sexta-feira, 23 de março de 2018





PRESÉPIO DE NATAL E MAIS
WILLIAM LAGOS -- 26/12/17 A 1º/1/2018
presépio em tamanho natural em saragoza


PRESÉPIO DE NATAL - 26/12/17
MAGIA DA MENTIRA - 27/12/17
MAGIA DO SOPRO - 28/12/17
MAGIA DO CHOCALHO - 29/12/17
MÁGIA DA LÍNGUA - 30/12/17
MAGIA DE FIM DE ANO - 31/12/17
MAGIA DA SOMBRA - 1º/1/2018

PRESÉPIO DE NATAL I - 26/12/17

Onde se encontra a magia do Natal?
Naturalmente, no abrir de alguns presentes;
mesmo sendo de fato impermanentes,
para as crianças alegria e festival...

Para os adultos, um nostálgico sinal,
muito mais as lembranças de parentes,
abraço e beijos, mas saudade sentes
dos que se foram do mundo terrenal.

Essa magia se dilui, é indubitável,
permeio a dúvidas e a nossas incertezas,
se inda cremos na imortalidade,

caso a esperança permaneça inquebrantável,
nos rostos velhos ainda traços das belezas
do feminino em transitoriedade...

PRESÉPIO DE NATAL II

Meus avós só conheci quando já velhos,
o que é um fato totalmente natural,
avós aos quarenta exceção muito especial,
mesmo que o tempo já lhes pese nos artelhos.

Quando seus netos escutam seus conselhos,
contos de fadas na hora vesperal,
as guloseimas e mimos, mel e sal,
em nossos olhos veem-se num espelho.

Mas é raro estabelecer-se a relação,
antes que esses avós tenham cinquenta,
mais comum é já na faixa dos sessenta,

tendo mais tempo para a dedicação,
já libertados por aposentadoria,
quando dos pais o trabalho ainda seguia.

PRESÉPIO DE NATAL III

Certa magia se encontra na embalagem
de cores vivas, atrativas e brilhantes...
Coitada!  Irá durar só uns instantes,
estraçalhada por crianças, em voragem

do conteúdo, espalhada como aragem,
decorações, por mais interessantes,
descartadas pelas ânsias inquietantes:
gula e cobiça mais que uma mensagem...

Alguns adultos procedem de igual modo,
curiosa a busca pelo conteúdo.
Eu sou daqueles que abrem com prudência,

enrolam fitas e se dão ao incômodo
de dobrar invólucros com um sorriso mudo,
o presente saboreando com paciência...

PRESÉPIO DE NATAL IV

Sou mais de armazenar e armazenei
durante décadas os presépios de minha avó;
da Europa viera um conjunto só:
reis e pastores, ovelhas eu guardei.

Mas havia muito mais e sempre armei
pela quinzena inteira do Natal.  O pó
a recobrir o presépio em cinza nó
as figuras de algodão que conservei...

Dezenas delas, arames de esqueletos,
com goma arábica colado o algodão,
rostos bordados com longa ternura,

cisnes e pombas, chumaços sobre os tetos,
restos de plantas de passada brotação
e lá no centro, uma criança pura.

PRESÉPIO DE NATAL V

A tradição do presépio é portuguesa;
havia mesmo uma gruta de ametista,
os espelhos a formar dos lagos pistas
e lá no fundo, pintada com destreza,

uma aldeia oriental... Disposta a mesa
contra a parede e até luzes se avista,
lâmpada ou vela, janelinhas numa lista:
era apenas papelão, mas que beleza!...

Minha mãe armava a árvore de Natal,
a tradição preservando da Alemanha
ou da Suíça de meus velhos ancestrais,

raras as bolas nesse sacro carnaval,
bem mais enfeites de cuidadosa manha
de minha avó e das tias maternais...

PRESÉPIO DE NATAL VI

Por muitos anos mantive a tradição,
meus avós mortos, as habilidosas tias,
meus pais morando em diferentes vias,
para meus filhos a magia da ocasião.

De dois terços da sala em ocupação,
meus cobertos verdes... pradarias!
Serragem e pedrinhas nesses dias,
tão transitórias em sua perpetuação...

Tudo, porém, um dia se queimou,
quando houve incêndio em minha moradia;
dois mil discos, dez mil livros talvez,

mas em minha mente esse presépio continuou:
cada figura contra as pálpebras vivia
que o derradeiro holocausto me desfez...

magia da mentira 1 -- 27 dez 2017

"mentira tem pernas curtas", é o que diz
esse ditado de bom gosto popular,
que nas crianças se busca enraizar,
cada inverdade apagada como giz.

mas cedo ou tarde se encontra um chafariz
de tantas máximas a nos enganar;
são os adultos que desejam controlar
as travessuras que ocultar se quis...

e bem depressa percebe essa criança
que aos mais velhos o ditado não se aplica,
pois facilmente retocam a verdade,

seja buscando provocar falsa esperança,
seja afastando a quem mal nos implica,
seja aos doentes distrair por caridade...

magia da mentira 2

mas a perna é bem curta, na verdade.
quando a mentira é coisa de criança,
uma avó a verdade logo alcança,
dobrando da netinha a ingenuidade...

mas percebendo sua duplicidade,
alguns anos depois, pergunta avança:
"a senhora me deu falsa esperança,
minha dor não passa com facilidade!"

"não basta apenas que me dê um beijinho,
dizer que antes de me casar, já sara!"
diz a vovó: "menti, mas por carinho..."

e obtempera a menina, de mansinho:
"então carinho a sua mentira ampara?"
"mas correu pouco, não vês, meu amorzinho?"

magia da mentira 3

ah, se toda a mentira fosse assim!
mas há o efeito da repetição,
sendo contadas o bastante, são
verdades brancas de límpido jasmim...

cada partido político tem jardim
dessas mentiras em vasta profusão,
a própria história a sofrer transformação,
poder e votos ganhando-se, outrossim...

e mesmo confrontada com a evidência,
as pernas curtas ganham boas muletas
e a maioria ainda conseguem enganar;

verdade ouvindo com toda a transparência,
há tanta gente com ambições secretas
de as inverdades agradáveis conservar!

magia da mentira 4

não há mentira maior do que a esperança,
que os helenos, com juízo bem profundo,
junta deixaram entre os mais males do mundo...
desde quando quem espera, sempre alcança?

só quem se esforça conquista sua bonança.
a magia da mega-sena embuste imundo,
um imposto disfarçado a que, jocundo,
cada infeliz contribui sem mais tardança...

são sem dúvida bem longas as suas pernas...
e quanta gente faz promessa a santo,
como se este acreditasse em sua mentira!

só as mágicas da mente são eternas,
nossas tristeza a recobrir com manto
que a saudade em nostalgia vira!...

MAGIA DO SOPRO I -- 28 DEZ 17

Também ouvi dizer que "quem tem boca
não manda outro soprar" -- ou assim diria
quem não se deixa levar por letargia,
porém quem sopra demais até se espoca!

E existe aquele que seu sopro estoca
para o momento de ter mais serventia,
mas sem soprar não há quem conseguia
um João-Teimoso expandir desde sua toca!

Mas quem tem boca, na própria obra enfoca,
sem pedir a ajuda de terceiros,
que só seu sopro lhe darão de má vontade,

ou para seu pedido a orelha mouca,
só de seus próprios interesses sobranceiros,
sem se disporem a ajudar-te, na verdade.

MAGIA DO SOPRO II

Não obstante, o soprar tem sua magia,
não apenas no preencher de algum balão,
também pode insuflar a multidão,
que a seu silvar depressa atenderia!...

Todo segredo também tem serventia,
que a garantia do poder é a informação,
por que compartilhá-la sem razão,
a outrem dando a força que nos guia?

Sopro existia até na "sabatina",
como aos testes se chamava antigamente...
um cochicho solidário é natural,

porém mais mal do que bem fará, que ensina
a depender dos outros, certamente,
sem jamais plantar flor no seu quintal!

MAGIA DO SOPRO III

Mas de todos os sopros o mais belo
é aquele sussurrado ao pé do ouvido:
"Eu te amo!" -- num murmurar querido,
a reforçar as muralhas do castelo,

construído com carinho e todo o zelo,
sobre alicerce uma vez mais trazido,
mesmo sendo brincadeira sem sentido,
vento feroz é a força desse apelo!...

E qual o tolo que mandaria assoprar
esse "Eu te amo!" no ouvido de sua amada
por um qualquer que a possa conquistar?

Só Cyrano de Bergerac, o infeliz, foi ajudar
um outro a conquistar sua idolatrada,
descrente, por ser feio, de a alcançar!...

magia do chocalho 1 - 29 dez 17

"para boi velho se dê chocalho novo";
eis um ditado bastante malicioso,
referindo algum retorno do amoroso
para algum velho que, segundo o povo,

de outra parceira precisa, por renovo
de seu pode viril mais vagaroso,
com mulher jovem retomado portentoso;
mas não afirmo que com isso me comovo.

na verdade, desde o tempo de abraão,
que gerou filhos só na senectude,
mantendo em si plasma germinativa,

sem ser milagre, realmente, essa ocasião,
que a andropausa é mentira com que ilude
a seu marido a mulher não mais ativa...

magia do chocalho II

realmente, a tragédia feminina
é a menopausa, quando a natureza
dela desiste, quase com presteza,
pois já não pode cumprir a antiga sina

de a raça transmitir, a que se inclina
todo o organismo através de sua beleza
enquanto pode ser mãe e, com certeza,
cada sinal de sua velhice se aproxima...

nesse sentido, é cruel a biologia,
pois se já não mais possui fertilidade,
que dê lugar a quem ainda a possua...

essa a razão de existir poligamia:
escolhe a esposa, com naturalidade,
a concubina que a substitua!...

magia do chocalho III

mas entre nós, a rigidez da religião,
impondo aos homens a monogamia
(o celibato nem a isso permitia
a qualquer padre após sua profissão!)

a andropausa inventou-se por magia,
qual se tivesse igualmente duração
o vigor masculino, para satisfação
da esposa única que assim o prenderia...

o resultado sendo os adultérios
(e entre os padres, psiu! - pedofilia,
já que o pecado só existe na mulher...)

assim forçando a muitos homens sérios
divórcio que aceitar ninguém queria,
para a esposa lhes cobrar quanto quiser!

magia do chocalho 1V

o que de fato existe á a novidade
de alguma chance de fecundação
nessa mulher diferente das que estão
ainda capazes de fecundidade.

mas outras coisas há, na realidade
que ao homem velho por chocalho são,
algum esporte que lhe dê satisfação,
leituras, algum clube, sociedade.

nem todos podem esgotar-se na poesia
ou sublimar seu sexo em pintura,
ou sequer escrever algum romance...

mais ai de quem, vinda a aposentadoria,
sem jardinagem ou outra qualquer cura,
deixe a vida passar só de relance!...

Magia da Língua I -- 30 dez 2017

Desde o começo amei essa mulher;
era tida por bela, mas pouco me importava;
sua inteligência era quanto me empolgava,
que em nada me lembrava outra qualquer.

Deixei por ela tudo e nem sequer
mais versos fiz que a erudição mandava;
como outros cegos, paixão me governava,
estar com ela todo o meu mister...

Por muito tempo falamos igual língua;
eram seus lábios que eu mais amava,
não para beijos, mas pelo que expressava

até que um dia, como em ardor de íngua,
abertamente declarou que não falava
igual linguagem com que me expressava!...

Magia da Língua II

Mas devo confessar que sua beleza,
passado o tempo, maior me pareceu;
muito prazer, enfim, me concedeu,
mais do que em frases de pura singeleza.

Mas devo confessar que, por torpeza,
algumas vezes com suas frases me magoou,
com suas sentenças até me condenou
a longos dias de singular tristeza...

Mas devo confessar que ainda a admiro,
por mais que dela discorde tantas vezes
e que por nada no mundo a deixaria...

Seus preconceitos entranhados nunca firo,
por mais que troce de minhas próprias teses,
carinho vendo por detrás da zombaria.

Magia da Língua III

E em desfastio, embora me afirmasse
que a mesma língua ambos não falamos,
não há verdade. pois nos comunicamos,
no entendimento da frase que perpasse

e de algum modo nos complementamos,
passados tantos anos desse enlace;
e que nenhuma influência lhe tocasse
ela se ilude, se bem que nos amamos,

mas ela é hoje bem diversa do que era,
mudou os horários em função de seu irmão,
em alguns modismos achou aceitação,

mas é leal e acredito ser sincera
e a mesma língua ainda os dois falamos,
sem ser a mesma dos primeiros anos.

MAGIA DE FIM DE ANO I -- 31 DEZ 2017

Nenhuma Mensagem Nova
Tampouco Sairá de Mim,
Qualquer Frase Pretensiosa.
Que Irei Calar-me, Por Fim,
E Então Saberei, Assim,
Nesta Rima Sigilosa,
Que Sou Feito de Capim,
Na Rigidez de Minha Cova.
Perante a Tela Brilhante
Desgasto Meus Sentimentos
Numa Paciência de Jó,
Masturbando-me Incessante ,
Distribuindo Pensamentos,
Para Depois Dormir Só.

MAGIA DE FIM DE ANO II

     Não me Traz Qualquer Mensagem
Essa Chuva de Foguetes,
A Ilusão Desses Joguetes
Não Me Atinge por Miragem.
Não Vejo a Menor Vantagem
Nessa Troca de Confetes,
Nos Votos que Me Projetes
De Ano Novo em Vassalagem.
Desejo Apenas me Impor
A Meus Velho Executor,
Por Sua Vez Executado,
Com Longas Barbas Mostrado,
Em Fraldas Seu Sucessor,
Que Só Encaro Desconfiado!

MAGIA DE FIM DE ANO III

Na Verdade, o Calendário
Está Muito Defasado,
O Juliano Preparado
Por um Papa em Seu Erário.
Cortou Dias do Sacrário
Desse Ano Malfadado,
O Juro Foi Apressado
Ao Rico e ao Pobre Operário,
Que o Banco do Vaticano,
Rapidamente Embolsou
E a Muitos Prejudicou
Na Poda Daquele Ano,
Mesmo Tendo Boa Razão
Para Tal Imposição.

MAGIA DE FIM DE ANO IV

Muito Maior Tal Magia
Júlio César Provocou,
Quase Dois Meses Cortou
Na Operação que Fazia
Que o Juliano Permitia
E ao Império Dominou;
Bem Depressa se Aceitou,
No Domínio que Existia,
Pois Cada Ano, de Fato,
Os Dias Não Traz Exato
De Seu Trânsito Solar
E Mesmo Havendo Bissexto,
Pouco a Pouco Sobra um Sexto,
Que Vem aos Meses Adiar.
 
MAGIA DE FIM DE ANO V

Mas a Ortodoxa Igreja
Até Hoje Não a Aceita
E a Mudança Só Sujeita
Quem o Anel do Papa Beija.
A Economia se Aleija,
Existindo Nessa Feita
Católico Rei Que Rejeita
A Mudança que se Enseja,
Até Ser Feito um Acordo,
Do Dízimo Tendo Adiamento
Ou Mesmo em Parte Isenção
Os Marinheiros a Bordo
Surpreendidos no Momento
Do Retorno à Sua Nação!...

MAGIA DE FIM DE ANO VI

Mas o Calendário Atual
Já Se Encontra Deslocado,
Há Décadas Procrastinado
Seu Ajuste Natural.
Portanto, Não Dou Aval
Ao Evento Proclamado;
Foi o Ano Misturado
E o Verão Começou Mal.
Mas se Até Cristo Jesus
Não Nasceu Nesse Natal
E Nem Sequer no Ano Zero,
O Espetáculo Produz
Magia Desnatural
E Este Ano Nem Espero!

MAGIA DA SOMBRA I -- 1º JAN 2018

Sem dúvida, é sua sombra que ainda quero,
a que pensei que fosse e me enganei,
em cuja ingenuidade acreditei,
em meus momentos de tranquilo desespero.

Não julguei mal que tal amor fosse sincero,
mas era amor por si e não provei
igual amor àquele que lhe dei,
somente tive um fado mais severo.

Sei bem que a amo, é certo, e até desejo,
Sinto carinho a cada vez que a vejo,
imerso em minha estranha divisão,

nesse onanismo apenas complacente,
em que a luxúria não passa de incidente
que me alivia, mas não traz satisfação.

MAGIA DA SOMBRA II

Talvez pareça ser o ano novo
que à alma hoje me traz melancolia,
mas sentimento já em mim crescia,
sem nada a ver com a folia dessa povo,

que realmente anseia por renovo
e mais ainda o feriado pretendia.
pois ninguém ao Ano Novo saudaria,
sem a ânsia folgazã a que reprovo.

Sou eu que a vida levo complacente:
basto a mim mesmo. Tantos interesses
ainda cultivo, que me trouxe a sorte,

mesmo que seja realmente indiferente
e sequer me dispusesse a fazer preces,
se fosse hoje me anunciada a morte.

MAGIA DA SOMBRA III

O dia do Ano Novo é sombra esguia,
igual a tantos outros para mim;
 champanha estouram para beber assim,
porém champanha alguma eu beberia.

Porque não gosto das borbulhas que traria,
nem do ressaibo agridoce de seu fim;
de um vinho tinto eu seria mais afim,
se não fosse um verão que aqueceria

ainda mais. Tão melhor que fosse inverno
esse período em que a sombra se celebra,
por entre a neve, desencanto em trégua,

da primavera a esperar-se o sopro terno,
mas o período que essa sombra quebra
só corta a trança do verão em torta régua.

MAGIA DA SOMBRA IV

Não obstante, a sombra traz magia,
tanta esperança, tanta expectativa,
os fogos de artifício, em explosiva
cinza que apenas o Novo Ano guardaria!

E ao pensar que um novo ano se inicia
quando o imaginam como vida rediviva,
a esguia sombra é apenas uma ogiva,
sem a bomba nuclear da antipatia...

Mas se algum modo se alegra a humanidade
ao ver da sombra o especular adejo,
algo de mágico no espetacular.

E a sombra paira em sua curiosidade...
Se ergo a cabeça, facilmente a vejo,
sem que perceba o porquê do festejar!


William Lagos
Tradutor e Poeta – lhwltg@alternet.com.br
Blog:
www.wltradutorepoeta.blogspot.com
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