COFRES DE CRISTAL I – 28
JUL 2020
Eu busco apenas o orifício
de tua mente,
eu só quero penetrar entre
os cabelos,
cruzar teus ossos no
espoucar frequente
de alma contra alma jazendo
em cerebelos...
Apenas quero introduzir-me
em teus desvelos,
sem qualquer lubricidade
inconveniente,
quero o rasgo multicor da
alma dolente,
entretecido pela mente em
sonhos belos...
Porque os corpos se
entrelaçam no jamais,
nessa loucura de um viver
a sós,
em um tornados só em breve insensatez;
já os orifícios se
misturam muito mais,
são alma e espírito atados
nesses nós,
nessa surpresa que ao
despertar revês.
COFRES DE CRISTAL II
Talvez mal o “orifício”
interpretaste,
em tua leitura inicial
deste poema;
não me refiro à desvairada
gema
que qual tesouro no corpo
conservaste.
Sendo mulher, em tal jóia
pensaste,
igual ao escrínio que de
Pandora a pena
de tantos males distribuiu
à cena
do infeliz mundo, qual
decerto te lembraste.
Mal preciso referir que o
belo escrínio,
chamado antigamente de “boceta”
e que o povo transformou
em palavrão,
foi um cofre de cristal de
tal fascínio,
lançando ao mundo tanta
dor secreta,
sendo a esperança o
derradeiro turbilhão.
COFRES DE CRISTAL III
Já na segunda leitura
percebeste
que o orifício era tão só
alegoria,
que nem sequer ao forâmen
referia,
por que impulsos à carne a
mente ateste.
Mas quando leste dos “desvelos”,
concebeste
inicialmente de teus
membros a harmonia;
mas em tudo referi-me, em
elegia,
que só julgava que tua
mente concedeste,
para que as duas, de fato
entrelaçadas,
tivessem completado o
ideal platônico
das duas metades após
séculos reunidas,
não em dois corpos com
carnes mutiladas,
mas mente a mente nesse
beijo harmônico,
em que as almas por almas são
nutridas...
FLORES
NEGRAS I – 29 JUL 2020
Preso
no enredo dessa liberdade,
meu espírito
se desfaz e flutuará,
nesse
agridoce sonho de saudade,
pois
tudo o que se foi não voltará.
Pelas ladeiras
do amor deslizará,
por mais
que amor ressumbre falsidade,
mas
pouco importa, quando um beijo dá
algum
consolo à luz dessa inverdade.
Pois
tudo passa, bem facilmente até
e como
se desmancha essa paixão
que um
dia devorou o ser inteiro!
Resta o
carinho, no amargor da fé,
amor mentindo
em consideração,
no
triste espasmo de um sonho derradeiro!
FLORES
NEGRAS II
Pois todo
sangue tem coagulação.
aglutinogênios
a beijar aglutininas
e essa
tua mente com que me fascinas
hematomatizou-se
igualmente num borrão.
Pois todo
cérebro tem em si circulação
e às
vezes sofre de crises repentinas,
morrendo
em parte suas redes pequeninas
que
conservavam a constância da emoção.
E dessa
forma, até o amor se coagula,
qual de
uma mente à outra a comunhão,
por
mais ardente então fosse a mútua gula.
E surge
assim essa bizarra liberdade
das duas
metades que se separarão,
ante a
secura final de sua ansiedade.
FLORES NEGRAS III
São flores
negras as quimeras coaguladas,
pois a
vida nesse sangue permanece
e dele
brotam em obscura prece,
final
rebento das mentes abraçadas.
E eu
não queria ter desagrilhoadas
as minhas
mãos quando o amor teu desfalece;
eu
queria, eu te juro, é que pudesse,
ter
essas mãos para sempre aprisionadas,
no
calabouço de tua mente altiva,
jamais
pedindo que me desses alforria,
mesmo
sentindo como esvai-se o ardor.
Mas que
a anuência se tornasse rediviva,
pois a
tua mente eu sempre buscaria,
por
mais achasse em sua ternura um amargor.
TELEX I – 30 JUL 20
Hoje pretendo enviar-te uma mensagem
que não te alcançará pelo correio,
nem haverá um telefone de permeio,
nem celular, nem tablet de passagem;
talvez Telex ainda achasse na garagem,
envolto em poeira, mas cumprido o
asseio,
então pudera servir-me desse meio
para achegar-me a ti com mais
coragem...
Simplesmente porque sei que não
existe
em tua casa ou no posto de trabalho,
outro artefato que a possa receber.
Porém a inadequação assim insiste
em querer te apresentar, num ato
falho,
tal confissão que nem sei como fazer!
TELEX II
Sei que é tolice, mas o
distanciamento
social me impede de te procurar,
salvo em disfarce que pudesse achar,
motoboy fingindo ser em tal momento;
mas se pudesse, sem impedimento,
até um ramo de flores te levar,
a minha língua não saberia destravar
e em balbucio prestaria juramento...
Pois quando amor nos avassala o
peito,
é mais difícil certas coisas
pronunciar;
de confissão fácil, melhor é
desconfiar;
esse que fala pode não estar sujeito
ao domínio de um amor inteiramente,
sendo volúvel o que sua língua
mente!...
TELEX III
Contudo, eu sei que desse amor
suspeitas
e ainda aguardas um pedido de namoro,
da iniciativa tomar tendo decoro
e à longa espera ainda hoje te
sujeitas,
pois declarar-me já tentei em outras
feitas
ou pelo menos, dizer quanto te adoro,
mas no momento de falar, demoro
e minhas sentenças brotam tão
mal-feitas!
Portanto esperas, a me dar qualquer
sinal
que assim afaste meu
desencorajamento,
até que eu possa enfrentar essa
quimera,
de teu amor já me servindo de fanal
que me recebas a sorrir cada momento,
por impaciente que já esteja essa tua
espera!
TELEX IV
Confio em ti, que de esperar bem
sabes
e que tanto, de confiar, tens
esperado
e que tanto, de me amar, tens
sopesado
a escala de valores, em que acabes
a dar-me um certo valor de que te
agrades
mais que outros pesos que na vida
tens achado
e que dentro ao coração tens bem
guardado
um beijo azul que em certo dia vades
inteiro dar-me, da esperança rica,
que me guardaste na riqueza da
confiança,
que razão plena tenha dado à tua esperança;
confia em mim, porque confiar se
aplica
ao meu amor, embora cheio de
esquivança,
quanto a certeza de teu amor me
indica.
Nenhum comentário:
Postar um comentário