MARES COAGULADOS &
MAIS
Novas séries de William
Lagos – 1-12/6/16
MARES COAGULADOS I – 1º JUN 16
Inundada de silêncio, cai a noite,
cada pássaro a espantar para seu ninho,
entre as palhas e gravetos, de mansinho,
lá fora o vento de milenar açoite;
descem as feras diurnas para o acoite,
pleno o estômago de alimento no cadinho;
a cada cria lambe a mãe, devagarinho,
junta-se o gado no redil do seu aboite.
Eis um momento de curta duração,
mesmo não sendo por nós interrompido:
surge da vida noturna o despertar;
os insetos cricrilam e lá estão
os mochos e corujas no incontido
tétrico e frio melancólico piar...
MARES COAGULADOS II
Inundada de silêncio a madrugada,
justo na hora anterior ao amanhecer,
novamente se cala... e a passarada
quer nos seus ninhos algo mais permanecer.
E o tempo todo observa, em aquiescer
toda a vegetação, salvo a fechada
floração, sempre na espera do aquecer
da luz solar e da abelha despertada.
O mar aquático nunca tem o seu descanso,
mas existe esse mar verde sobre a terra,
cujas vagas são somente despertadas
pelo soprar do vento, em seu balanço,
que desce em veste de luar que o encerra
e move a grama quais serpentes onduladas.
MARES COAGULADOS III
Mas quando a noite dorme no silêncio
não chega o vento para o farfalhar,
não vem a brisa os ramos agastar
e o verde mar se estende em liso lenço.
E cada galho, em tal silêncio denso,
o ramo ao lado limita-se a afagar;
quem mora em ninhos não tenta despertar;
sobe a fragrância da seiva como incenso.
Essas mil lâminas das extensas pradarias
que erige a relva nesse então se coagulam
copas das árvores são estátuas que se anulam;
mares de verde em suas raízes frias,
mas lá no fundo permeia seu crescer,
que jamais a olhar humano é dado ver...
MARES COAGULADOS IV
Dorme o silêncio envolto em longa nata,
enquanto dorme a verde ebulição;
mesmo o rocio a sofrer tal rendição,
mar coagulado toda a imensa mata,
até que, enfim, a vaga se desata,
pequeno zéfiro perturbando a multidão
de lianas a sibilar em inquietação,
tal qual maré que sobre a areia abata,
enquanto a gente nos leitos ainda dorme,
também se achando no sono coagulada,
o vasto mar da atividade em suspensão,
salvo no agito de um pesadelo informe,
aos quefazeres depressa despertada,
no resmungar dessa maré de exaltação...
CHIKUNGUNYA I (*) – 2/6/2016
(*) Doença Dobradeira, no dialeto Makonde.
Não é ideia minha.
Algures li
que essas novas doenças africanas
foram criadas por gentes desumanas
para impedir que cresçam mais ali
tais multidões, cujo clamor ouvi
pela televisão, suas vidas em chicanas,
passando fome e sede... por arcanas
razões ainda a crescer tal qual eu vi.
Seriam doenças criadas por cientistas
para impedir que crescessem ainda mais
e que na África seriam circunscritas.
Mas vírus e bactérias se abrem pistas,
quaisquer fronteiras a romper artificiais
e assim se espalham tais frutas malditas!
CHIKUNGUNYA II
Nessa teoria de conspiração
foi a AIDS mencionada inicialmente;
na Chikungunya falam atualmente
e assim na Zica de tanta ampliação.
Ora, é certo que oriundas todas são
das plagas africanas, realmente,
que a Dengue nos chegou, bem claramente,
nos tristes tempos da negra escravidão.
Mas foi a AIDS contraída de macacos,
depois passada aos soldados cubanos
que ao Congo foram defender o comunismo;
e quando retornaram, tristes cacos,
depressa a transmitiram aos haitianos,
que a levaram para o lar do consumismo...
CHIKUNGUNYA III
Já os mosquitos são bastante empreendedores
e nos chegaram em navios ou aviões,
logo picando nossas próprias multidões,
tal Chikungunya a transmitir com seus terrores.
Doenças houve com máximos pavores,
a Peste Negra condenando gerações,
era a Bubônica a dizimar nações
e mais a Sífilis com seus muitos horrores.
Porém chegavam da China antigamente,
que para a Europa enviou até o Sarampo,
por caravelas ou por longas caravanas...
Gripe do Frango, bem mais recentemente,
a Gripe Suína também vinda desse campo
e até a Influenza com venenosas ganas...
CHIKUNGUNYA IV
Mas ninguém diz que os chineses as criassem
pelo prazer de contagiar os europeus;
milhões morreram dentre os filhos seus
antes que a insídia além-fronteiras exportassem.
Então por que alguns cientistas se aprestassem
por motivos de racismo ou ódios ateus,
tal e qual exterminaram os judeus
e assim nas terras africanas espalhassem?
Talvez um louco, odiando a humanidade,
para si próprio Apocalipse criando...
Seria alguém que, por tola iniquidade,
favorecer quisesse a ariana gente,
povos escuros destarte dizimando,
ao sofrimento totalmente indiferente...?
CHIKUNGUNYA V
Se por acaso algum doido assim houvesse
e que tivesse conhecimento suficiente
e assim criasse qualquer vírus diferente,
que só uma certa característica afetasse...?
A quem tivesse carapinha só matasse
ou olhos oblíquos da chinesa gente,
ou olhos azuis a eliminar somente
e a tal genótipo tão só se limitasse...
Mentalmente convencido que a eugenia
necessitasse do espaço que essa impura
etnia oposta estivesse a ocupar...
Talvez aos claros tão só massacraria,
morte rápida que fosse ou de tortura,
na Europa e Américas abrindo mais lugar...
CHIKUNGUNYA VI
Mesmo que houvesse tal mente desregrada,
com mil recursos e total conhecimento,
as bactérias não terão controlamento,
que a mutação se realiza inesperada...
Infelizmente a religiões é consagrada
a decisão sobre tal discernimento;
já foram gases espalhados com talento
para matar, de uma forma inesperada,
mil passageiros, de inocência relativa,
já que ninguém de culpa está isento...
Tanta ameaça que se apoia nessa lógica!
E a ideologia política ainda é viva:
que seja o mundo dominado num momento
pela ameaça de tal guerra biológica!...
MAIS GALÉ DO QUE GALÃ I
– 18 jan 2006
Amor não dá dinheiro:
apenas gastos
e desperdícios de tempo
e numerário.
Muito melhor é o tempo
multifário
dispender em projetos
bem mais vastos...
Tais como: pôr em dia
esses desgastos
dos impostos e das
taxas: esse vário
perfurar dos intestinos,
atroz fadário
de sustentar do governo
os falsos rastros...
Assim não quero mais do
amor aos gestos
me entregar, neste ano
que inicia,
tendo livros para ler,
tendo poesia
amortalhada em esboços
imperfeitos...
Porque de mim os versos
brotam lestos (*)
e nem penso em
corrigir-lhes os defeitos...
(*) Rápidos.
MAIS GALÉ DO QUE GALÃ II
– 3 jun 2016
Para o amor já meus atos
são mais falhos:
meus erros surgem e é
preciso corrigir;
que não se julgue mal
meu perquirir,
que não se julgue mau
efeito nesses talhos,
que amor me brota qual de
arbusto os galhos,
mostrando espinho que
possa te ferir;
sua seiva brota enquanto
eu existir,
golpes de versos quais
bigorna e malhos...
Mas sempre é fácil ser
mal interpretado,
por mais que o amor seja
bem intencionado,
eu nunca te vi antes nem
hoje te conheço,
só exalo essa emoção que
anseia te agradar,
pequenas alegrias
querendo em ti gerar
e que meus versos leias
é só o que te peço...
MAIS GALÉ DO QUE GALÃ
III
Recorda inicialmente que
sequer teu endereço
encontro em qualquer
parte, para diretamente
enviar-te este preito da
alma imprevidente;
teu nome nunca vi, teu
rosto desconheço;
mas eu te mando aqui um
poema de adereço
que muito apreciaria de
teu colo ver pendente,
que amaria percebê-lo no
coração presente:
amor desconhecido, porém
que nunca meço...
São turvos estes versos
que ora aqui te escrevo!
Talvez leias na rede em
forma digital,
talvez alguns incluam em
morna antologia,
talvez mesmo publique,
achando que te devo
os cem caracteres de um
sonho seminal,
de quem nunca te viu, mas
te ama neste dia!
MAIS GALÉ DO QUE GALÃ IV
Mas caso faça a corte no
dia em que te veja
é certo que imperfeitas
pareçam minhas ações,
as propostas de carinho
em novas relações,
canhestras as palavras
de quem só tua alma beija.
Hás de olhar ao galã, pensando
que graceja,
sem nada a perceber de
tuas sensações...
Mas se agora as
descrevo, as minhas intenções
resultam da pressão que
dentro dalma enseja.
Para o amor e para o
verso não sou mais que galé,
forçado remador algemado
a esta galera,
que reciprocidade nem um
só momento espera.
E quem diria agora que
respondesse até
a tão diverso exposto
paupérrimo em soneto
de uma década atrás
revelando amor secreto!...
LEITOS ESQUIVOS I – 20 jan 2006
Assim, não quero mais saber de amores:
há muita coisa atrasada em minha vida,
além de impostos e da pilha dolorida
dos versos e sonetos aos bolores...
Pois nem chego a digitar. Tenho meus selos,
postos de lado há anos... Tantas cartas
não respondidas... Das horas fartas
em que fazia de estampilhas meus desvelos...
E tantos livros ainda por ler, acumulados
às dezenas, em minhas longas prateleiras,
só arranjo tempo para ler as traduções...
Pobres livros, esperando, ainda fechados,
ou de ficção ou de histórias verdadeiras,
de alheias mágoas e estranhas emoções...
LEITOS ESQUIVOS II – 4 JUN 2016
E novamente penso ao verso estar traindo,
escrito anos atrás, em pura impertinência;
porém, passados anos, conserva-se a potência,
passada a década, amor sempre bem-vindo...
Sem mentir, há três mil versos tristes rindo,
sufocados em sua poeira de impaciência;
sem mentir, me permanece a mesma ardência,
perpétua a ponta da caneta percutindo...
Cada soneto é um leito de cobertores frios,
alguns lençóis modestos, estampas de algodão;
nada redijo sobre linho, nem em papel de seda.
Esquivos esses leitos de amortecidos cios,
alguns vazios até por duas gerações:
a ser de amor tecidos caso a vida me conceda!
LEITOS ESQUIVOS III
Muitos dos livros ainda fechados permanecem,
acrescidos, talvez, de uns dois milhares,
guardados com cuidado, à parte dos azares,
mas cujos títulos até meus olhos já os esquecem.
Seus conteúdos sem vida por certo ali padecem,
a reviver somente sob a faina dos olhares,
dormindo inquietos em malfadados lares,
fugazes notações que a ninguém hoje enriquecem.
Também conservo a coleção de selos,
mais de meio milhão, acredite quem quiser:
duzentos mil apenas deixei classificados.
E caso eu morra, sem retomar desvelos,
será que alguém os álbuns irá folhear sequer
ou em lento desbotar serão embolorados?
LEITOS ESQUIVOS IV
E quanto a estes sonetos, de fato, nada espero;
são apenas confissão de um suave desespero,
no rascunhar perpétuo que a cada dia eu gero;
e quando os passo a limpo, aos antigos ultrapassam.
Aos velhos originais várias décadas já espaçam;
da naftalina seu perfume unicamente abraçam;
somente espero ainda que tais não se desfaçam:
na maioria são belos... alguns poucos lero-lero...
Mas permanece assim a perene compulsão
de baralhar em versos o meu abecedário,
enchendo fragmentos de papel e cartolina...
Deixando algo de mim nessa lenta comunhão,
tal qual alguns existem que redigem seu diário,
deixando outros em branco tantos dias de sua sina...
O GATO DESPERTADOR I – 5 JUN 16
Eu durmo junto à janela de meu
quarto
e tenho um gato que insiste em me
chamar,
desesperado e insistente o seu
miar,
até do leito me conduzir ao
aparto!...
De tanto mimiar ficando farto,
cobertas quentes destarte a abandonar,
vidro e postigo então a
escancarar:
tem sete meses desse dia o
parto!...
E nada serve voltar a meu
quentinho
depois da porta logo a seguir lhe
abrir:
descida a escada, completado o
seu nutrir,
já a cantilena reinicia esse
gatinho
e o estardalhaço renova-se, potente,
para que esfrie uma vez mais o
meio-ambiente!...
O GATO DESPERTADOR II
Se meu sono foi embora, então
levanto,
tiro o pijama, inicio o meu
ritual,
roupas do dia a vestir como
enxoval:
dos passarinhos já escuto o canto...
Sem ocasião de destilar meu
pranto,
seriam as lágrimas um lento
festival,
gotas de gelo a fluir em bacanal,
já afastando do dia o temor
santo,
para empreender das abluções o
rito,
depois forçado a estender os
cobertores,
meio dormindo, no aguardo da
chaleira...
Enquanto o gato se balouça no
infinito,
já consumidos de seu miar os
estertores,
cada ordem que me deu cumprida
inteira...
O GATO DESPERTADOR III
Já acima mencionei possuir um
gato,
mas a verdade deve ser contrária:
eu sou apenas a alma solidária
que lhe serve a ração, constante
fato!
De que ele seja o dono, há um
boato,
que sou forçado a aceitar, em
sorte vária,
estabelecendo para mim razão
hilária,
que diariamente a trabalhar me
bato!...
Enquanto o gato nos telhados mia,
seja brigando ou como um
trovador,
pois ele é artista e sou apenas
operário;
que seja o dono já não mais
duvidaria,
casa e alimento de bem alto
valor:
felino escravo tornou-se o meu
fadário!
COGULAS I (*) –
6 jun 2016
(*) Capuzes nos
hábitos de monges.
Caso eu fosse
europeu, seria fácil
A descrição das
imagens dos trigais.
Ao meu redor,
porém, só milharais
De talos
grossos, visão bem menos grácil.
Por mais
douradas as espigas, bem difícil
Compará-las a
ondulares siderais...
“Trigais no Azul”,
descrições bem naturais,
O vento a
perturbar hastes qual míssil...
São as espigas
de trigo quais cogulas
A recobrir dos
monges as cabeças.
Trazendo em si
o farináceo pão.
Atendem monges
a diferentes gulas,
A percorrer dos
mosteiros longas peças,
Tecendo preces
em favor da salvação!
COGULAS II
Também espigas
de trigo são coroas
Quais de
iridiados raios resplendor,
Auréolas doces
ondulando no calor,
Flexíveis talos
ocos sob as proas.
Espigas de
milho já bem diversas loas
Entoam para
nós, tais quais pesada flor,
Em sementes às
dezenas seu vigor,
Vários impérios
a nutrir com grossas broas.
Têm seu pendão,
também, mas não cogula,
De fato lembram
muito mais cocares,
Pois delas os
ameríndios se nutriram,
Que de
alimentos reuniram vasta bula,
Mortos pendões
se abandonam nos lugares
Que hoje em
rações moídas persistiram.
COGULAS III
Para deuses
diversos iam suas preces;
Não foram nunca
à uva consagrados,
Nem como
hóstias sendo mastigados:
Longas fiadas
ruminadas dessas messes.
Só monges pobres
resultando desses
Cilindros de
ouro nos campos cultivados;
Buréis de palha
trazem, enrolados,
Barbas
castanhas em desgrenhados meses.
Mas os aztecas,
de estranho pensamento,
Nosso Senhor, o
Esfolado, o apelidavam
E quando
qualquer infeliz sacrificavam
Sua pele
inteira, em atroz padecimento,
Dele arrancavam
e nos campos o atiravam,
Seu sangue
adubo até findar o seu tormento!
COGULAS IV
Feroz seria a
cogula desse alento!
O sangue a
escorrer do crânio exposto,
Pelos malares
descendo igual que mosto.
Vinho da morte,
eucarístico portento!
Não tenho vinha
e trigo em tal momento,
Deuses ferinos
a lhes impor seu gosto,
Um holocausto
para os demais reposto,
Arrancando
corações em batimento!...
E a tal cogula
de sangue do infeliz
Vira batina de cor
avermelhada,
Esgarçando,
pouco a pouco, até os pés!
Quanta maldade
a religião lhes diz:
Seria a
colheita assim santificada
Por esse
ordálio terrível de suas fés!
TERNA TERNURA I
– 7 JUN 16
A mente se
apaixona e culpa o coração;
O sexo se
assanha, a pôr culpa na pele
E a tal
dicotomia sem resistir se atrele
Em cada
sentimento o fígado ou o pulmão.
O coração do
amante só explode em pulsação
Se enxerga essa
figura que se deseja sele
Nas narinas tal
odor que aos pulmões apele,
No fluir de
inesperada e súbita ereção.
Que pode mesmo
ser bastante embaraçosa,
Dependendo do
lugar e mesmo da ocasião:
Nem sempre a
excitação em público é apreciada,
Por mais que se
mencione que na sacada a rosa
Com seu cravo
brigou e no ato da paixão
Feriu-se ele e à
outra deixou despedaçada...
TERNA TERNURA
II
Perante a
infância se mostra este eufemismo,
Apenas
provocado por tal briga de amor,
Catalisando
assim, em todo o seu vigor,
Um ato a
disfarçar em seu terno modismo;
Porém já se
previne, talvez com idealismo
Que mesmo o
amor da mente ao corpo dá calor
E nesse
engalfinhar gentil de seu favor
Transformação
se causa de vero realismo...
Comum é o
disfarçar, em palavras de ternura,
Essa atração
sexual da biologia dura,
Que o cravo não
pretenda de fato algo romper
Nesse botão da
rosa de gentileza pura,
Mas vindo o
tempo asado para seu florescer
Trará corte
maior na dor feita doçura...
TERNA TERNURA
III
Contudo, amor
havendo, é secundário o sexo,
Maior que seja
assim sua fera compulsão
O cérebro controla
ao pulsante coração
E o impulso
gerador reveste de outro nexo.
Mas cada
relação detém seu próprio amplexo:
Difícil
descrever sua regra ou seu bordão;
Há quem
pretenda amor guardar em seu pulmão,
As palavras
mais gentis envolvendo tal reflexo.
E existe quem
afogue no relacionamento
A alma na
paixão.erguendo um pedestal
Que o anseio de
possuir a carne lhe faz mal,
Enquanto sente
outro diverso julgamento
E quer ter de
imediato a carne que deseja
Até nesse
momento em que mais terno a beija...
CHAMAS DE PRATA I – 8 JUN
16
Se te amo com meu corpo,
eu te amo com minhalma,
pois entre nós existe a
conjunção almal
sempre que ocorre aqui
conjugação carnal:
a alma emprenha a alma e
ganha a mesma palma.
Se a cópula é completa,
então nos vem a calma
e as carnes se separam no
instante do final,
porém as duas almas acham
débito imortal,
unidas permanecem noutro
orgasmo que as embalma.
Todo prazer corporal traz
algo de sinistro,
sempre que augura a morte
no instante de acabar
e para renová-lo há a força
do esperar,
mas o prazer da alma é um
toque em puro sistro, (*)
tangendo muito além do
copular voraz,
entremeado de delícia,
ferocidade em paz.
(*) Pequeno instrumento de
percussão de som metálico.
CHAMAS DE PRATA II
Isso que ganha o corpo,
após o sacrifício
em que a satisfação degola
o seu desejo,
no apagar subitâneo desse
estelar lampejo,
alcança-se igualmente na
entrega a qualquer vício.
Amor de amor, mesmo em
carnal solstício,
perdura lentamente no
saborear do beijo,
mas não sofre extinção no
copular gracejo
e da satisfação a própria
morte é um benefício.
Amor de carne,
destemperado malefício,
quanto mais seja
obtemperado em incerteza,
é aurífera explosão que
inteira se desfaz,
de um biológico assalto
exerce o ofício,
vaga esperança de conservar
a correnteza
que a um novo século
continuação nos traz.
CHAMAS DE PRATA III
Contudo, amor de amor que
à carne excede.
em sua aparência bem menos
orgiástica,
sem a explosão de procela
mais bombástica,
sem sinfônica partitura em
que se enrede,
implode para dentro e em
nada cede,
cada alma a se expandir em
luz elástica
a outra interpenetra em
giesta plástica
e àquela entrega muito
mais do que lhe pede.
É quando se desperta o
antigo mito:
penetra a alma em seu
cósmico grito
na outra alma, mas inteira
se conserva,
enquanto a outra em tal
postura se duplica,
seu aumentar tornando-a
ainda mais rica,
ambas senhoras e cada qual
a serva.
CHAMAS DE PRATA IV
Não obstante, sendo
orgasmo chama de ouro
que não consome em
virulenta combustão,
zombar dos deuses, por sua
curta duração,
das espermátides um vasto
matadouro,
mostra o caminho inicial
do nascedouro
de outro orgasmo sideral,
pura emoção,
enraizada floresta em seu
botão,
caramanchões a conduzir ao
grão tesouro.
E quando a alma se arroja,
feito prata,
nessas chamas que em nada
nos comburem,
que não aquecem quando a
carne explode
é pelos nervos que a
paixão então desata,
que se encham desse ardor
em que perdurem
gotas de luz no frescor
que à alma acode.
CHAMAS DE PRATA V
E no entretanto, ocorrida
a calmaria,
alguns momentos depois já
vertem ouro;
muitos têm sono após o
vertedouro,
costas voltando para quem
antes se queria;
por mais delícia de que um
sonho lhes traria,
a um dos corpos descendo
em paradouro,
diversos sonhos teria, em
seu desdouro,
algum parceiro, mesmo
quando o abraçaria,
ainda o suor a respirar e
a caloria
que exsuda após o vigor
desse exercício,
cheirando a nuca e a fonte
dos cabelos,
quando um braço sobre um
peito se estendia,
tomando o outro de travesseiro
o ofício,
nesse gentil reclamar de
seus desvelos.
CHAMAS DE PRATA VI
Contudo, é outra a
exaltação que brotaria
quando a alma alcança
noutra alma o pasmo,
sem depressão pós-coital
após o orgasmo,
mas justamente a exultação
que explodiria
quando a borrasca sucede à
calmaria,
cada vetor a bailar no
intenso casmo, (*)
sem qualquer insinuação de
algum marasmo,
enquanto a alma noutra
alma se imiscuía.
(*) Abismo sideral.
Não se separam as almas
após tal completude,
mas permanecem nessa
intensa vastidão,
som das esferas da estelar
constelação,
argêntea chama que afiada
ambas escude
de qualquer mescla de
grosseiro material,
tangendo a prata em
permanência sideral!...
CHAVE DE AMOR I – 9 JUN 16
Por detrás de minhas costelas; te coloco
e dou-te assento nos ossos dos quadris;
destas imagens fisiológicas talvez ris,
porém amor me atinge a mente como um soco;
é pelos olhos e narinas que hoje emboco
tais sentimentos e os protejo qual nutriz,
por mais que sejam minhas ações viris
no interior do coração o amar aloco.
Amor é um filho que seja ali gestado,
a que alimento com o sangue da esperança,
que não definhe por falta de cuidado,
mesmo sem ter da excitação maior pujança,
tal qual o ato sexual é dispensado
após gerada já ter sido uma criança!...
CHAVE DE AMOR II
Eu me comparo, destarte, inteiramente,
a essa mulher que traz sob as costelas
os embriões de quaisquer crianças belas,
seus quadris a alargar-se lentamente,
enquanto aguarda que a ossamenta se lhe assente
e que as placentas se formem como telas,
em segurança as novas vidas assim tê-las
e tudo aceita, mesmo a dor mais inclemente.
O gerador de seu ventre teve a chave
que o corpo aceita até contra a vontade,
sua fechadura acatando a biologia;
e então o filho ali flutua igual que nave,
nesse âmnio sagrado da piedade,
até o momento em que nascer devia!...
CHAVE DE AMOR III
Do mesmo modo, assim aceito o gerador:
o inesperado e sorrateiro sentimento,
que me perfura da pele o integumento
e o peito atinge como chave desse amor.
Do sentimento sou tão só o receptor
e de gestá-lo internamente me contento,
umbilical amor no peito atento,
mas que no cérebro se enraíza com vigor.
Contudo, o organismo é masculino
e esse embrião que penetra por meus olhos
sofre no corpo processos bem diversos:
pouco a pouco se inculca outro destino,
da alma me extraindo mil refolhos,
nascendo à luz em miríades de versos.
A CHAVE DO MEDO I – 10 JUN 16
Esses mil versos que saem tão facilmente
de carne e sangue tiveram geração,
os dedos a encurtar da destra mão,
que assim se encolhem com a produção frequente,
porque tal jorro que sai de mim, frequente,
não é somente a diletante criação:
quando ele explode desfaz certa emoção
e empós vêm outros em seu pulsar fremente.
Do verso a geração faz-se inclemente,
tantas sentenças ansiando ver a luz,
raras sentenças que algum prazer me aportem,
pois vêm à luz em esperança descontente,
sem encontrarem a glória que as seduz,
mas um milhar de ferimentos peri-mortem.
A CHAVE DO MEDO II
Talvez o que mais cause sofrimento
é não saber qual destino que as espera;
lanço no ar dos versos a galera
e lá flutuam sem maior aleitamento.
Sem nem sequer qualquer alentamento,
abandonados à sociedade besta-fera,
que muito mais mediocridades gera
e os indifere ou lhes traz sufocamento.
Por que então fazer mais versos deveria?
Mesmo que os leia um círculo de amigos
de forma alguma isso os isenta de perigos,
mesmo centenas a florescer em antologia,
milhares deles da rede digitados,
sem que por isso se achem preservados...
A CHAVE DO MEDO III
Que os versos tenham seu reconhecimento,
sem que meu nome necessite ser lembrado;
que eu mesmo seja enfim pulverizado,
mas que se espalhem nas mentes em portento!
Por seu valor a encontrar merecimento,
cada poema de glórias perolado!...
Pouco me importa que seja algum plagiado
ou que afirmem surgir de alheio pensamento.
O que eu não posso é mantê-los enterrados,
como as moedas desse lenço proverbial;
contudo escrevo, sem tolas esperanças,
senão que sejam por teus olhos contemplados
e que algum bem te façam contra o mal
que contra ti serpenteia em esquivanças!...
A CHAVE DO MEDO IV
Com meu destino eu já me conformei:
só por meus filhos ainda sinto medo;
pelos sonetos lançados em degredo
certo temor eternamente sentirei...
Quem sabe, um dia, dessa imensa grei,
algum chame a atenção, tranquilo e quedo,
ou pela indiferença com que o cedo
se alguém o musicar, graças darei...
Talvez um dia, qualquer alma pura
que se encaixe em posição de relevância
queira imprimi-los por admiração;
e mesmo assim, o medo me perdura:
quem os leria após final instância,
cerradas capas após sua aquisição...?
SORRISOS MURCHOS I – 11 JUN 16
Quaisquer imagens só revelam o passado:
são fótons projetados e nem a gravidade
capturar os pode, espelhando a realidade,
irradiados do cosmos no pélago gelado.
De tal modo nossa história, no espaço siderado
ser retomada poderia, quiçá em totalidade;
só o que ocorreu ao ar livre, na verdade,
na tecnologia de algum satélite enviado.
Bem que eu queria participar dessa experiência,
réstias de luz vendo ser fotografadas,
os eventos assistir e as tremendas comoções.
Mas é provável que para mim a onisciência
filme apenas as batalhas a pleno ar travadas
ou nos renove o sangue de mil execuções!...
SORRISOS MURCHOS II
Pensando bem, o que é a história humana
ou o que dela nos ensinam as escolas?
Um combate a perseguir do outro as colas,
listas compridas de dinastia soberana...
Bem mais fiel, cada colheita nos irmana;
podem ser festas refletidas para nô-las
mostrar... e as paixões de jovens tolas,
as procissões que a religião proclama...
Mas ao ar livre se perde muito mais:
tomam-se grandes decisões entre paredes,
ali as famílias se reúnem em refeições,
em casa as diversões; ali os amores naturais,
dos julgamentos as intrincadas redes
e até os palcos a entreter as multidões...
SORRISOS MURCHOS III
Só poderíamos ver cortejos funerários,
a abertura das covas para alguém,
pouco importando se o tal riqueza tem,
morrendo avaros igual que perdulários...
Na maioria, também atos solidários
quatro paredes a segredar contêm,
templos cobertos a celebrar também,
tantos banquetes com acepipes vários...
No mundo externo, tão só as sementeiras,
os camponeses marchando para as feiras,
o fim e o início de mil celebrações...
E os viandantes nas estradas alongadas,
a murmurar entre si pequenos nadas
ou os peregrinos em sua busca de ilusões...
SORRISOS MURCHOS IV
Aqui e ali, alguns amantes surpreendidos,
por toda parte a se expandir vegetação,
as brancas neves que no norte estão,
os temporais do sul mais escondidos...
Na maioria, porém, só desvalidos
que não têm teto ou quando expulsos são
por acidentes de intensa vibração,
por invasões ou guerras perseguidos...
Quão raramente um feito de importância
transcorreu alegremente em plena luz,
salvo combates, massacres, pestilências;
e quem pudesse captar essa fragrância
que a tanta morte e tristeza se reduz,
quanto desgosto sentiria em tais cadências!
SORRISOS MURCHOS V
Existem mentes que amariam assistir
ao drama do Calvário, à lenta procissão
da Via-Crúcis até a crucifixão,
o vilipêndio, das chicotadas o incidir!
Bem diferentes talvez de seu ouvir
nas catedrais, na eloquência do sermão,
a requintada e variegada narração
de um sacerdote, no vigor do seu agir!
Mas visto o fato, em sua realidade,
bem diferente do que haviam imaginado,
provavelmente só poderiam emitir
sorrisos murchos, de triste ingenuidade,
despido de esplendor esse passado,
dotado apenas de um mesquinho reluzir!
SORRISOS MURCHOS VI
Sempre é possível assistir no Coliseu,
a céu aberto, mesmo tendo um toldo escasso,
os gladiadores, em seu fatal abraço
e até a batalha naval que ali se deu!...
Ou em Paris todo o mal que ali ocorreu,
sua guilhotina de afiado traço,
ou de mil enforcamentos o compasso...
Bruxas queimadas? Talvez
somente o véu
das chamas e fumaça... Empalamentos
pelos assírios torturando prisioneiros,
em Canas mortos oitenta mil romanos!
Sorrisos murchos mostrarei se tais tormentos
conseguir ver dos passados altaneiros...
Só de pensar, já descartei meus tristes planos!
VRILL
I – 12 JUN 16
NESTA
IMENSA PELÍCULA TERRESTRE
QUE
CONTRA AS NUVENS SE PROJETA, VEJO
OS
MUNDOS PARALELOS DO DESEJO,
A
TERRA INTERNA DE ESPLENDOR AGRESTE.
CONTEMPLO
ESSE PODER DE QUE ELA É MESTRE
NA
MULTIFÁRIA EXPLOSÃO DE CADA ENSEJO,
SANTA
GAIA A IRRADIAR-SE COMO EM BEIJO
TEGUMENTOS
DE SI QUE O CÉU ORQUESTRA!
E
ENTÃO SE EXPANDEM PELO COSMO A FORA;
SE
CAPTADOS DE LONGE, REMEMORAM
O
QUE OCORREU HÁ CEM, DUZENTOS ANOS.
MAS
TAIS ONDULAÇÕES SOFRENDO EMBORA
DE
SUA LENTA EXPANSÃO E SE DESCORAM,
EMURCHECIDAS
NOS PÁRAMOS ARCANOS.
VRILL
II
SEGURAMENTE,
A SOCIEDADE THULE
AFIRMAVA
A EXISTÊNCIA DE ENERGIA
MUITO
ACIMA DAQUELA QUE POSSUÍA
O
PRÓPRIO RAIO QUE SOBRE A TERRA PULE.
QUE
AOS INIMIGOS DO REICH ASSIM SE ANULE
PELO
PODER DO VRILL TODA A VALIA
E
O MUNDO INTEIRO SE CONQUISTARIA,
DESDE
O REI DA INGLATERRA AO POBRE CULE!
TÃO
LOGO O CONSEGUISSEM DOMINAR,
SEM
A MORTE DE MAIS TROPAS PRECISAR:
SERIA
OBTIDO POR MÍSTICOS RITUAIS...
DIZEM
QUE HIMMLER, EM TENEBROSO OFÍCIO,
ACREDITAVA
QUE CADA HUMANO SACRIFÍCIO
PODERES
IR-LHE-IA TRAZER SOBRENATURAIS!
VRILL
III
ASSIM
EM CAMPOS DE EXTERMÍNIO CADA MORTE
PRESERVARIA
A VIDA DE UM SOLDADO:
VRILL
HAVERIA NO SANGUE DERRAMADO,
SENDO
A VIDA TRANSFERIDA DESSA SORTE!
UM
SACRIFÍCIO DE SANGUE DESSE PORTE
CONVOCARIA
A VITÓRIA EM SOM ALADO!...
MAS
ERAM MORTES POR GÁS!... EM RESULTADO
NÃO
BROTARIA NOVA VIDA DESSE CORTE...
DE
QUALQUER MODO, AS MENTES DEFORMADAS
QUE
APRECIARIAM ASSISTIR A TAIS MATANÇAS NÃO PODERIAM ACHAR NELAS QUALQUER GRAÇA
POIS
TAIS IMAGENS, AO SER RECUPERADAS,
DESAPONTO
LHES TRARIAM ÀS ESPERANÇAS,
MOSTRANDO
APENAS AS CINZAS E A FUMAÇA!
VRILL
IV
A
VIDA HUMANA É BEM MENOS IMPORTANTE
PARA
O CONJUNTO DO PLANETA TERRA,
NAS
NUMEROSAS VIDAS QUE ELA ENCERRA
DO
QUE A NOSSA VAIDADE ACHA BASTANTE.
MILHARES
DE ANOS LEVAMOS NÓS AVANTE,
PORÉM
O MAR, CADA DESERTO, CADA SERRA
A
PROGRESSÃO HUMANA UM TANTO EMPERRA
E
AINDA HAVERÁ DE EMPERRÁ-LA DORAVANTE!
MESMO
OS NOSSOS BILHÕES OCUPAM POUCO
DESTE
VASTO PLANETA QUE PISAMOS;
SE
UM DIA FÓTONS DO PASSADO CAPTAMOS
SOFRERÁ
DESILUSÃO TAL SONHO LOUCO:
UM
ATO HUMANO SOMENTE EM MUITOS MIL
SERIA
AVISTADO SOB O VASTO CÉU DE ANIL!
VRILL
v
ENXERGARÍAMOS
MUITO MAIS OS VEGETAIS,
DESDE
O MUSGO ATÉ AS ÁRVORES GIGANTES;
MAIS
RARAMENTE SE VERIAM OS ELEFANTES,
NA
LIMITADA PROGRESSÃO DOS ANIMAIS.
NA
MAIORIA, TAIS IMAGENS NATURAIS
SE
MOSTRARIAM BEM DESINTERESSANTES,
VAZIAS
MONTANHAS, ÁGUAS INCESSANTES,
QUASE
OCULTANDO MUDANÇAS MATERIAIS.
MESMO
UM GEÓLOGO O INTERESSE PERDERIA,
POIS
TÃO SOMENTE O EXTERNO SE VERIA,
ATÉ
AS IMENSAS CATÁSTROFES SÃO LENTAS.
MUITO
MAIS COISAS O COSMO HOJE IRRADIA,
GRANDES
GALÁXIAS PARA O OLHAR ATENTAS,
AINDA
QUE SEJA SÓ O PASSADO QUE SE VIA!...
VRILL
VI
ALI
SE ENCONTRA O VRILL DO MISTICISMO,
TANTO
ÊXTASE A DESPERTAR NOS EXEGETAS, (*)
NESSAS
IMAGENS INTERPRETAÇÕES COMPLETAS
DO
PASSADO E DO FUTURO DO HUMANISMO,
(*)
INTÉRPRETES DE ESCRITOS OU FENÔMENOS.
EMBORA
SEJA TÃO SÓ UM SOLIPSISMO (*)
IMAGINAR
QUE POR RAZÕES SECRETAS
ESSAS
IMAGENS PARA NÓS ASSIM DILETAS
TENHAM
ALGO MAIS QUE SÓ INDIFERENTISMO.
(*)
JULGAR-SE CENTRO DO UNIVERSO.
ESSAS
FIGURAS POR TELESCÓPIO REVELADAS
SERÃO
AS MESMAS DENTRO DE MIL ANOS,
IDÊNTICAS
AO QUE FORAM HÁ MILÊNIOS.
QUAL
A INFLUÊNCIA DAS GALÁXIAS PARADAS
NESSES
SEUS GÉLIDOS PÁRAMOS ARCANOS
SOBRE
UMA VIDA DE TÃO POUCOS DECÊNIOS?