NO CORREDOR DA MORTE I – 5 NOV 20
Sempre me dá uma estranha sensação,
ao retirar um comprimido da cartela,
que uma certa percepção revela,
qual prisioneiro ali fosse na
ocasião!...
Tal como já esperassem a execução,
cada um por dia, presos em sua cela
e fosse eu o executor dessa sequela;
pior ainda: que os devorasse qual
papão!
Porque de fato, eu os devoro, um a
um
e então me encaram os sobreviventes,
sabendo bem que não têm apelação
e que no fim, não sobrará nenhum,
acusações firmes em seu olhar,
ardentes,
por não quererem tornar-se refeição!
NO CORREDOR DA MORTE II
De certo modo, sinto igual percepção,
muito embora não esteja encapsulado,
de que na vida sou também
aprisionado
e que da morte estou à disposição.
Muitos que conheci não mais estão,
seu trajeto por aqui já
completado...
Acredito que se encontrem do outro
lado,
ainda à espera da final ressurreição
ou então de reencarnação periódica,
sem nada haver de trágico ou de
gótico,
embora em tal novelo incognoscível.
Mas... e se não for assim? Se apenas
módica
refeição somos todos para esse
estrambótico
executor de quem perdão seja
impossível?
NO CORREDOR DA MORTE III
Não é que nisso creia realmente,
nem o vivencie no decorrer de
pesadelo;
o último que tive, posso bem
revê-lo,
teria doze ou treze anos tão
somente.
Quando encarei criatura ali
presente,
menor que eu, cabeleira em
desmazelo,
a seu redor o ar frígido de gelo,
no fim do corredor, bem à minha
frente,
após meu pai e minha mãe ter
devorado!
Pouco depois, eu li nas “Seleções
do Reader’s Digest” bem claras instruções
sobre como ser mau sonho dominado.
Já tantas vezes tais desfechos
controlei,
que há meio século nunca mais desses
sonhei!
FANTASMAS
URBANOS I – 6 NOV 2020
Se
pesadelos tenho, são reais,
percepção
do que me pode acontecer,
mais um
aviso para me proteger
de
consequências bastante materiais;
perfeitamente
conscientes ademais:
que
algum veículo me possa aparecer
quando
uma rua esteja a percorrer,
que há
motoristas descuidados por demais!
E
ocasião houve, no alto da calçada,
que um
caminhão subiu e, por um nada,
não me
esmagou assim contra a parede!
Este um
exemplo do que a sair eu penso,
fantasma
urbano, não pesadelo denso,
da vida
que ameaça e me prende na sua rede!
FANTASMAS
URBANOS II
Os meus
fantasmas são benevolentes,
alegres
brincam no circuito cerebral,
versos
sussurram, sem me fazer mal,
sendo
fantasmas, não são aparentes,
mas
certas vezes os escuto, até frequentes,
quando
algo perigoso e bem real
pode
ocorrer, de forma natural:
Não Vai! – em conselhos bem urgentes.
E cada
vez que essa voz não considero,
de fato
enfrento qualquer má situação:
da
última vez, fui mordido por um cão!
Com
tais fantasmas urbanos delibero,
sei que
me têm no seu maior apreço
e então
tranquilo em casa permaneço!
FANTASMAS
URBANOS III
Mesmo
porque, na situação atual,
sair à
rua tornou-se mão-de-obra,
há a
roupa de sair que se desdobra,
os
calçados que conservo no portal.
E essa
máscara que ponho no final,
mesmo
porque a Prefeitura cobra,
qualquer
fiscal por uma esquina dobra,
fantasma
urbano de potência material,
sempre
trazendo consigo algum talão,
já
digitado em tablet ou celular,
feliz
da vida ao poder alguém multar!
Tudo me
leva a permanecer, então,
dentro
de casa, na medida do possível,
sem a
armadura de aparato incrível!...
NO
MUSICAL DA BRISA I – 7 NOV 20
Não é
temática em nada original;
quantos
poetas a brisa comentaram,
belos
louvores em seu favor cantaram,
de seu
frescor em gratidão total!...
Lembro
um poema sobre Havana, bem real,
autor e
título da mente me escaparam,
bem
políticos os temas que trataram,
da
Revolução tal brisa era imortal!...
Afastaria
todo o calor insano
da
ditatura de Baptista e então traria
a
liberdade a cada homem cubano!...
Do
feminismo a moda nem se avista,
pois
barba alguma mulher ostentaria
e era
então no masculino que se insista...
NO MUSICAL DA BRISA II
Ante a política, eu sou indiferente,
só acredito na poesia por poesia,
mas é impossível não notar essa ironia
da liberdade mentida à pobre gente.
E Ché Guevara, um idealista ingente,
já suportar esse regime não podia
e assim partiu para triste desvalia,
lá na Bolívia, um mistério ainda potente...
Mas outras brisas por certo são sopradas
e em tantas ocasiões foram louvadas,
pouco me resta que seja original...
De um sonho azul eu me recordo agora,
no alto de um penhasco, nesse outrora,
com a brisa a me abanar em festival!...
NO MUSICAL DA BRISA III
Porém, sem dúvida, foi a brisa alpina
que na Áustria inspirou compositores,
a Beethoven dos potentes estridores,
a Haydn, que para o clássico se inclina.
A Mozart, tão variado que fascina,
a Schubert, o mais delicado dos autores,
aos musicais de Strauss, em seus ardores
e até a Viúva que ao Lehár húngaro se afina...
Mas para mim, toda brisa é feminina,
enquanto zéfiro é seu eterno amante,
mas que separa seu pai, o furacão!
Porém após a tempestade, essa menina
de novo sai a soprar no meu semblante
e beijo deixa bem fundo em meu pulmão!
REGOLITO I – 8 NOV 2020
Quarenta anos atrás, assisti, em empolgação,
Neil Armstrong, descendo de vagar
pela escada de seu módulo lunar,
pisando o solo com a devida precaução!
Embora o veículo visse firme na ocasião,
talvez um pé enfiasse, sem querer
no regolito em demasia e assim poder,
ser a primeira vítima dessa exploração!
Naturalmente, o solo era bem forte
e suportou o seu peso, facilmente;
então Aldrin desceu, também contente...
Deixaram marcas de permanente corte
na superfície lunar que, por enquanto,
não foi de novo percorrido o mesmo canto...
REGOLITO II
O regolito é simplesmente o solo;
têm os cientistas o costume de inventar
novas palavras para o vulgo atrapalhar
ou por mais precisão, sem qualquer dolo;
como um “manto de intemperismo” sobre o colo
da rocha ctônica que o possa suportar;
e do latim, em recente derivar,
criaram o termo “solum”, para nô-lo
impingir, como se já não nos bastasse,
chamar do solo a poeira um “regolito”
e a rocha fragmentada um “saprolito”,
da pedra conservando ainda instante
bastante características anteriores,
satisfazendo deste modo os professores!
REGOLITO III
O regolito mais famoso hoje é o de Marte,
que se espera em pouco tempo recolher,
na expectativa do que possa conter
essa poeira sideral em seu descarte...
Acredito que em breve faça parte
do território que então possa preencher
a humanidade, que não para de crescer,
“se a tanto nos ajudar engenho e arte!...”
Já não existe regolito em meu jardim,
os caminhos estão cobertos de cimento
e os canteiros de terra vegetal...
Ai, que eu queria poder pisar, enfim,
sobre a Lua ou em Marte, num portento,
mesmo um suspiro que fosse o meu final!
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