sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021


 

 

NO CORREDOR DA MORTE I – 5 NOV 20

 

Sempre me dá uma estranha sensação,

ao retirar um comprimido da cartela,

que uma certa percepção revela,

qual prisioneiro ali fosse na ocasião!...

 

Tal como já esperassem a execução,

cada um por dia, presos em sua cela

e fosse eu o executor dessa sequela;

pior ainda: que os devorasse qual papão!

 

Porque de fato, eu os devoro, um a um

e então me encaram os sobreviventes,

sabendo bem que não têm apelação

e que no fim, não sobrará nenhum,

acusações firmes em seu olhar, ardentes,

por não quererem tornar-se refeição!

 

NO CORREDOR DA MORTE II

 

De certo modo, sinto igual percepção,

muito embora não esteja encapsulado,

de que na vida sou também aprisionado

e que da morte estou à disposição.

 

Muitos que conheci não mais estão,

seu trajeto por aqui já completado...

Acredito que se encontrem do outro lado,

ainda à espera da final ressurreição

 

ou então de reencarnação periódica,

sem nada haver de trágico ou de gótico,

embora em tal novelo incognoscível.

Mas... e se não for assim? Se apenas módica

refeição somos todos para esse estrambótico

executor de quem perdão seja impossível?

 

NO CORREDOR DA MORTE III

 

Não é que nisso creia realmente,

nem o vivencie no decorrer de pesadelo;

o último que tive, posso bem revê-lo,

teria doze ou treze anos tão somente.

 

Quando encarei criatura ali presente,

menor que eu, cabeleira em desmazelo,

a seu redor o ar frígido de gelo,

no fim do corredor, bem à minha frente,

 

após meu pai e minha mãe ter devorado!

Pouco depois, eu li nas “Seleções

do Reader’s Digest” bem claras instruções

sobre como ser mau sonho dominado.

Já tantas vezes tais desfechos controlei,

que há meio século nunca mais desses sonhei!

 

FANTASMAS URBANOS I – 6 NOV 2020

 

Se pesadelos tenho, são reais,

percepção do que me pode acontecer,

mais um aviso para me proteger

de consequências bastante materiais;

perfeitamente conscientes ademais:

que algum veículo me possa aparecer

quando uma rua esteja a percorrer,

que há motoristas descuidados por demais!

 

E ocasião houve, no alto da calçada,

que um caminhão subiu e, por um nada,

não me esmagou assim contra a parede!

 

Este um exemplo do que a sair eu penso,

fantasma urbano, não pesadelo denso,

da vida que ameaça e me prende na sua rede!

 

FANTASMAS URBANOS II

 

Os meus fantasmas são benevolentes,

alegres brincam no circuito cerebral,

versos sussurram, sem me fazer mal,

sendo fantasmas, não são aparentes,

mas certas vezes os escuto, até frequentes,

quando algo perigoso e bem real

pode ocorrer, de forma natural:

Não Vai! – em conselhos bem urgentes.

 

E cada vez que essa voz não considero,

de fato enfrento qualquer má situação:

da última vez, fui mordido por um cão!

 

Com tais fantasmas urbanos delibero,

sei que me têm no seu maior apreço

e então tranquilo em casa permaneço!

 

FANTASMAS URBANOS III

 

Mesmo porque, na situação atual,

sair à rua tornou-se mão-de-obra,

há a roupa de sair que se desdobra,

os calçados que conservo no portal.

 

E essa máscara que ponho no final,

mesmo porque a Prefeitura cobra,

qualquer fiscal por uma esquina dobra,

fantasma urbano de potência material,

 

sempre trazendo consigo algum talão,

já digitado em tablet ou celular,

feliz da vida ao poder alguém multar!

 

Tudo me leva a permanecer, então,

dentro de casa, na medida do possível,

sem a armadura de aparato incrível!...

 

NO MUSICAL DA BRISA I – 7 NOV 20

 

Não é temática em nada original;

quantos poetas a brisa comentaram,

belos louvores em seu favor cantaram,

de seu frescor em gratidão total!...

 

Lembro um poema sobre Havana, bem real,

autor e título da mente me escaparam,

bem políticos os temas que trataram,

da Revolução tal brisa era imortal!...

Afastaria todo o calor insano

da ditatura de Baptista e então traria

a liberdade a cada homem cubano!...

 

Do feminismo a moda nem se avista,

pois barba alguma mulher ostentaria

e era então no masculino que se insista...

 
NO MUSICAL DA BRISA II
 
Ante a política, eu sou indiferente,
só acredito na poesia por poesia,
mas é impossível não notar essa ironia
da liberdade mentida à pobre gente.
 
E Ché Guevara, um idealista ingente,
já suportar esse regime não podia
e assim partiu para triste desvalia,
lá na Bolívia, um mistério ainda potente...
Mas outras brisas por certo são sopradas
e em tantas ocasiões foram louvadas,
pouco me resta que seja original...
 
De um sonho azul eu me recordo agora,
no alto de um penhasco, nesse outrora,
com a brisa a me abanar em festival!...
 
NO MUSICAL DA BRISA III
 
Porém, sem dúvida, foi a brisa alpina
que na Áustria inspirou compositores,
a Beethoven dos potentes estridores,
a Haydn, que para o clássico se inclina.
 
A Mozart, tão variado que fascina,
a Schubert, o mais delicado dos autores,
aos musicais de Strauss, em seus ardores
e até a Viúva que ao Lehár húngaro se afina...
Mas para mim, toda brisa é feminina,
enquanto zéfiro é seu eterno amante,
mas que separa seu pai, o furacão!
 
Porém após a tempestade, essa menina
de novo sai a soprar no meu semblante
e beijo deixa bem fundo em meu pulmão!
 
REGOLITO I – 8 NOV 2020
 
Quarenta anos atrás, assisti, em empolgação,
Neil Armstrong, descendo de vagar
pela escada de seu módulo lunar,
pisando o solo com a devida precaução!
Embora o veículo visse firme na ocasião,
talvez um pé enfiasse, sem querer
no regolito em demasia e assim poder,
ser a primeira vítima dessa exploração!
 
Naturalmente, o solo era bem forte
e suportou o seu peso, facilmente;
então Aldrin desceu, também contente...
Deixaram marcas de permanente corte
na superfície lunar que, por enquanto,
não foi de novo percorrido o mesmo canto...
 
REGOLITO II
 
O regolito é simplesmente o solo;
têm os cientistas o costume de inventar
novas palavras para o vulgo atrapalhar
ou por mais precisão, sem qualquer dolo;
como um “manto de intemperismo” sobre o colo
da rocha ctônica que o possa suportar;
e do latim, em recente derivar,
criaram o termo “solum”, para nô-lo
 
impingir, como se já não nos bastasse,
chamar do solo a poeira um “regolito”
e a rocha fragmentada um “saprolito”,
da pedra conservando ainda instante
bastante características anteriores,
satisfazendo deste modo os professores!
 
REGOLITO III
 
O regolito mais famoso hoje é o de Marte,
que se espera em pouco tempo recolher,
na expectativa do que possa conter
essa poeira sideral em seu descarte...
Acredito que em breve faça parte
do território que então possa preencher
a humanidade, que não para de crescer,
“se a tanto nos ajudar engenho e arte!...”
 
Já não existe regolito em meu jardim,
os caminhos estão cobertos de cimento
e os canteiros de terra vegetal...
Ai, que eu queria poder pisar, enfim,
sobre a Lua ou em Marte, num portento,

mesmo um suspiro que fosse o meu final!

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