria;
mas o Segundo Mandamento nos dizia:
“Não farás obra de escultura”, assunta,
contra adorar qualquer pedra defunta
ou prestar culto ao que não existia.
E no momento em que se adora a imagem
desse Jesus na cruz tornado exangue,
por mais que afirmem simbolismo apenas,
a mente encontra um ponto de ancoragem
nessa figura que nunca teve sangue,
pouco diversa dos mil ídolos de Atenas!
TEOLATRIA II
Na verdade, nem sequer o crucifixo
era adotado pela Igreja Primitiva,
pelo símbolo do peixe mais ativa
demonstração do partilhar de um fixo
conhecimento para os pagãos sem nexo,
porque Ichthys era o peixe, lenda viva
que as iniciais de Cristo então motiva,
dito puro pela forma de seu sexo.
Sem que o macho com a fêmea se
encontrasse;
porém tal significado é secundário,
que ninguém peixe em seu pescoço
carregasse,
sendo apenas um sinal que desenhavam
e a ser por força do perigo necessário,
os que mostravam rápido o apagavam.
TEOLATRIA III
Hoje em dia, em que vemos tanta igreja
entulhada de imagens adoradas,
em que populações desorientadas
acendem velas a qualquer santo que ali
esteja,
depois que o Segundo Mandamento seja
por Tomás de Aquino, de formas descaradas,
da lista antiga cortado e deformadas
as palavras que Moisés a nós enseja,
sou mesmo um tolo por chamar de idolatria
essa figura torturada sobre o altar,
bem mais que símbolo, uma identificação,
que dupla ainda torna essa heresia,
qual se pudera humanas dores suportar,
qual fez Jesus no momento da paixão!
HERÉTICOS I – 14 MAI 2020
A Arte e a Natureza são deuses dos
ateus,
Flora e Fauna por antigos adoradas,
as criações a elas consagradas,
como os jardins e pomares dos Egeus;
já as artes entre Helenos e os
Aqueus,
eram tidas pelos deuses inspiradas,
pelos Romanos bem menos respeitadas,
só executadas pelos escravos seus.
Com exceção, é natural, da literária,
que inicialmente era tão só poesia:
Ênio escrevia gigantescas epopeias,
depois Catullo e Horatio, em obra
vária
e até a oratória de Cícero se lia
e ainda de Eneias as longas
odisseias.
HERÉTICOS II
Longe de mim desdenhar qualquer das
duas,
que grande apreço eu voto à
escultura,
especialmente àquela que figura
o corpo humano, com precisão de puas,
aos modelos dos Gregos, em suas ruas
e nos seus templos, mais do que a
pintura,
que após milênios, bem rara existe
pura,
salvo as guardadas do Sol ou sob as
luas...
e muito amo toda a literatura,
que a mais vulgar esforço humano
representa
e do rolar dos séculos ainda espia;
à contemporânea, minha mente mais
atura,
mas um diamante nessa ganga ainda
atenta,
sempre a herdeira de um passado que
nos guia.
HERÉTICOS III
E a Natureza certamente eu amo,
desde os gelos do Himalaya até os
desertos,
meus sentimentos para o verde
abertos:
frondosa árvore qual irmã eu chamo;
porém não lhe idolatro cada ramo
ou que os labores sejam recobertos
por um desprezo de intelectuais
incertos:
um equilíbrio em tudo é que proclamo.
Porque proclamam o retorno à natureza,
sem perceber que a cultura das
cidades
de longe prolongou a vida humana;
e idolatrar Picasso, com certeza,
tolice e efeito das hereticidades
retorcidas da forma mais insana!...
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