sábado, 11 de maio de 2019




VISÃO DE MIM – 27/8-5/9/2018
Novas Séries de WILLIAM LAGOS



VISÃO DE MIM (VIII) – 27 AGO 2018
ORVALHO (III) – 28 AGO 2018
ASCENSÃO (V) – 29 AGO 2018
O RIO INVERSO (IV) – 30 AGO 2018
ABRINDO ESPAÇOS (IV) – 31 AGO 2018
CUI BONUM QUID PRODEST? (VII) – 1º SET 2018
GESTOS MINÚSCULOS (IV) – 2 SET 2018
EM PRECE CARMESIM (IV) – 3 SET 2018
EM PRECE PARA MIM (III) – 4 SET 2018
EM PRECE PARA TI (IV) – 5 SET 2018

VISÃO DE MIM I – 27/8/2018

Que coisa estranha!  Não faz nada que afirmei
quão raramente a mim nos sonhos via,
quando talvez, numa pontinha de ironia,
a mim mesmo ontem em sonho contemplei!

Como em tela de cinema divisei
a quem beijar bela mulher queria,
leve erotismo em que se cumpria
essa visão de mim que ontem neguei!

Mas foi de lado, visão em duplo plano,
como se a mim representasse, igual que ator
e só de lado essa boca então beijei,
porém cartaz não era, sem engano,
em movimento houve um beijo de sexor:
lábios abertos contra os meus provei!

VISÃO DE MIM II

Será que de algum modo pude envergonhar
esse duende por Morfeu encarregado
de administrar o arquivo dedicado
a tantos temas que eu deveria sonhar?

E como não costumava me mostrar,
fez um esforço meio que apressado
e conseguiu apresentar-me assim de lado,
como resposta com que me intimidar?

Pobre duende, que é tão dedicado!
Nunca eu iria denunciá-lo ao Pai Morfeu!
Há quantas décadas não me envia pesadelos?
“Querido meu, eu só havia observado,
sem reclamar da obra que empreendeu
e que sempre executou com tantos zelos!”

VISÃO DE MIM III

Será que de mim mesmo reclamei
que me indicasse uma visão de mim?
Não de uniforme, nem usando borzeguim,
só para ver como me conservei

em meu subconsciente, se mudei
ou permaneço igual ao que era assim?
Foi uma imagem adulta no confim
de um cartaz de cinema que mostrei!

Foi uma imagem de um certo desaponto,
pois a carreira de ator eu não segui,
principalmente a meus alunos dirigi,
mas em nenhum papel nelas desponto:
já morreu há muitos anos esse ator,
enterrado sem pompas nem rigor...

VISÃO DE MIM IV

Será que eu mesmo, de fato, me mostrei,
para meu eu acordado em ironia?
Se ali beijei essa mulher que via,
em minha vida real nunca a encontrei...

Existe algo com que sempre me intriguei:
até que ponto meu sonhar é fantasia,
até que ponto alternativa via
na qual em outro de mim me transformei?

Já demais vezes descrevi meus sonhos,
com uma lógica perfeita a desenhar,
outros lugares de novo a visitar,
a contemplar iguais rostos risonhos,
que reconheço, mas não vejo por aqui...
Descrevo o mundo de um passado que vivi?

VISÃO DE MIM V

Veja-se bem: não sonho em ser um rei,
nem um herói revestido de armadura,
não sou um ancião de sabedoria pura
nem um profeta do que jamais verei.

Eu sou o mesmo ali – e me satisfarei
em percorrer com a mesma investidura
planícies plácidas, mas cheias de ventura
e monstro algum ali combaterei.

Porém visito igual algumas bibliotecas
(e algumas vezes, lojas filatélicas!),
sempre viajo de ônibus ou de trem,
encontro damas comedidas ou sapecas,
que a meu redor se mostram perihélicas,
sem agressores que a reclamá-las vêm!...

VISÃO DE MIM VI

Dizem alguns que os sonhos realizam
os objetos de atuais preocupações:
a isso que temes não dês mais atenções,
pois já ocorreu nesses sonhos que deslizam!

Mas eu não vejo tais coisas que me bisam
meus sentimentos magoados de paixões.
Serão de fato só uma teia de ilusões
Rotas concretas que meus passos pisam?

Algumas vezes o que ali me aconteceu
é o repetir de qualquer sonho anterior,
mas com detalhes bem mais complicados,
mas sou eu sempre quem tudo percorreu,
em movimento por um círculo exterior,
sem que por mim sejam meus traços avistados.

VISÃO DE MIM VII

De fato, em tal mundo eu sou ator,
no sentido de que ajo permanente,
não sou passivo nesse outro ambiente,
as circunstâncias volto a meu favor.

Se por acaso algo me vem contra o pendor,
sei que é meu sonho e decido firmemente
que assuma direção que me contente:
como um roteiro do qual seja o diretor.

Talvez seja a mensagem desse sonho,
em que me vi num cartaz em movimento,
eu sou ator, mas tão leve como o vento
e em tudo nele minha atuação eu ponho,
mas é como se um filme dirigisse,
sem que meu próprio rosto distinguisse...

VISÃO DE MIM VIII

Não me convém mudar essa atitude:
se por acaso Morfeu ou seu duende
ordem de outro que não eu atende,
é bem possível que sofra um choque rude!

Que tal cenário num outro se demude,
em que a inimigos meu avatar contende
ou que a imagem minha que se prende
seja trocada pela igual que não me ilude

que o tempo passa e nele passo igual
e que esse mundo de tempo diferente
comece a obedecer este daqui,
não mais que cópia deste mundo atual,
que a meus próprios desejos não atente,
por mais que insista nos finais que preferi!

ORVALHO I – 28 AGO 18

Minha alma inteira te projeto como um lírio,
para adejar sobre tua alma em tempestade,
serei sombra em teus lábios de vaidade,
serei sumo em teus olhos de delírio,
serei sangue em teu sonho de martírio,
serei plasma em tua promíscua castidade,
serei faro em tua breve olfatidade,
serei cera sebre tuas lágrimas de círio,
destarte um bálsamo para teus sentidos,
em meu breve drapejar sobre tua alma,
despetalado frente a ti em plena calma,
um elixir sobre teus membros feridos,
tua larga soma de angústias a roubar
até o suspiro de teu incauto despertar!

ORVALHO II

Que nesse amplo projetar me faço em nada,
meu corpo abandonado sobre o leito,
meu coração silencioso no meu peito,
pois só bate a teu redor na madrugada;
em cada lágrima serei pétala dourada,
sobre as dobras de tua face então me azeito,
sobre as dobras de teu corpo então me deito,
orvalho puro em tua noite amargurada,
em teus ouvidos eu choverei canção,
igual àquelas que escutaste no teu berço,
eu teu louvor desfiarei meu terço,
serei a música de tua circulação,
simples refrão para cada melodia,
como lâmina a cortar tua dor mais fria.

ORVALHO III

Não obstante, não me escutarás,
talvez percebas tão somente algum zumbido
e me confundas com inseto presumido:
teu doce sangue nesse instante negarás;
na escuridão meu vulto não verás,
talvez percebas algum clarão perdido,
como um raio na distância perseguido
mas nem sequer a esclerótica abrirás; (*)
mas pouco importa, se te der algum consolo,
a desfatiar de teu peito essa agonia
da solidão que te deixou vazia,
só por instante a respirar teu colo,
ali deixando tanta coisa que te dei
e em grande vácuo para mim retornarei. 
(*) O branco do olho.

ASCENSÃO  I – 29 AGO 18

Nunca pensei em praticar o alpinismo,
mas sempre desejei subir montanhas;
não sejam estas contraditórias artimanhas:
bem mais seguro será fazer só montanhismo,
mas no meu pampa bem oposto é tal modismo:
é uma planície com bem poucas manhas,
só à beira dos rios algumas canhas,
sem grande chance de se encontrar abismo;
assim somente pude o Cerro de Bagé
subir um dias com três companheiros,
já falecidos, que me não podem desmentir;
porém subimos a estradinha a pé,
antiga senda de muitos caminheiros,
sem nem o fôlego dos pulmões fugir!

ASCENSÃO II

Na verdade,  na Sexta-Feira Santa,
era um costume ir até lá, frequente,
para colher a macela florescente,
que a data ínclita de poder imanta;
e muita gente ali subindo canta,
crianças com os velhos, lentamente,
que os adultos só hoje o fazem raramente,
subindo os velhos com nós na garganta,
mas procuram conservar a tradição,
enquanto os jovens e os de meia-idade
pouca importância atribuem a tal costume
ou, quando muito, irão subir de condução,
sem da escalada sentir necessidade,
por menos íngreme que se apresente o cume.

ASCENSÃO III

Naturalmente,  não ficam na estradinha,
pulam arames, sendo o maior perigo
rasgar a blusa para expor o umbigo,
nessa invasão que dos campos se avizinha,
porque a macela cresce pequeninha,
mas longe sopra seu perfume amigo
e então as flores vêm furtar de seu abrigo,
para a bênção pascoal em que se alinha
uma fila de gente que acredita
que essa flor só se faz medicinal
depois de ser abençoada em alguma igreja,
igual que em Ramos quem sofre é o palmeiral,
quando nas testas a cinza então palpita,
nesta mesma Sexta-feira que se enseja!

ASCENSÃO IV

Para nós quatro foi só um divertimento
e nem ao menos subimos na Quaresma;
caíra a cruz que espantava o abantesma,
cinza a madeira pelo tempo, em passamento
das intempéries e, no impulso de um momento,
em destemor do toque de uma lesma,
tentei quebrar uma lasca dela mesma,
para guardar como lembrança desse evento,
sem conseguir com minha mão quebrar,
porém meu velho amigo, o bom José,
que tantas vezes solava no coral,
melhor que os brancos os negros a cantar,
quebrou-me a lasca com golpe de seu pé
e ma entregou com um sorriso natural!

ASCENSÃO V

Eu a guardei durante muitos anos,
mesmo depois de falecer o meu amigo;
era a lembrança que trazia comigo
dessa ascensão a tais altos profanos;
mas no retorno, quando na praça estamos,
uma cigana com cabelos cor de trigo,
a contrariar um estereótipo tão antigo,
quis ler as nossas mãos e até aceitamos;
não sei o que falou aos outros três,
eu “viveria até os Noventa-e-três,
teria seis filhos e dois casamentos”;
de fato, os filhos tive e assim casei
por duas vezes... mas apenas sei
que nao morri até os atuais momentos!

O RIO INVERSO I – 30 AGO 2018

Costumam rios correr desde a nascente,
perenemente, no sentido da vazante
e se represa não lhes estiver adiante,
até a foz ou estuário vão em frente,
salvo que algum se torne em afluente
de outro rio que suas águas leve avante
ou se outro encontrar de igual montante,
cada um dos dois a tornar-se confluente.

Seguem sempre para baixo a gravidade,
na demanda derradeira pelo mar,
mesmo se um dique os vier atrapalhar.

A água é persistente de verdade
e se escapa por cima ou por um lado,
até ao curso antigo ter voltado.

O RIO INVERSO II

Mencionam muitos que igual é o rio do tempo,
para a frente, eternamente, a disparar,
para os humanos com ele a carregar,
por breve ou longo que seja seu destempo,
mas nessa trova eu vejo um contratempo,
não leva a todos para o mesmo mar,
um segue adiante, o outro vai parar,
nem todos ganham seu igual portempo.

Mas não é o rio que vai para o futuro,
somos nós que o porvir vamos buscar,
sempre subindo para o tempo perdurar,

por mais que o antemão seja obscuro,
não nos queremos nos minutos afogar,
sobrenadando a um presente tão impuro.

O RIO INVERSO III

Na realidade, o futuro é um delta extenso,
separado em milhares de canais
e nunca podes saber aonde vais,
salvo se escolhes, com cuidado intenso,
encruzilhadas em pântano tão denso,
que te pareçam melhores que as demais,
porém escolhas são, de fato, emocionais,
teu livre-arbítrio é muito mais pretenso.

Pois logo surge uma nova divisória,
em que terás, novamente, de escolher
qual seja a senda de tua preferência.

E nem serás senhor da própria história,
quando ainda à frente há tanta divergência,
sem nunca a escolha final te pertencer.

O RIO INVERSO IV

Contudo inverso ao do tempo é o rio da vida,
que percorre para trás o teu passado,
para baixo de ti sendo juntado
cada minuto incessante da corrida,
que certamente te leva de vencida,
rumo inverso do que havias esperado,
jamais escolhes o tempo superdo,
que assim te puxa com energia incontida.

Não obstante, é tua única certeza,
mais clara ainda que te seja a morte,
pois o que foste, à nascente é retornado,

o rio da vida tem jusante empresa,
que desde o início acumulou tua sorte
e diariamente te renova o seu chamado!

ABRINDO ESPAÇOS I – 31 AGO 18

Bem certo é que o ser humano é aventureiro,
sempre na busca de uma nova pauta,
por isto há tanto que hoje quer ser astronauta,
na exploração de um universo sobranceiro.

Se conquistamos este mundo por inteiro,
foi através da exploração incauta,
a recompensa para os demais foi lauta,
mesmo perdendo a vida o vanguardeiro.

Por longo tempo se fez a afirmação
que era o homem que deveria procurar,
e a mulher ficar à espera no seu lar,
até que o par alcançasse aceitação;
será que um dia isso de fato funcionou
e quando a iniciativa ela tomou?

ABRINDO ESPAÇOS II

Sem dúvida, para maior exploração,
foram os homens as naus a tripular
e nos oceanos seus ossos a deixar,
ficando a esposa em sua nova gestação.

Existe nisso uma lógica razão,
é a mulher que vai a raça projetar;
muitos dos homens se podem dispensar,
já nas batalhas a morrer em profusão.

Nos velhos tempos da poligamia,
se um morresse, pouca falta causaria,
sempre outro homem poderia fecundar;
e em nossos tempos de monogamia,
só uma triste solução se encontraria:
nos conventos as solteiras a encerrar!

ABRINDO ESPAÇOS III

As coisas hoje se tornaram diferentes;
é a vida das cidades protetora,
não precisa ser a mulher só a criadora,
enquanto os homens morrem nessas frentes.

Desigualdades mesmo sendo ainda aparentes,
a mulher cada vez mais protestadora,
mesmo que estupros ainda ocorram como outrora,
as defesas se acumulam permanentes.

E como existem creches, é possível
deixar os filhos e sair a trabalhar,
sempre o espaço da mulher a se ampliar,
oportunidade cada mais mais perceptível,
salvo se as guerras também as venham dizimar,
sendo as restantes necessárias para o lar.

ABRINDO ESPAÇOS IV

Hoje os espaços poderão, literalmente,
ser abertos muito mais pela mulher,
cujo corpo mais compacto requer,
menor equipamento, certamente;

talvez se tornem as astronautas, realmente,
que abrir o espaço venha a ser o seu mister,
por mais que opostamente o homem quer
ser quem desbrava as fronteiras permanente.

E uma colônia de umas vinte mulheres,
com um os dois homens à sua frente,
poderá alcançar uma rápida expansão,
mas se vinte homens ali forem colocados,
por só uma ou duas mulheres amparados,
dificilmente se evitará a sua extinção!

CUI BONUM QUID PRODEST? I – 1º SET 18
(Para  quem convém, para que serve?)

O próprio nome de pedofilia
indica um ato de cunho homossexual,
por um menino o pender inatural,
que muitas vezes no passado até ocorria;
em muitos casos gente mesmo criaria
tais infelizes para um fim sensual,
alguns castrados de modo natural
numa cultura que o não condenaria!
Ou simplesmente para as vozes conservar,
finas e puras para o coro de uma igreja,
seus corpos puros em louvor a Deus,
que se o quisesse, os podia assim criar,
desde seu berço, de modo que se enseja
belo argumento para os bons ateus!

CUI BONUM QUID PRODEST? II

Não é de admirar que o celibato
conduza qualquer padre à tentação,
que esses meninos tão bonitos são,
quando o pecado é amar mulher, de fato!
E muito jovem que sofreu tal desacato
cedo ou tarde buscará repetição,
como uma espécie de retribuição
por ter passado pelo imoral contato.
É compreensível, mas não se justifica,
não é o amor que tece essa cadeia,
mais um ódio pela sua iniciação,
uma fileira de mal que se pratica,
esse veneno que em si mesmo se pranteia,
mas se transmite por retaliação!

CUI BONUM QUID PRODEST? III

Só que hoje querem ampliar o alcance
para abranger amor heterossexual
e por trás disso existe algo de imoral,
muito pior que a acusação que lance!
O monstruoso existe em tantos natural
que de criar novos crimes não se cansem
e relações amorosas imbalancem,
por não poderem usufruir de amor igual.
Durante séculos se aceitou perfeitamente
o casamento de jovem adolescente
e muitas culturas ainda lhe dão aprovação,
mas se procura agora, de repente,
por mais precoces as experiências que hoje são,
tornar em crime uma coisa tão frequente!

CUI BONUM QUID PRODEST? IV

Naturalmente, um estupro é criminoso,
mas ainda há pouco, para a “defloração”,
que era um crime, haveria aceitação,
se contraído um matrimônio prestimoso;
caso a menina engravidasse, era ditoso
constituir a sua família na ocasião
e noutras vezes, havia plena aceitação
de adolescente virgem ter esposo.
Talvez protestem que isso era antigamente,
quando viviam muito menos as pessoas,
tais ligações serem tidas como boas,
para a nova geração levar à frente,
sendo raro se alcançar quarenta anos,
quando tão cedo faleciam os humanos!

CUI BONUM QUID PRODEST? V

Mas como hoje se vive em média muito mais,
é necessário se adiar a gestação,
manter constante nossa população,
sendo inibidos os processos naturais?
E embora o sexo se pratique por demais,
cada vez mais prematura a iniciação,
se a adolescente experimentar excitação
por homem mais velho, há protestos colossais!
Mas e por que?  Se o adulto é experiente
e melhor pode sustentá-la, geralmente,
também tratá-la com bem menos egoísmo
do que um rapaz da sua mesma idade,
que buscará mais sua própria saciedade,
sem a menor intenção de um altruísmo?

CUI BONUM QUID PRODEST? VI

E quantas vezes quem toma a iniciativa
é a adolescente, um adulto a seduzir,
não é possível cada caso se incluir,
pedofilia sendo assim tão incisiva!
Quando a insistência no sexo incentiva,
na telinha tantas novelas a assistir...
Mas se condena uma mulher se imiscuir
em provocar adolescente ainda passiva?
Em tudo isso vejo só ardilosidade
e não real condenação de algum pecado,
para que o campo permaneça mais aberto,
 hoje sendo até um galanteio condenado!
Quem é o regente desse tal concerto,
voltado contra a heterossexualidade?

CUI BONUM QUID PRODEST? VII

E assim encaro com muita desconfiança,
se a tanto sexo se concede liberdade,
dando-se apoio à homossexualidade,
quem se aproveita dessa atual bonança?
Que verdadeira liberdade mais se alcança,
se existe um código de inequalidade,
ou ao menos assim o aplica a sociedade?
Bem raro é o homem que a acusação avança
contra a proposta de algum homossexual;
rara a menina ou adolescente que, afinal,
contra uma lésbica apresenta acusação!
Sendo o protesto politicamente condenado,
se apenas o hétero vem sendo limitado,
sou eu apenas que desconfio da razão?

GESTOS MINUSCULOS I – 2 SET 18

NÃO SOU O HERÓI QUE VAI GALGAR TUA TORRE
QUE TU MESMA, PEDRA A PEDRA, CONSTRUÍSTE,
NEM UM BEIJO TE DAREI QUANDO DORMISTE,
EM QUE TEU SUMO QUAL MAÇÃ ESCORRE
E TE ENVENENA EM SONO QUE NAO MORRE,
POIS NENHUM DESTES DOTES ME PEDISTE,
É MAIS TUA SOLIDÃO QUE SEMPRE INSISTE
NUM FRACASSO E DESAPONTO QUE TE ACORRE.

NA VERDADE, MUITO BUSCASTE ME AFASTAR,
SENDO TUA SÚPLICA APENAS DESENHADA
POR SOB OS CÍLIOS, APENAS PRESSENTIDA,
TEU DESESPERO ESFARRAPANDO DEVAGAR,
A TUA ÂNSIA SÓ DE LEVE REVELADA
POR BREVE APERTO DE TUA MAO DESILUDIDA.

GESTOS MINÚSCULOS II

SE BEM DE FATO NADA ME PEDISTE,
TEMENDO O QUANTO ME FARIAS SOFRER,
CADA MOMENTO DE EXPULSÃO A ESCONDER
O TEU DESDÉM POR QUEM DE TI DESISTE,
ESSA PARTE DE TI QUE SEMPRE INSISTE
QUE POR MAIS QUE TE NEGASSES ME PRENDER,
QUE TE JURASSE EM SILÊNCIO DESFAZER,
QUALQUER RECUSA QUE NOS LÁBIOS TEUS SE AVISTE.

NÃO ME PEDISTE NADA DE DEFINITIVO,
NENHUM GESTO DE HEROÍSMO AVENTUREIRO,
FICASSE APENAS QUIETO DO TEU LADO,
SUPORTANDO TEU DESCASO MAIS ATIVO,
ESSE TEU FALSO DESPREZO SOBRANCEIRO,
VEZ APÓS VEZ EM QUE ME HAVIAS EXPULSADO.

GESTOS MINÚSCULOS III

O QUE QUERIAS ERA MAIS SER DESMENTIDA
A CADA VEZ QUE AMAR-ME RECUSAVAS.
DE CADA VEZ QUE O SENTIMENTO ME NEGAVAS,
DE QUE ERA FALSO TEU NEGAR SER CONVENCIDA,
SOMENTE AOS POUCOS CONFESSANDO A DESVALIDA
INSEGURANÇA COM QUE NALMA TE CASAVAS,
O IMPOSSÍVEL COM QUE TE DIVORCIAVAS
DO MALQUERER DE TUA ALMA MALFERIDA.

E FOI ASSIM QUE DEVOREI A TUA TRISTEZA,
A INQUIETAÇÃO IMATURA, TUA IMPACIÊNCIA,
OS TEUS PERÍODOS DE TOTAL DESATENÇÃO,
SEM INSISTIR QUE SÓ QUISESSE TUA BELEZA,
MÍNIMOS GESTOS DE PEQUENA CONTINÊNCIA
FENDENDO A MÁGOA DE TEU CORAÇÃO.

GESTOS MINUSCULOS IV

MAS NÃO POSSO NEGAR QUE ME AVISASTE,
PELA LONGA PERSISTÊNCIA DO PROCESSO,
SE NA INSISTÊNCIA DO AMOR EU NUNCA CESSO
DE RETORNAR A CADA VEZ QUE ME AFASTASTE
E UM JURAMENTO ENFIM ME RECLAMASTE:
QUE POR MAIS QUE ME AFASTASSES, NUM POSSESSO
RASGO DE ÓDIO, SEMPRE HOUVESSE MEU REGRESSO,
FICAR PERTO DE TI SEM QUE EM MIM GASTE

A QUANTIDADE DE GESTOS SILENCIOSOS
E ASSIM POR MEU PENAR FUI CONDENADO,
MAIS UMA VEZ, EM MINÚSCULO GESTUAR,
A QUEBRANTAR TEUS SILÊNCIOS PORTENTOSOS,
NESTE MEU SONHO DE AMOR ESCALAVRADO,
MAS QUE ATÉ HOJE CONSEGUE PERDURAR.

EM PRECE CARMESIM I – 3 SET 2018

Vejo no céu a Lua Avermelhada
e lhe suplico para ter pena de mim,
que meu amor seja forte como brim,

fazenda forte que se fez tão espalhada,
e que hoje em dia se compre já rasgada...
Nem sei por que motivo foi assim,
que protegia do espinho e do capim
e nessa moda se tornou descompensada.

Que seja então a imagem contrariada:
que meu amor seja forte como o espinho
que conseguiu dilacerar essa fazenda,
quiçá mesmo por ação deliberada,
em masoquismo tomado por carinho,
abrindo dentro em minha testa escura fenda.

EM PRECE CARMESIM II

Dizem que a Lua favorece mais os zelos,
a se expandir de um coração enamorado,
isto se aplica bem melhor a enciumado.

Também dizem que provoca pesadelos,
nos quais a adquirir os tons mais belos
dessa púrpura senil dos mal-amados,
sem os proteger, lança dardos afiados
sem que alma ou coração possam contê-los!

Assim eu rogo a tal círculo encarnado
que não me traga quaisquer sonhos maus,
que não me dê razões para ciúme,
mas ao contrário, mande o fulgor prateado
para colar os rasgões deste meu caos,
açulado pelo rubro do azedume!...

EM PRECE CARMESIM III

Talvez me atenda mais a Lua Azulada,
pareça embora ser distante e fria,
que esse calor que da vermelha me luzia.

Talvez me iluda a Lua Amarelada,
cada raio numa gota amanteigada
a deslizar na ferida que lá havia,
a costurar com torçal de nostalgia
cada lástima triste e atribulada.

Nunca Selene foi minha estrela-guia
em veracidade, na multidão galática,
nem sei se estrela para mim sobrou;
talvez os astros me irradiem zombaria,
sua posição indiferente e estática
que condimento de amor nunca enviou.

EM PRECE CARMESIM IV

Por que motivo afinal, mutável Lua
qualquer consolo sopraria em minha tristeza?
Raios de estrela não se põem à mesa...

Raios de luar são como espada nua,
a Lua apenas outro fulgor na rua,
mulher perdida a deslumbrar beleza,
mulher promíscua de falsa gentileza,
fino estilete que nos fere como pua.

Assim suplico à Lua Avermelhada
e lanço acenos à Lua Amarelada,
que se não quer meu bem, não faça nada;
e a prece volto para a Lua Prateada,
meio difusa em véu de Lua Azulada,
que meu amor não perfure de enciumada!

em prece para mim I – 4 SET 2018

o que eu penso é que, às vezes, na alvorada,
sem nem pensar em ti, vem à memória
aquela sensação de argúcia inglória,
reconhecendo só em ti o que eu queria.

isso depois de uma extensa madrugada
ter mantido em vigília, pois sabia
necessitar de cem horas, à porfia,
no lapidar da ganga e dessa escória

de mim retirar diamante novo,
seja na forma escorreita de poema,
seja em maciço ardor de tradução;

e nem lembro de ti, somente provo
o sabor reticente de minha pena
ao descrever teus olhos sem paixão.

em prece para mim II

o que eu penso é que o fado não se importa
com a minha sorte ou o bem do meu futuro;
só em mim mesmo há o palpitar impuro
com que contemplo a mágoa que se entorta,

a gravitar na atração que se comporta
de modo tal a desviá-lo para o escuro,
nessa órbita divergente do obscuro
latejar de minha alma qual retorta

em que misturam-se tantos elementos,
nessa química e variegada reação,
novas moléculas a criar inesperados,

perante os olhos cegos ou atentos,
de tal modo que nem sei qual emoção
irá aflorar de meus sonhos contrariados.

em prece para mim III

eu olho o céu, a contemplar constelação,
grupos de estrelas a formar teia de aranha,
que essa tela do céu toda emaranha
e a contragosto me oferece inspiração

e então olho para mim, sem desrazão
e percebo neste sangue que me banha
o sangue teu em tão furiosa sanha
que me remói a pouco e pouco o coração.

e que mais posso fazer, senão lançar
os olhos para mim e a mim mesmo suplicar
que nao destrua o que sobrou de mim

e que ainda possa contemplar na madrugada
a luz difusa de incerteza da alvorada
que em mim conserve a tua lembrança assim.

Em Prece Para Ti 1 – 5 set 2018

Ultimamente eu emprego só papel
Na redação de mil e um sonetos,
Ao invés de cartões por objetos
Do meu roçar das veias sem quartel,
Cortando a saga de meus desafetos,
Qual suspiro de abelha empós o mel
Que lhe roubaram; ou a emoção novel
De meus rasgos de amor sempre incompletos;
Pois  já escrevi demais, dia após dia,
Nessa massa de dores e desejos,
Que meu sangue esguichou ao mundo inteiro;
Mas já tentei parar, como fazia
E não consigo, no respirar dos beijos
Que me fariam redigir o derradeiro.

Em Prece Para Ti 2

Assim não sei se peço o teu amplexo,
Ou inversamento suplico teu desprezo,
Por conservar esse dom que tanto prezo,
Despedaçado em amoroso nexo
Ou se desejo a delícia de teu sexo.
E nessa pia batismal constante rezo,
Enquanto a inspiração me foge e leso,
Só de leve encarar posso o seu reflexo,
Que é tão mais fácil escrever de amor sofrido
Que descrever um bem assim gozado,
Se é possível magnificar o turbilhão,
Em que me jorro em ti, todo perdido,
No sacramento do amor crucificado,
No cravo único e concreto da paixão.

Em Prece Para Ti 3

Talvez prefira a ausência desses beijos
Que me faz redigir constantemente
A descrição desse moinho opalescente
Que faz flutuar minha poeira de desejos,
Transformados em palavras como adejos,
Transmutados num som que não se sente,
Transportados em cor que não se assente,
Santelmo feito arco-íris em tais ensejos;
Talvez se fossem os ósculos constantes,
Me desgastasse nessa angústia bela
De cada orgasmo qual luzir de vela,
A requeimar-me por dentro em tais instantes
Em que explodiria em ti feito uma estrela,
Sem nada mais que me sobrasse de exultante.

Em Prece Para Ti 4

Em mim reside essa ânsia atribulada,
Perversidade de auto-destruição,
De mais sofrer para gozar inspiração,
Na plena saga da busca malfadada!
E assim te encaro com certeza desconfiada:
Até que ponto beberás meu coração,
De cada vez que atenderes minha paixão,
Até veres a hemorragia já estancada?
Pois quando em versos me derramo, algo é perdido,
Destinado para a fome universal,
Mas se em ti eu me consumo, volta o ardor,
Para novo ato de amor mil repetido
E assim o ganho dos outros é meu mal,
Porém recebo em transfusão o teu amor.

William Lagos
Tradutor e Poeta – lhwltg@alternet.com.br
Blog:
www.wltradutorepoeta.blogspot.com
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