terça-feira, 16 de fevereiro de 2021


 

A SENHORA DO JARDIM I – 23 OUT 20

 

Maritza se levantava com as flores,

antes da hora de nelas pôr a água,

mas as regava cedo com sua mágoa,

sonhando mortos e perdidas dores;

quando se erguia não pensava nos amores,

tão somente da saudade a sentir frágua,

flexível nessa pena, era uma ninfa dágua,

ninguém diria ao olhar os seus flexores;

como se alonga e gira em contorsões

que quem a olha imitar não pode,

que em pé sinta dores ou quando caminha,

quando seus nervos sofrem contrações

e precisa do analgésico que a acode

desse cilício com que a vida lhe continha...

 

A SENHORA DO JARDIM II

 

Hoje em dia, ela mudou o seu costume,

a pouco e pouco foi levantar mais tarde;

não sei se a dor ainda mais lhe arde;

cedo ao jardim sei bem que não mais rume;

muito eu queria que tal problema esfume,

eu mesmo para a dor não sou covarde,

sem igual sofrimento que me enfarde,

bem mais de leve a cortar-me forte gume;

mas continua até hoje bem flexível,

até espanto a causar na terapeuta,

que a massageia na medida do possível,

ao examiná-la, seu aspecto acha incrível,

quando em sua mesa finalmente deita

e até a chama de modelo nessa feita!...

 

A SENHORA DO JARDIM III

 

Ela se espanta ao ouvir tal elogio,

que tem a idade já bem avançada,

de ouvir de mim estando acostumada,

mas deitada nessa mesa sente frio;

mas já sentindo do calor um certo fio,

para ter seu jardim diária aguada

outra pessoa foi por ela contratada,

que planta e poda com seguro brio.

Eu continuo a contemplá-la com carinho,

até mesmo a lhe mostrar admiração

e confesso sentir até certo azedume;

a terapeuta incomoda-me um pouquinho!

Quem tem direito a elogiá-la, penso então,

sou eu apenas, a mastigar o meu ciúme!

 

TRÊS AMORES – 24 OUT 20

NAMORO DE CRIANÇA

Quando menino, queriam que eu casasse

com uma menina chamada Maria Cecília,

de amigos de meus pais bonita filha,

mas embora brincar com ela me agradasse,

queria apenas que comigo ela brincasse,

sem de outra intenção seguir a trilha,

em aniversários sempre boa partilha

e com frequência eu a ela visitasse

e ela a mim, era idéia só de adultos;

nem sei se é viva, nem sei aonde mora,

mas até cantar fui no seu casamento;

a vida é assim, desfazem-se os vultos,

o mundo dá suas giras sem demora,

inútil sendo nosso empreendimento.

MINHA AXÔNIA

Ao namorar uma Sônia, eu a chamava

de “minha Axônia”, sem sequer saber

se entendia o que eu queria dizer

ou se esse nome carinhoso lhe agradava,

é claro que a intenção eu lhe explicava,

mas no geral um apelido não se quer,

ela sorria, mas sem gostar sequer,

para não  desagradar, não reclamava;

mas finalmente eu vi chegar o dia

em que, firme, me pediu para parar

com o apelido há tanto tempo a incomodar;

há muito tempo não lembrava essa guria,

mas ainda lembro quando me sorria,

mesmo quando por Axônia a ia chamar...

A PINTORA

Nunca esqueci da loura americana

com quem vivi e por quem me apaixonei;

lembro dezenas de vezes que a abracei,

separação a causar-me dor insana,

que a circunstância foi bastante desumana

e meu retorno brevemente lhe jurei,

não obstante, eu nunca mais voltei,

talvez sem ter para tal bastante gana;

anos passaram e já não faço ideia,

lembro que era uma ótima pintora,

será que conseguiu fazer carreira?

Eu prossegui em pobreza de odisseia,

sem ser possível recobrar o meu outrora

e infelizmente, ela não foi a derradeira...

 

HÁPAX LEGÓMENON I – 25 out 29

(Dito uma só vez)

Ainda lembro da enorme sensação

que Michelle Morgan um dia causou,

quando os seios nadando nos mostrou

em película de universal exibição.

Mas durou pouco, logo houve imitação,

muita outra atriz seu peito desvendou,

Brigitte Bardot a seguir se desnudou

(o nu frontal nos foi cortado na ocasião!)

 

Burt Lancaster vaia ouviu peremptória

ao sair de uma lagoa e o nu dorsal

exibir completamente masculino....

Mas hoje em filmes já é quase obrigatória

a exibição constante de tal nudez frontal,

seja de homem, seja de corpo feminino...

 

HÁPAX LEGÓMENON II -- 22 jun 2009

Agora é moda salientar os seios,

como nos filmes, nesse antigamente

que o século dezenove faz presente:

os ombros nus, vestidos só de anseios...

E como é bela a visão desses alheios

apêndices mamários tão frequente...

Mesmo sabendo que a visão fremente

não nos pertence, que jamais essas ameias

 

da fortaleza da blusa ou do vestido

se tornarão disponíveis para nós...

Mas ainda assim, essa visão é bela.

Ai, sedução revelada no tecido,

num cristalino convite, os seios sós,

que me espiam como jovens na janela!

 

HÁPAX LEGÓMENON III – 25 out 2020

 

Em pouco tempo surgiu o monoquíni,

os belos seios nas praias a se expor,

sem perceber que do Sol forte calor

câncer causava já desde o biquíni...

Mas é preciso que o olhar nos mime,

pelo orgulho ou vaidade em seu vigor,

sem intenção de conceder o seu amor

e muito menos que a dormir nos nine...

 

do monoquíni era apenas mais um passo,

para o seu corpo inteiro se mostrar,

a fim de parelhamente se bronzear,

a censura a estender só curto braço,

determinando praias só para nudismo,

em que se possa atender a tal modismo...

 

HÁPAX LEGÓMENON IV – 25 out 2020

 

Fui até tolo, onze anos já lá vão,

ao mencionar essa leve intimidade...

Total entre casais já nem é novidade,

mas o que é que eles fazem e nós não?

De pornografia se mudou definição,

nem é mais crime mostrar sexualidade,

aborrecida a censura, na verdade,

um novo crime impõe-nos desde então.

 

E chega assim a chamar de pedofilia

qualquer amor por alguma adolescente,

enquanto em seu book ela fácil se exibia

não somente desnuda totalmente,

mas que de coxas abertas mostraria

a vagina exposta para toda a gente!...

 

EOLUROFILIA I – 26 OUT 2020

(Amor pelos gatos)

Três gatos tinha e em nada me inspiravam,

apenas miavam e urinavam ternamente,

tomando a casa inteira por “patente”

e se reclamava, com indignação miravam.

Algumas vezes penso até que conspiravam,

mas de outras competiam vivamente;

um quer carinho, o outro arranha a gente,

quando os chamava, as costas me viravam.

 

Desse modo, é impossível ter por musa

qualquer felina, por mais que pelos brilhem

e que seus olhos cintilem obliquamente,

todas tendo a mesma máscara como escusa,

face peluda que seus bigodes trilhem,

contemplando fantasmas calmamente...

 

EOLUROFILIA II

 

Sempre serviam para espantar os ratos,

se bem preferissem caçar os passarinhos

e comer a suas rações até sozinhos:

não eram nada altruístas esse gatos!...

Com frequência me causavam desacatos,

quando insistiam em exigir carinhos

ou se intrometiam pelos meus caminhos:

não viveriam se morassem lá nos matos!

 

Quanto a fantasmas, é coisa muito certa

que eles enxergam coisas pelos cantos

e algumas vezes seus pêlos arrepiam,

enquanto vemos que a peça está deserta.

Será que nos protegem com encantos,

Igual minhas tias, em criança, me diziam?

 

EOLUROFILIA III

 

Hoje em dia, já morreram todos três,

de quando em vez, até tenho precisão,

indo à cozinha, percebi hoje invasão

de um ratinho, pretendendo ser freguês!

O cachorro estava ausente desta vez,

se cá estivesse, não lhe daria permissão,

mas o seu banho tomava na ocasião.

Armo a ratoeira, outras mortes já me fez.

 

Eu só espero que o pessoal da ecologia

não nos queira proibir matar os ratos,

pois já garantiram proteção aos jacarés

e até a tubarões, quem nos diria?

Até mesmo de escorpiões ouvi boatos!

Um dia dos ratos ajoelhamos ante os pés!


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