sábado, 8 de setembro de 2012

EMBALDE & LA GRANDEUR



                                 

Eu mostro bom humor todas as horas
e nunca me deprimo.  Apenas ira
toma conta de mim, quando se vira
a sorte contra mim nesses emboras,

ou quando as coisas sofrem tais demoras
que justificativa alguma me sugira
e no meu desalento, não surgira
motivo algum para cortar-me escoras.

Mas este bom humor talvez só seja
um bom metabolismo, que me enseja
o mundo contemplar com otimismo...

Ou mesmo o fato de ser vegetariano...
Se carne eu consumisse todo o ano,
talvez me escravizasse ao pessimismo.

EMBALDE II

Não é por religião, bem certamente.
Comiam carne na casa de meus pais
e tentaram me obrigar até demais
a seguir o seu regime permanente...

Meu pai era até mesmo prepotente:
eu precisava de proteínas animais,
não podia comer só vegetais,
faria mal e ia acabar doente...

(E então teria de um médico pagar,
gastar dinheiro com medicamentos...)
Bem claramente não era amor por mim!

Pois, obrigado, eu chegava a vomitar
a carne ou frango, passando maus momentos,
até se convencer que eu era assim!...

EMBALDE III

Sem comer carne, fiquei muito mais alto
do que me pai, que me dava pelo queixo...
Porém não sou fanático, pois não deixo
de comer queijo, ovos, requeijão...

E por necessidade, isso ressalto,
em casa dos amigos ou em viagem,
franzo o nariz e me encho de coragem,
mas como aquilo que me servirão...

São Paulo, certa vez, aconselhou
aos primitivos cristãos, não perguntarem
se a carne fora oferecida em sacrifício,

no templo de algum deus, pois demonstrou
que mal só haveria, se indagassem,
por causar à sua consciência um malefício.

EMBALDE IV

Mas meu costume não vem de ideologia
ou de qualquer preceito mais sagrado.
Desde criança, não é de meu agrado
comer carne de animal que a gente cria.

E mesmo caça comer me repelia...
Não sou budista e não sigo o Iluminado,
mas a frutas e cereais sou inclinado:
meu bom humor talvez disso surgiria.

Não derivado de algum gentil afeto,
mas proveniente de equilíbrio hormonal,
por enzimas vegetais mais constituído.

Se bem que, para sincero ser completo,
carne de peixes como às vezes, afinal,
sem me esforçar por dela ser nutrido.

EMBALDE V

Contudo, talvez haja outra razão.
Meu bom humor pode provir da alma,
que se mantém, com consistência, calma,
por pior que me pareça a situação.

E quando o mundo me zomba em negação,
às vezes me domina o sentimento
da cólera ou da ira de um momento,
mas não me deixo cair em depressão.

Na verdade, a vida sempre me ensinou
que são tolices a tristeza e a alegria,
cuja causa a gente esquece facilmente...

Pois quando um bem a gente conquistou,
algo de mal o equilibra e a ironia
é minha amiga e conselheira mais frequente.

EMBALDE VI

Assim, ao encontrar algum sucesso,
um brinde lhe erguerei, com amizade.
Se enfrentar a derrota, em saciedade,
também a tratarei com igual apreço.

De braço dado, minhas escadas desço
com estes dois companheiros da vaidade.
Toda desgraça eu trato com bondade
e dos triunfos até me compadeço...

E assim o mal deixo desapontado,
enquanto o bem controlo, do meu lado,
sem lhe pedir que faça algo por mim...

Mas para ambos me acho preparado,
como ilusões que são e, mesmo assim,
de nada valem quando chega o fim.                

LA GRANDEUR 

David era pastor e era flautista,
por entre áridas colinas e planaltos.
Defendia as ovelhas nos ressaltos
e assim tornou-se um ótimo fundista.

(Porque usava a funda.)  Não se insista
em trocar os sentidos em mil saltos:
talvez corresse até nos morros altos,
mas nos tempos de guerra e de conquista,

não há lugar para tais competições...
Foi com a funda que derrubou o gigante
(Quanto mais alto, se diz, maior a queda),

pondo a correr depois as multidões
dos filisteus, que Saul levou por diante,
pelo poder que só Jeová conceda... 

LA GRANDEUR II

Mas criado nas montanhas, foi salmista
e conseguiu descrever com perfeição
todo o esplendor dos montes do Jordão,
nas mil canções de seu mister de harpista.

Yehoshabeath chamava-se, mas a vista
até se turva, ao enfrentar a dimensão
desse nome, cujas sílabas hoje estão
esquecidas e da memória já nos dista.

Assim, chamou-se apenas "Capitão",
no dialeto da tribo dos Danitas
e é de todos conhecido por "David",

O jovem rei de manso coração,
bem diferente dessas letras esquisitas
de que somente eu não esqueci...

LA GRANDEUR III

Pois esse Deus, a quem David louvava,
não era Jeová, o deus guerreiro,
que escolhera a Israel, primeiro
e Seu auxílio a tal povo limitava.

Era El-Shaddai a Quem ele adorava,
o "Altíssimo", o deus do pegureiro,
o Deus dos Montes, deus do condoreiro,
e o mundo inteiro das alturas dominava! 

E foi assim que esse pastor salmista,
por vez primeira concebeu, talvez,
um deus que protegesse a humanidade

e não somente o guerreiro que conquista
para seu povo apenas, na altivez
de proclamar de outros povos a maldade.

LA GRANDEUR IV

Pois era assim.   Outros até diziam
que deveriam nas planícies combater,
em que tal deus perderia o seu poder,
que as alturas somente conferiam.

Mas as palavras de David luziam:
"Para os montes meus olhos vou erguer,
de onde o auxílio posso receber?"
E suas canções também nos transmitiam

"Que nosso auxílio provém só do Senhor,
que fez o céu e a terra", o Alto Deus,
em Quem buscamos a nossa proteção.

E nos ensina, em pastoril fervor,
não ser apenas um deus para os judeus,
pois todo humano dos outros é irmão.

LA GRANDEUR V

Assim eu busco no Altíssimo a proteção,
que fez o céu e a terra e o Universo.
A Ele louvo, enfim, em cada verso,
por mais que ímpios alguns parecerão.

Pois não existe qualquer inspiração
que não proceda desse Deus, converso
no Dom de Línguas sobre mim disperso,
que reconheço em plena aceitação.

Que seja o verso meu louvor, então,
mesmo que ímpio para ti pareça,
quando descrevo meu pendor ao sexo.

Pois representa, em minha concepção,
a vida plena que entre nós mais cresça
e que à própria morte empresta o nexo.

LA GRANDEUR VI

Então contemplo as montanhas do Arizona,
a "Zona da Aridez", que o nome indica,
no pasmo interno com que a vista fica,
perdida em pequenez, que assim me toma.

Que essa grandeza que do mundo é dona
e que o orgulho humano tanto achica,
de fato, pouco ou nada significa,
perante o esplendor que à mente assoma,

ao recordar que muito acima dela
paira o Altíssimo, dos montes incontido,
a presidir sobre o Universo inteiro...

Cada galáxia que só parece estrela
a nosso olhar, sem lentes revestido,
que mal consegue perceber o seu luzeiro.


Veja também minha "escrivaninha" em Recanto das Letras > Autores > W > Williamlagos e o site Brasilemversos > Brasilemversos-rs, em que coloco poemas meus e de muitos outros autores.



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