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LIBERDADE
I
Contemplo como
voam os albatrozes,
sua revoada
livre, em aparência...
Como os humanos
aguardaram, com paciência,
o tempo de
imitar pairantes poses!...
Sem perceber
que apenas são algozes,
o seu pairar
não mais do que indolência,
enquanto
aguardam dos peixes a aparência,
para caçar com
bicos ágeis e atrozes...
Porque os
pássaros não são livres, realmente.
De sua fome são
escravos permanentes,
por seu imenso
consumo de energia...
E quando pairam
nos ares, simplesmente,
só economizam
os seus remanescentes:
comem dois
terços de seu peso a cada dia!
LIBERDADE II
Além disso,
dependendo da estação,
a maioria é
forçada a obedecer
ao impulso de
outras plagas conhecer,
seguindo
instintos, sem qualquer razão.
De certo modo,
mais livre é esse pavão
ou o canarinho,
por alimento ter.
Alpiste
suficiente e até para beber
um recipiente
colocado em sua prisão.
Comem menos e,
por certo, vivem mais
que nessa luta
diária por comida.
Ou quando
adejam, a beber de um rio,
na exposição a
predadores naturais,
sua melodia num
instante interrompida,
como quentes
refeições em dias de frio...
LIBERDADE III
Que liberdade,
então, a Natureza
concede a esses
belos passarinhos?
A liberdade de
vigiar seus ninhos
contra qualquer
inimigo, com certeza?
A obrigação,
confundida com nobreza,
de minhocas ir
buscar para os filhinhos?
Sua liberdade,
cerceada por espinhos,
em habilidades
de genética proeza?...
Ou quem sabe, é
a pura negligência
de soltar os
seus dejetos ao acaso,
sem se importar
onde o guano se desfaça?
Diria mais ser
um sintoma de impotência,
pois será
liberdade esse descaso
de defecar em
cima de quem passa?
LIBERDADE IV
E contudo, como
é belo o seu voar
sobre as águas
do oceano matutino...
Mil estrelas
refletem o destino
que o Sol
prodigaliza em seu raiar...
Coroa de
diamantes a espalhar,
em cada onda,
ao vento peregrino,
cada marola ou
crista um brilho fino
que nenhum
albatroz quer devorar...
Somente nós
aprendemos a voar
e escolhemos o
destino. O albatroz
se vê forçado a
voar aonde precisa.
Mas mesmo
sendo maquininhas de matar,
nada destroem,
com indiferença atroz,
senão aquilo
que à permanência visa...
LIBERDADE V
Afinal, mal
descoberta a aviação,
já os humanos
inventaram bombardeiros...
Ou davam tiros
de pistola, nos primeiros
monomotores de
incerta construção...
Mas é preciso
lembrar que a criação
não determina
aos pássaros ligeiros
viver com
inocência... Bandos inteiros
se reúnem, a
atacar sem compaixão,
os invasores de
seus campos de caça.
Não se dão bem
albatrozes com gaivotas...
Nem são
fragatas irmãs dos pelicanos...
Condenar
somente a nós é uma pirraça:
são assassinos
os bandos de cocotas,
bem mais
ferozes que a maioria dos humanos...
LIBERDADE VI
Por um lado, os
albatrozes são lixeiros:
comem dejetos
lançados por navios...
Não podem ter
os estômagos vazios;
para morrer de
fome são ligeiros...
E pela terra os
pássaros, certeiros,
comem insetos
em continuados fios,
mais eficientes
do que os desvarios
dos agrotóxicos
lançados nos terreiros...
Mas liberdade,
que é bom, eles não têm:
apenas fazem o
que a Natureza manda,
como se fossem
por ela programados.
Enquanto muita
escolha se nos vêm,
mesmo que seja
nada mais que a branda,
tranquila
fuga para sonhos encantados...
SUBSERVIÊNCIA I
Expus os meus
segredos à luz de cada estrela,
verdes, azuis,
laranjas, em seu piscar discreto.
Guardaram para
mim o sonho meu secreto,
sorrisos
devolvendo a cada mulher bela.
Espelhos ou
estrelas e a luz de Cinderela
refletem-se em
abóbora, num ardiloso afeto,
enquanto a Má
Rainha, ao espelho mais dileto
repete sua
pergunta em sorriso que congela.
Congelados
assim teus sorrisos e os meus,
é o brilho das
estrelas que te ilumina a face
e as rugas
suaviza, profundas, da ilusão.
E nesses
telescópios, os traços que são teus
eu vejo
iluminados e tal beleza nasce
da vida desse
amor que tens no coração.
SUBSERVIÊNCIA
II (1º julho 2011)
Que importa se
esse amor não se dirige a mim?
O amor, seja
por quem, toda mulher transforma:
o seu olhar
reluz e a face se conforma,
em fruta
rosicler, que se deseja assim...
Porque é o amor
de dentro que lhe dá essa forma:
o gosto de
baunilha e o cheiro de alecrim,
a doçura dos
lábios e a língua carmesim,
que até a menos
linda em formosura torna...
Porque, bem lá
no fundo, não existe mulher feia.
Há traços de
beleza na velha e na enrugada;
há traços de
ternura na menina mal formada...
E vejo essa
atração na mulher que mais receia,
por falta de
atrativos, ser sempre desprezada,
mas guarda nos
cabelos o rocio da madrugada.
SUBSERVIÊNCIA
III
E vejo em tais
sorrisos os sonhos mais secretos
e muito
especialmente nos sorrisos indecisos,
só erguendo
comissuras, disfarces mais altivos,
pois só seu
desapontos esperam ser concretos...
Então, lábios
apertam, negados seus afetos
e as rugas de
expressão afundam os seus crivos,
nesses sorrisos
velhos, de todo amor esquivos,
sem nunca
confessar quereres mais diletos...
E vejo ainda
beleza nos sorrisos invertidos,
embora
entrelaçada permeio à sua amargura,
nessas pernas
de aranha que ao queixo se desenham
ou convexos
sorrisos, em tais lábios sofridos,
na dura
convicção de transportar feiúra,
esquecidas da
beleza que os corações contenham.
SUBSERVIÊNCIA
IV
Porque essas
mil mulheres que hoje se acham feias
se escravizaram
tanto à própria subserviência,
que à busca da
beleza não mostram mais paciência
e as rugas se
aprofundam em numerosas teias...
E as faces se
rendilham, igual como receias,
a pôr de lado o
bem, em tal incontinência,
ferinas as suas
línguas, feroz a penitência
imposta por si
mesmas, castelares suas ameias...
E contudo,
ainda existe certo fulgor no espelho,
que as pode
reviver em mágico condão,
nesse fatal
momento de estranha lucidez,
que a Terra já
percorre desde que o mundo é velho
e no entanto se
renova, a cada geração,
a cada vez que
geram, em nova gravidez!...
SUBSERVIÊNCIA V
Pondo de lado,
entanto, o pendor do romantismo,
o fato
permanece que vejo em cada olhar,
em cada boca
amarga, em cada frio esgar,
essa beleza
esquiva do puro saudosismo...
Pois que, sem
mais buscar o amor do realismo,
arrombo os
calabouços e posso penetrar,
num toque que
lianas, num beijo singular,
a surda
invocação do pleno mesmerismo
do que podia
ter sido, se apenas a mulher
que se imagina
feia, que se esqueceu ser bela,
de amor
correspondido então se iluminasse.
E que pudesse
assim, de inseminador qualquer,
encher-se
novamente de seu fulgor de estrela,
em que sua
gravidez ao mundo se estampasse...
SUBSERVIÊNCIA
VI
E neste meu
mister, também sou subserviente
a cada outra
mulher que cruza por meus passos.
Não me posso
furtar a imaginar abraços
de perdição
total, de amor incandescente...
Contudo, essa
paixão, na mente tão frequente,
não busca assim
transpor a linha dos espaços.
Só quer é se
iludir, na gama dos compassos:
falar de amor
perdido, cantar de amor latente...
Por isso me é
tão fácil divisar essa beleza,
ocultada às
mulheres perante os próprios olhos:
a cada novo
amor, um toque do intangível...
Que me revela
assim quão firme é essa incerteza,
de penetrar das
almas os mais fundos refolhos,
tão só para
sonhar o orgasmo do impossível...
Veja
também minha "escrivaninha" em Recanto das Letras > Autores > W
> Williamlagos e o site Brasilemversos > Brasilemversos-rs, em que coloco
poemas meus e de muitos outros autores.