A
GARRAFA ENCANTADA
Folklore
irlandês, adaptado e versificado
Por
william lagos, 4 out 2020
A GARRAFA ENCANTADA I
Há muitos anos, numa pequena aldeia
por nome Glenngarn, situada no condado
de Cork, que fica ao sudoeste
de Munster, vivia um pobre camponês,
numa pobreza realmente feia,
sempre faltando dinheiro de contado,
para pagar por sua terrinha agreste
exorbitante valor de arrendamento
mais agravado seu padecimento,
quando chegava do vencimento o mês.
Ora, acontece que nos séculos passados,
por toda a vastidão da velha Irlanda,
as pessoas podiam dar-se por felizes
ou ao contrário, serem desgraçadas,
conforme ou não fosse aquinhoados
pelos duendes que existiam em vasta banda
ou dependendo do lugar que pises,
de fadas bênçãos podiam receber
ou maldições de criaturas a sofrer,
por quem suas vidas eram dominadas...
Algumas fadas tornavam-se madrinhas
e aos afilhados dotes concediam;
algumas bruxas igualmente ali moraram,
caprichosas e nada hospitaleiras,
havia silkies e outras criaturinhas,
elfos e gnomos também ali viviam,
que depois para o oeste se mudaram,
espantada a sua magia que reluz
pelo poder espantoso dessa cruz,
que expulsou essas figuras altaneiras...
Justamente nesses tempos fabulosos,
em que joguetes eram os humanos,
vivia em Glenngarn o referido camponês,
que pelo nome Michael Russell atendia
e realizava esforços portentosos,
para obter, apesar dos desenganos,
um alimento escasso dessa grês,
pedregosa sendo a terra que arrendava,
um aluguel demasiado que pagava
e sempre a fome à porta lhe batia...
A GARRAFA ENCANTADA II
Como seguia os preceitos de sua igreja,
já gerara imensa filharada...
Sua esposa, Molly, muito se esforçava,
mas eram ainda pequenas as crianças,
mesmo que alguma ajudar até deseja,
era fraca, fazendo pouco ou quase nada,
assim Michael dia e noite labutava,
mas raramente conseguia alguma sobra,
pois inclemente o senhorio lhe cobra,
a podar-lhe as menores esperanças...
Se por acaso tinha um ano bom,
logo chegava o cobrador de impostos;
e quando era pior o resultado,
era forçado a entregar as suas galinhas,
a lã vendendo a preço de pompom,
toda a ninhada de leitões em tais desgostos,
algumas vezes até mesmo suas panelas,
os pobres filhos mostrando suas costelas,
pelos farrapos finos das roupinhas...
Mas bem ou mal, seguia labutando
na terra seca e pobre com esforço
e de algum modo conseguia sobreviver,
mas sua miséria cada vez maior,
só com papas os filhos sustentando,
o arado a puxar com o próprio dorso,
dos insetos as pragas a combater,
mas apesar de toda a falta que passava,
do santo Deus em nada reclamava,
sempre rezando por chegar tempo melhor...
Só que em vez disso as coisas pioraram
e os coletores de impostos suas galinhas
carregaram com todos os leitões,
pelo aluguel cada ovelha ele entregara
já no ano anterior e mal sobraram
no fundo do baú dez moedinhas;
então sem ver quaisquer outras soluções,
a sua vaquinha precisou vender,
até o leite de seus filhos ia perder,
a pior miséria que até então experimentara!
A GARRAFA ENCANTADA III
Porém, se não pagasse o arrendamento,
o senhorio o jogaria na rua,
com os pobres trastes ainda a lhe restar,
sem demonstrar alguma compaixão
pelas crianças atiradas ao relento,
logo a fome a lhe mostrar a face nua!
Nenhum vizinho o poderia auxiliar,
alguns passando por igual necessidade,
outros apenas por egoísmo ou por maldade,
sem que um sequer lhe estendesse a mão!
Assim, por não achar outra saída,
tivera de vender a sua vaquinha,
sem saber de onde tirar o alimento
que o animal fornecia diariamente...
E nesse instante mais amargo de sua vida,
Purcell então para a feira se encaminha,
acompanhado pelo triste sentimento
de sua esposa Molly a encarecer
que só a poderia por bom preço vender,
que o aluguel pagasse finalmente...
Saiu de casa ainda estando escuro,
pois não podia o animal forçar
em demasia nessa longa caminhada,
que bom aspecto necessitava ter,
para o valor ele obter seguro,
caso contrário, não poderia pagar
o arrendamento dessa temporada
e assim seguiram pela poeirenta estrada,
que a viagem era bastante demorada:
deixava-a pastar e também água beber...
Finalmente, chegaram a uma ladeira
que ao Morro da Garrafa conduzia,
um nome que ganhou por esta história,
por Bottlehill até hoje conhecida,
hoje tornada lugar de grande feira,
mas nesse tempo nada ali havia,
somente pedras, macegas e outra escória;
então os dois foram subindo lentamente
e lá no alto encararam o sol nascente,
já tão longa fora a estrada percorrida...
A GARRAFA ENCANTADA IV
Foi então que coisa estranha aconteceu:
um ruído de passos Michael escutou,
que pareciam ter surgido de repente,
justo no ponto por que recém passara
e uma bizarra criatura apareceu,
muito pequena, mas que logo o alcançou,
mostrando aspecto um tanto repelente;
e apesar de que sua marcha ele apressou,
a criatura sem esforço o acompanhou
e já conversa com ele entabulara...
Era um anão, sem dúvida, amarelo,
sua cara muito feia e enrugada,
os lábios finos e com a mesma cor,
o cabelo meio branco e meio verde,
nariz bulboso como um cogumelo,
a parte vista das orelhas espigada,
por baixo do capuz, mas de negror!
Sua vestimenta descia até o chão,
nada dos pés a ver-se na ocasião,
sequer um rastro pelo chão se perde!
Dava logo impressão bem inquietante,
com os seus passos não erguia poeira,
o seu ruído era mais de deslizar
e sem poder deixá-lo para trás,
tentou deixar que lhe seguisse avante,
que assim descesse a oposta ladeira,
sem que Michael o precisasse acompanhar,
mas tudo em vão!
De seu lado ele ficou,
passo por passo, firme o acompanhou
e claramente não o deixaria em paz!
Já convencido de estar acompanhado
por um ser qualquer do sobrenatural,
o pobre Michael começou a rezar
sua Ave Maria, que sabia de cór...
Quando o Pai Nosso, a seguir, foi iniciado,
o companheiro pareceu levar a mal
e o interrompeu com mais forte conversar.
“É tua essa vaca?” – ele indagou.
“Por ora, sim...” – Purcell suspirou.
“Pois me parece ser de bom valor...”
A GARRAFA ENCANTADA V
“Claro que sim, é um animal de raça,
tem seus bezerros sempre a cada ano
e é excelente como vaca leiteira...”
“E por que anda com ela pela estrada?”
“É que preciso levá-la até a praça
de Cork, para a feira deste ano...”
“Irás então vender tua companheira?”
“Se não o fosse, por que a cansaria
e pela estrada assim a puxaria?
Por bom dinheiro terá de ser trocada...”
“Ora, poderias levá-la até a feira,
somente para saber do seu valor...”
“Eu sei muito bem quanto ela vale...”
“E nesse caso, por que queres vendê-la?”
“Eu não quero, mas há razão certeira,
só faço a venda com muito desfavor...
É muito caro o arrendamento, nem me fale!
Se não pagar, vou ser posto na rua,
meus pobres filhos a dormir à luz da lua...
Contra a vontade precisarei perdê-la...”
“Mas nesse caso, nem precisas ir à feira:
sem mais problemas, eu mesmo a comprarei.”
De imediato, Michael teve um sobressalto:
não queria fazer negócio com o estranho,
porém hesitou, ali da estrada à beira:
“Só por muito bom preço a venderei...”
“Pois eu te pagarei preço bem alto!”
“Quantas libras ofereces? Serão dez?”
“Bem mais que isso, meu caro freguês!
Vou dar-te algo de valor tamanho!...”
“Bem, e o que será, então?” – indagou
o camponês, já bastante desconfiado.
“Esta garrafa é o que te darei!”
Michael não pôde deixar de gargalhar:
“Uma garrafa?”
Ele quase se engasgou.
“Ria à vontade.
É mais do que adequado
o rico dote com que te brindarei...”
“Decerto achas que eu seja algum idiota,
que vá aceitar uma garrafa em troca?
Está vazia, bem posso notar!...”
A GARRAFA ENCANTADA VI
“Parece apenas, porque cheia está...”
“A quem ocorre uma garrafa oferecer
por uma vaca de tão boa qualidade?”
“Se me ocorre, é porque sei o seu valor.”
“Mas de que ela para mim adiantará?
O que eu preciso é bom dinheiro receber,
para atender à minha necessidade!”
“Muito mais do que dinheiro, te asseguro,
será este prêmio do valor mais puro:
deves de fato aceitá-lo com louvor!...”
“E como queres que eu pague ao senhorio
com tal garrafa? Vai se rir de mim,
a não ser que me quebre na cabeça!
Pelo que vejo, não contém nem água!”
“Serás estúpido, sem a aceitar com brio,
vamos fazer o negócio logo assim!...”
“Mas você espera que eu caia nessa peça?”
“Pega a garrafa e não te arrependerás.
Dela tudo o que precisas tirarás!
Se recusares, terás imensa mágoa!...”
“Mágoa vai é me dar a minha mulher.
caso eu volte sem a vaca e sem dinheiro!
Nunca na vida me deixará em paz!
E depois, como eu darei comida
para meus filhos, sem um tostão sequer?
Vê se me esqueces, caro companheiro,
esse tipo de proposta não se faz!...”
“Ela vale muito mais que qualquer preço;
dá-me a vaca, é a última vez que peço!
Será o melhor negócio de tua vida!...”
“Michael, eu te ofereço pela última vez!”
“Mas como sabes meu nome?” – apavorado,
falou o camponês. “Bem te conheço,
há muito tempo te vigio, muito te estimo,
sei o que sofres quando chega o mês!
Dá-me tua vaca e serás recompensado.
Calcula bem o que agora te peço:
E se a tua vaca morrer pelo caminho?
E se oferecem só um preço bem mesquinho,
de que jeito te servirá de arrimo?...”
A GARRAFA ENCANTADA VII
“E se notarem que ganhaste bom dinheiro
e te assaltarem na volta do caminho
e chegas sem dinheiro e ainda ferido...?”
Ficou Michael totalmente apavorado,
só protestando um instante derradeiro:
“Mas o que eu faço, quando chegar sozinho?”
“Ouve-me agora e serás bem instruído:
faz tua mulher varrer a casa inteira
e pôr a mesa como gente hospitaleira,
pondo a garrafa no chão bem do seu lado.”
“A Molly vai é fazer um escarcéu
e caso chegue a pegar a sua vassoura,
vai ser para correr-me porta a fora!”
“Aguenta firme toda a choradeira
e não te zangues, pelo amor do céu!
Fica firme, não dá bola ao que te agoura,
que ela irá se acalmar em uma hora...
Manda de novo que faça o que falei
e depois fala o que agora te direi,
que tua surpresa há de durar a vida inteira!”
“Com tua família, senta ao redor da mesa
e então ordena, com a máxima confiança:
‘Garrafa, cumpre agora o teu dever!’”
“Mas é só isso?” “Será o suficiente!”
Então de novo, para sua surpresa,
o encantado girou em breve dança,
para a seguir já desaparecer!
“Esta é por certo criatura mágica!
Mas e minha vaca? Que coisa mais trágica,
sumiu daqui também completamente!”
Apertando a garrafa contra o peito,
seguiu Michael ao longo do caminho...
Será de fato que serei recompensado?
Será que pode mesmo rico me deixar?
E se quebrar? Então, não
tem mais jeito!
Estou perdido, sem casa nem carinho!
Por minha mulher serei abandonado!
Mas que fazer? O que foi feito, está feito!
Vou receber o que tenho direito
ou pela estrada terei de mendigar!...
A GARRAFA ENCANTADA VIII
Chegou em casa mais cedo que o esperado.
“Para Cork encontraste algum atalho?”
“Não fui a Cork.
Vendi pelo caminho...”
“Ah, que bom!
E por quanto, realmente?
O suficiente para pagar o arrendado?
Para comida vai sobrar algum retalho...?”
“Por favor, não te zangues, meu carinho...”
“Eu só me zango se me dás algum motivo,
mostra-me agora esse dinheiro vivo!
Não foi a crédito que a vaca nos vendeste...?”
“Ou já gastaste no caminho com bebida?
Estou vendo essa garrafa na algibeira!
Compraste uísque, seu idiota perdulário?
Sobrou ao menos o dinheiro suficiente
para pagarmos essa renda tão sofrida?”
“Fica calma, que te vou contar inteira
cada passagem deste meu fadário...
A garrafa já viste muito bem:
troquei a vaca por ela também...”
“Mas desde quando ficaste demente!?”
“Eu encontrei essa estranha criatura
que insistiu em me comprar a vaca,
mas sem oferecer qualquer dinheiro;
por esta garrafa é que queria trocar!
Naturalmente, eu achei uma loucura
e recusei, mas o duende empaca,
afirmando seu valor ser verdadeiro
e percebendo que não me convencia,
já uma série de ameaças me fazia,
até que a troca eu tive de aceitar...”
“Mas mesmo assim! E nossas crianças,
o que irão comer pela manhã?
Nós vamos todos de fome morrer
e o senhorio vai nos botar na rua!
De pagar já não temos esperanças,
nossa labuta foi de todo vã!...”
“Espera, ouve o que vou dizer:
Vamos, ao menos, o conselho experimentar,
ver se a garrafa pode algo realizar
ou se foi realmente falcatrua!...”
A GARRAFA ENCANTADA IX
“Agora põe a mesa e varre a casa;
a garrafa vou depor aqui no chão
e vamos todos nos sentar à mesa...”
“Se não tem remédio, remediado está!”
Suspirou Molly e logo, caprichosa,
varreu a casa inteira sem razão,
que toda limpa já estava com certeza.
Depois, estendeu na mesa a toalha,
todos sentaram ao redor sem falha,
embora desconfiança sempre há!...
Então Michael falou, bem decidido:
“Garrafa, cumpre agora o teu dever!”
Logo saíram do interior do recipiente
dois anõezinhos, que com facilidade,
num labor perfeitamente conhecido,
vieram pratos e travessas lhes trazer,
cada um com manjar bem diferente
e assim a mesa encheram a valer,
para de novo na garrafa se esconder,
agindo assim na maior naturalidade!
As crianças, que estavam esfomeadas,
nem sequer esperaram permissão
e começaram a comer até fartar!
Molly também, sem mais se segurar!
Ela e as crianças logo já estufadas
e olhou Michael, com estupefação,
ali sentado, tão só a observar:
“Anda, marido, vem comer também!
Teu duendezinho não mentiu, meu bem!
Vem depressa também te alimentar!...”
E quando já não podiam mais comer,
as crianças foram todas se deitar,
só então viram que eram pratos de ouro
e os talheres só de pura prata!
Então ficaram esperando, para ver
os anõezinhos a coberta vir buscar,
que, na verdade, era um vasto tesouro!
Mas não voltaram e Molly foi lavar.
Michael a ajudar tudo secar
e a maior parte esconderam já na mata!
A GARRAFA ENCANTADA X
Com certa pena, Michael amassou
o menor dos pratos e cedo de manhã
foi ao vizinho pedir o seu cavalo
e até Cork se tocou, para vender,
sujo de terra, dizendo que o encontrou
sob uma pedra que arrancara com afã;
Com muitas libras no bolso a acalentá-lo,
voltou a tempo de encontrar o cobrador,
pagou o que devia a seu senhor
e até o cavalo comprou ainda com prazer!
Durante o dia, comeram o que sobrou,
mas de noite, na hora do jantar,
Molly varreu a casa novamente
e tornaram a garrafa a comandar.
Em breve, outro banquete se aprontou,
porém Michael não quis mais abusar,
guardou a garrafa cuidadosamente,
comprou a seguir para si bela carroça
e um ótimo arado para a roça,
vendendo os pratos no maior vagar...
Logo em seguida, tornou-se mais ousado,
foi conversar com o seu senhorio,
trocando o campo por outro maior;
com cuidado, nas terras trabalhou
e finalmente, o campo foi comprado,
de contado pagando um vasto lio.
Molly comprou vestuário bem melhor
e bem depressa foram prosperando,
até empregados logo contratando
e o senhorio velozmente desconfiou...
E insistiu com Michael, até saber
a origem de sua prosperidade,
ameaçando denunciá-lo por ladrão!
E depois que o camponês lhe revelou,
vasta soma lhe propôs, querendo ter
essa garrafa de tal capacidade.
Michael primeiro recusou-se com paixão.
“Se não vender, ao Bispo vou contar
a feitiçaria que estás a praticar!...
A contragosto, Michael concordou.
A GARRAFA ENCANTADA XI
Pensou que tinha bastante dinheiro
e poderia facilmente se manter,
mas o costume de trabalhar perdera
e logo vieram as calamidades:
perdendo até o centavo derradeiro!
De suas vacas a melhor foi escolher:
Talvez o duende outra garrafa concedera?
E dito e feito, chegado na montanha,
a criatura efetuou nova barganha,
sem recusar suas liberalidades...
Mas ao chegar em casa e preparar
a mesa e tudo o mais que de costume,
da garrafa saíram dois gigantes!
Essa garrafa era a da Penitência!
Começaram os dois logo a espancar
Michael e Molly, apagando o lume
de seus olhos e das crianças em instantes!
E após completarem seu castigo,
os dois voltaram para o seu abrigo,
toda a família deixando na inconsciência!
Enquanto isso, o rico proprietário
havia usado a garrafa com frequência,
acumulando pratos de ouro e prata,
todos os dias a pedir novo banquete.
Quando Michael despertou de seu fadário,
pegou a garrafa, com máxima prudência
e a pé mesmo, atravessou a mata,
até alcançar a tal grande mansão,
propondo ao rico segunda transação,
que foi aceita sem o menor salamaleque!
Chamou então numerosos convidados,
Michael ficou junto à janela, só assistindo
e o proprietário ordenou o acostumado,
mas da garrafa saíram os gigantes
e de tal modo foram todos espancados,
que a Michael foi em lágrimas pedindo
que interrompesse o castigo desusado,
mas o maior dos gigantes não parou
e o menor apenas declarou:
“Devolva a Michael as garrafas como dantes!”
A GARRAFA ENCANTADA XII
O ricaço de imediato obedeceu
e os dois gigantes, com finais pancadas,
fizeram que de tudo se esquecessem
e só então ao recipiente retornaram.
Michael a sua lição logo aprendeu,
só meia dúzia de vezes fez chamadas
para que novas baixelas recebessem,
mas a seguir conversou com sua esposa
e novamente tomou a estrada pedregosa:
ele e o duende logo se encontraram!...
“Vim devolver as duas, meu amigo:
doravante vou viver do meu trabalho,
com cuidado a aplicar meu capital.”
O anãozinho mirou-o, sorridente:
“Quer dizer que serviu o seu castigo?”
“Bem, mais serviu foi o meu ato falho,
o labor por toda a vida é natural
e não devemos basear-nos em magia,
mas no trabalho, enquanto nos daria
a vida forças para ação correspondente...”
O duendezinho sumiu, num breve estalo,
e para espanto de Michael, apareceram,
direto do ar, as duas vacas, de repente!
Mais uma vez, ele agradeceu, com humildade
e para casa voltou, sem mais abalo.
A esposa e os filhos o acolheram
e o apoiaram em seu trabalho diligente,
vivendo numa simples abastança,
sem depender de mágica bonança,
mas do produto da operosidade...
O ricaço então de tudo se esqueceu
e nos seus cofres não se achou baixela,
sequer uma das que havia recebido;
dos convidados, passava algum lampejo
dessa sova que na ocasião se recebeu,
quando alguma dor sentia na costela,
todos pensando que Michael tinha sido
sempre um próspero e laborioso camponês
e só aos poucos a lembrança se refez
das garrafas que surgiram nesse ensejo.
EPÍLOGO
Todos achando ser apenas fantasia,
a família Purcell guardou segredo,
a maior parte do tesouro bem guardada,
que só era negociado raramente,
Michael agora até Dublin seguia,
ou à Inglaterra, escolhendo a dedo
a prataria que seria negociada,
e se na mente de um convidado aparecia
a história dessa noite, ele logo se esquecia,
acreditando ter sonhado, realmente...
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