sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021


 

 

AMOR IMPERFEITO I – 2 NOV 20

 

Amor não é palavra, flor apenas,

Que brota de uma boca descuidada;

Palavra só não nos conduz a nada,

Apenas peça de tablado em cenas

De ato interrompido, são verbenas

Que se escuta em canção apaixonada

E amor se mostra qual atriz enamorada,

Tal como o orvalho beija as açucenas.

 

Mas os passos desse amor eu não bebi

Pelos montes e vales do caminho,

Por todo o amor que eu dei, um som

Tão somente de palavras recebi,

Sem desfrutar do mais real carinho

E só me resta dizer um Kyrie Eleison! (*)

(*) Senhor, tem piedade, em grego.

 

AMOR IMPERFEITO II

 

Muito apropriado pedir a Deus piedade

Na data que o dia de hoje comemora,

Recordação de quem já foi embora,

Sem que saibamos para onde, na verdade;

A Escritura Sagrada, em sua veracidade,

Consolação bem fraca nos aflora:

“A duração de nossos dias,” tempo a fora,

“Reduz-se a setenta anos”, de boa atividade.

 

“E se o vigor de alguns os leva a oitenta,

Em trabalho e tristeza reduz-se seu orgulho,

Pois tudo passa depressa e nós voamos...”

 

E quão mais flébil a vida amor nos apresenta!

Talvez com sorte, em sete anos, tenha esbulho,

Pois depressa passou e então mais amamos...

 

AMOR IMPERFEITO III

 

Melhor amar assim quando o vigor existe,

Mesmo limites tendo em retribuição,

Já que o amor nos apresenta indicação

De que a vida mais longa ser insiste;

Quando em um ano amor décadas enquiste,

Na intensidade de sua realização,

Na pertinácia de sua completação,

Que já em momento do porvir se aviste.

 

Porém me queixo apenas de contente,

Pois muito amor recebi na realidade

E se enfim se mostrou sua brevidade,

Foram cada intenso no seu dia presente

E nos meus vasos de flores ainda ajeito

Os secos caules de amor tão imperfeito.

 

CARO DATA-VENIA I – 3 NOV 2020

 

Assim tudo começa: pelo olhar

Eu a contemplo: então a vejo bela

E logo, num repente: qual estrela,

Que a mente inteira me pode calcinar.

E ela também olha: mais a calcular

Se posso ser amigo: e dar a ela

Casa e ninho: e ali erguer-lhe estela,

Para que possa na vida se implantar.

 

Acompanhando da raça o velho trilho

Que da humanidade ainda mais dura,

Entre seus braços o corpo inteiro ensilho

E com seus óvulos meu sêmen se mistura,

Passados nove meses, surde um filho,

Que é pouco mais que proteína pura...

 

CARO DATA-VENIA II

 

Com a devida permissão, portanto,

Reconheço que o amor tem seu destino

E se por esse amor eu me fascino,

A perspectiva não perco nesse encanto:

Ele nos chega, envolto em rico manto

De olhar brilhante e odor suave e fino,

Entre carícias e ternuras  jóias mino,

Há diamantes no cristal do amargo pranto.

 

E por certo, amor é parte, integralmente

Dessa razão pela qual aqui vivemos,

Nessa armadilha renova-se o vigor;

Mas é o protoplasma, certamente,

Que através desse amor transmitiremos,

Para que outra geração conheça o amor.

 

CARO DATA-VENIA III

 

É com olhares que se fabrica a tela

E com carícias suportes para os cantos

E no momento dos estáticos encantos,

A fechadura é instalada firme nela;

Muitos se iludem nessa falsa estrela

E por isso tanto amor acaba em prantos,

Cada qual a percorrer outros recantos,

Já apagada em suas mãos a triste vela.

 

Porém quando realmente se compreende

Por que razão existe amor, ele perdura

E a gaiola não cessamos de dourar

E com a lucidez da compreensão se acende

Uma tocha tão viva que nos dura,

Sem ilusões, mas nem por isso se apagar.

 

O DIAPASÃO DA BRISA I – 4 NOV 20

 

Temos dois braços, igual que um diapasão,

Que vibram juntos quando há excitação,

O ar rarefeito se altera em compressão,

Bem mais intenso entre quatro braços.

Magnifica assim o ar do amor os traços,

Todos mais são repelidos, que os abraços

Se limitam ao casal preso nos laços,

Para os demais só haverá a rarefação.

 

Como brilham os dois seres em harmonia,

Nesse som de argentina nota pura,

Não se escuta desarmonia ou discordância!

Mas cessada a excitação, o amor esfria,

Ficam os dois afastados na obscura

Proximidade constituída por distância.

 

O DIAPASÃO DA BRISA II

 

Na realidade, apenas serve o diapasão

Para indicar do Lá o tom exato,

Para indicar o cá tem mais recato,

Porque só vibra para nos dar indicação

De como o amor em cada relação

Vibrar devia, sem falha ou desacato,

No seu vibrar, autentica cada ato,

Aos instrumentos indica a afinação.

 

Porém diverso é o diapasão da brisa,

O vento sopra onde quer, é caprichoso,

Às vezes queima, outra vez a pele alisa,

Mas em suas notas apresenta variação

E nem sempre mostra tom mais carinhoso,

Mas tão somente nos desperta excitação.

 

O DIAPASÃO DA BRISA III

 

Sempre é inútil esperar que os corações

Possam sempre ritmo idêntico mostrar;

Amor, às vezes, é um simples latejar,

Mas afinado por diferentes diapasões

E dissonâncias se refratam em ocasiões,

Querendo mais receber que podem dar

E por menos receber a se queixar

E em se queixar, mostrar variadas emoções.

 

A brisa sopra onde quer, às vezes gela,

Caso do amor exista pouca calidez

E de outras até apaga a nossa vela,

Ou nos refresca a lástima que exista,

Na contingência que mostra a palidez

De morto amor, porém no qual se insista.


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