quarta-feira, 13 de setembro de 2023





 

 

CARPE DIEM I   (2008) (*)

(Aproveita o dia [a vida])

(Pola Negri, a eterna namorada de Rodolpho Valentino)

 

eia, amigo! recusa-te a dormir!

já dormes pouco, passa a dormir agora

ainda menos, aproveita a hora,

que é transitória e esvoa-se a sorrir...

 

pois nada podes fazer para o impedir

e mais cedo ou mais tarde vais embora,

teu nome emaranhado em teu outrora,

teus trabalhos para outro usufruir.

 

por isso, esquece o sono. quando a morte

vier para buscar-te, dormirás

o sono longo de que não se desperta.

 

agora, vive! e nem sequer chores a sorte:

és ferramenta e, assim, trabalharás,

enquanto a mente permanecer alerta.


CARPE DIEM II  (3/2/2009)

 

não faças como os outros: desperdiçam

um terço de suas vidas com o sono

e os dois terços que restam, no abandono,

com que o malbaratam e o amortiçam

 

e, quando eu falo, as sobrancelhas içam:

não podem crer que quase não ressono,

nem que das horas de minha vida seja o dono.

se lhes sugiro o mesmo, mais se eriçam...

 

assim os vejo, em conversa e bebedeiras,

fingindo divertir-se; ou, no trabalho,

cumprindo tão somente - e mal - o horário.

 

se ainda tivessem coisas mais ordeiras!

mas esse tempo, em que fogem ao malho,

gastam em vão, em breve gozo perdulário.

 

CARPE DIEM III

 

muitos anos atrás, cigana disse

que eu chegaria até os noventa e três.

talvez quisesse agradar o seu freguês,

quiçá a quiromante me bendisse...

 

tenho certeza de que não me maldisse,

pois não pensei gastar mês após mês

em vão, porque o tempo que me fez

pensar dispor não joguei fora em tolice.

 

ah, como trabalhei nesta minha vida!

quando eu falo, até me olham de soslaio

(porque, de fato, sem ver, quem me acredita?)

 

aos interesses dos outros dei guarida

e ainda a concedo... nessa armadilha caio

de dar ajuda a quem me chegue aflita!

 

CARPE DIEM IV – 8 set 23

 

minhas pálpebras se enrugam ao abrir-se

e não quando se fecham para a luz;

também assim a vida nos induz:

ela se enruga quando quer despir-se.

 

perante nossa vista, ao incluir-se,

definitivamente, aos olhos nus,

é apenas falsamente que reluz,

quando uma bênção parece refletir-se.

 

é por isso que recebo, prontamente,

sem mais delongas, essas boas notícias,

que logo voam e que desaparecem,

 

porque nunca recebi bem permanente,

e é mais seguro acreditar nas más notícias,

porque são estas que sempre permanecem.

 

CARPE DIEM V

 

se alguma coisa eu aprendi na vida,

é que não se pratica boa ação,

sem um castigo, pois toda a doação,

cedo ou mais tarde, será bem punida.

 

é como se curar qualquer ferida

ofendesse aos poderes que nos dão

um bom destino ou amarga relação,

que deva na existência ser cumprida.

 

assim, quando no mal interferimos,

para nós se transfere tal castigo,

enquanto o alheio fica mitigado...

 

destarte, a nós mesmos nos ferimos,

quando ajudamos a qualquer amigo,

tendo o interesse próprio maltratado.

 

CARPE DIEM VI

 

será então porque já ajudei tantos

que as parcas me contemplam com desprezo?

subitamente, é como um véu de prantos

sobre mim fosse lançado, em todo o peso,

 

que a mágoa despertar nos deuses possa,

(porque é certo que algum grau de proteção

ainda possuo.  e a maldade que me roça

não causa danos senão à nutrição.)

 

foi qual se, de repente, houvesse seca

e as fontes de que então me abastecia

para meus cântaros, parassem de jorrar.

 

tal como se ajudar aos outros peca-

do fosse e tais atos, dia a dia,

as três parcas decidissem castigar...

 

CARPE DIEM VII – 9 set 23

 

não sei se há parcas, mas existe certa gente

que com o mal quer retribuir o bem;

ressentimento talvez possa também

cultivar quando o bem lhes for assente.

 

disse jesus, há milênios nesse além,

que mais bem-aventurado é dar, mas descontente

ficará quem recebe, a recíproca na mente:

bem menos bem-aventurado é receber; porém

 

tudo depende do que tem no coração,

há um canteiro de gratidão, outro de inveja,

qual dos dois tem maior fertilidade.

 

e a quem nos pede, ao receber a doação,

humilhação no próprio peito enseja,

se não espera retribuir um dia igual bondade!

 

CARPE DIEM VIII

 

dizem, sem dúvida, que digno é se aproveitar

parte do dia ou parte de teus bens

a tua amizade, o tempo que ainda tens,

não importa com quem vem te suplicar,

 

mas quando a outrem dividir tu vens,

toma cuidado e evita de o humilhar,

sua dignidade contribui em conservar,

bem mais valiosa que a própria que retens!

 

melhor de fato será conselho e orientação

que qualquer coisa que pareça ser esmola

ou então lhe diz que um dia dele podes precisar,

 

nas tantas voltas a que o destino dá ocasião,

que a roda da fortuna sempre rola,

que no futuro sempre podes lhe apelar!

 

CARPE DIEM IX

 

pensa e sopesa o valor de cada hora,

que ditado antigo diz: “tempo é dinheiro”,

porque de nós o tempo escorre bem ligeiro:

constantemente o tempo vai-se embora

 

e algum dinheiro se recobra sem demora,

mas o minuto te abandona bem lampeiro;

quer aproveites ou desperdices esse argueiro,

rápido corre para unir-se ao teu outrora!

 

ah, se pudesses o tempo conservar,

armazenado no cofre ou na despensa!

mas não se o pode em um bolso armazenar,

 

mais bem-aventurado o tempo a te esquecer

do que tu mesmo, nessa ansiedade tensa

de algum presente de tempo receber!

 

CARPE DIEM X – 10 set 2023

 

pobres romanos!  seu tempo já passou

e nem sequer suas cinzas conservaram;

por mais que tal conselho nos deixaram,

o espaço de seus dias o tempo devorou!

 

algum poeta bem melhor o aproveitou,

alguns filósofos escritos te legaram,

os seus juristas velhas leis comunicaram,

por dois mil anos tal herança se guardou!

 

o próprio montesquieu inspirou-se nos romanos,

em sua famosa descrição dos três poderes,

que no passado longínquo praticaram.

 

pois quando fores descansar, faze teus planos,

teus dias mais preciosos que os haveres,

que infiéis com constância te deixaram!

 

CARPE DIEM XI

 

breve demais, sei que me deixará

todo o meu tempo por mim indiferente,

mas sempre olhei direto para a frente,

qual a surpreza que o hoje te abrirá?

 

do amanhã, qual a certeza que ainda há?

tão nebuloso como o passado esvanescente,

porque o hoje, com sua fuga permanente,

não nos pertence de fato, é deus que o dá,

 

sem que o encontremos no temporal presente.

e se o espaço fugisse de igual modo,

nesse contínuo que mencionam os cientistas

 

e assim sentisses o tempo permanente

e qualquer bem material tão só engodo,

nem de ti mesmo guardando quaisquer pistas?

 

CARPE DIEM XII

 

caso algum dia caminhaste numa esteira,

por exercício ou esforçado cardiograma,

terás noção desse espaço que reclama

desse teu tempo qualquer hora mais ligeira.

 

seria tão bom que cada hora companheira

fosse mantida, enquanto do espaço a rama

corresse para trás, guardando a gama

dos centímetros em sua corrida derradeira

 

e somente quando a esteira assim parasse

voltasse o tempo novamente a se escoar...

mas ai! que ambos correm de mãos dadas!

 

a hora aproveita, então, qual se contasse

quando esse espaço perceberes terminar,

sem que outras horas para ti fossem guardadas!

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