domingo, 26 de novembro de 2023


 

POEMALIPSE I  (1º mai 11)

(Joanne Woodward, apogeu hollywoodiano)

 

Sinceramente, espero não descer

a qualquer tumba e nem tampouco ao Averno,

por mais que seja fácil ao inferno

deixar que a alma possa descender.  (+)

 

Já basta para mim esse escorrer

dos humores do corpo para o externo...

Prefiro muito mais ter duplo inverno,

que corpo e alma possam proteger...

 

Mas desde sempre pedi a cremação,

para depois que daqui tiver partido:

que seja o corpo em chama consumido,

 

como já foi, afinal, o coração,

queimado tantas vezes na vaidade

da inútil queimação de minha saudade.

 

(+) Facilis descensus Averni -- Vergílio, citado por Dante Alighieri.

 

POEMALIPSE II

 

De certo modo, percebo como azia

essa ânsia voraz de que padeço,

em cuja poeira quase me enlouqueço,

dentre a faina semanal de minha poesia.

 

Não que me queixe.  A vida é bem vazia

quando tenho de pagar do ócio o preço:

dos momentos angustiosos não me esqueço,

fica a memória enrolada em desvalia...

 

São prendas de minhalma, no afinal,

de muitas coisas começadas mal

e só muito lentamente corrigidas...

 

Os dons que recebi sobrenadaram,

porém os meus defeitos perduraram

por longos anos de noites mal dormidas.

 

POEMALIPSE III – 19 novembro 2023

 

Bem cedo eu aprendi a ler mil versos,

sem me sentir capaz de outros fazer.

Contudo, quando a mim faziam ler

versos mal-feitos, de imperfeitos terços,

 

depressa ia encontrar os sons dispersos,

para imperfeitas rimas desfazer,

a métrica e a cesura entretecer,

em ritmos dos tipos mais diversos.

 

Foi pela música que assim eu comecei:

compunha melodias religiosas

e nelas colocava fios de rosas,

 

em versos livres que fácil adaptei

às circunvoluções dessa harmonia,

com que meu Deus louvar eu procurei...

 

POEMALIPSE IV

 

Depois, ao editar um jornalzinho,

representando da paróquia o boletim,

vi-me forçado a redigir, assim,

breves sonetos leves, de mansinho...

 

Quando o pároco cansado, coitadinho,

já quase meia-noite, um poema, enfim,

me pedia preparar, sem alfenim,

sobre um trecho da Bíblia, com carinho,

 

escolhido por ele... Era um soneto

para a primeira página, que era

sempre do pároco real obrigação.

 

E lá fazia eu, sem grande afeto,

os versos simples, em conclusão da espera

dos tipógrafos a cargo da missão...

 

POEMALIPSE V

 

Foi assim que recebi da língua o dom,

aos poucos se alinharam os sonetos,

das rimas descobri locais secretos,

meu Dom de Línguas revelou-se bom

 

para tanger dentro da mente o som

mais adequado para versos mais diletos,

da métrica e das rimas nos afetos,

no melhor ritmo de agradável tom

 

e como Irmão Parmenas assinava,

um dos sete diáconos iniciais,

por bem poucos conhecido no ademais;

 

quiçá para a humildade eu assinava,

talvez o meu orgulho me atiçasse,

às críticas que a mim mesmo eu iniciasse.

 

POEMALIPSE VI – 20 NOV 2023

 

Tocou sua trombeta meu primeiro anjo

e sobre mim seu vaso derramou,

o fogo sobre a mente se espalhou,

meu sangue refluiu como o de arcanjo

 

e meus dedos se tornaram em alfange,

no recorte de palavras a granel,

em mil imagens doces como o fel,

amargo o mel que esta minhalma tange.

 

Pois rebrotaram em versos de esplendor,

bem mais terrestre do que divinal,

não só do espírito vive o ser mortal,

 

é pela carne que descobre o amor,

o Irmão Parmenas se foi com sua tonsura,

deixando em mim não mais que um rastro de ternura.

 

POEMALIPSE VII

 

Veio o segundo anjo e sua trombeta

tocou, trazendo sobre mim montanha,

ardendo em chamas, com força tamanha,

que o mar da mente, ante a visão secreta,

 

se transformou em sangue nessa meta

de transmutar-se em verdadeira sanha

de versos escrever, que não se acanha

de lançar aos corações sua feroz seta.

 

Porém morreu a terça parte de minha vida,

perante o choque do vasto meteoro

e se esvaiu, no vapor de seus miasmas,

 

levando o meu desejo de vencida,

em troca dos poemas em que afloro

os sonhos castos desses mil fantasmas.

 

POEMALIPSE VIII

 

Quando a trombeta soprou o anjo terceiro,

morreu em mim um terço que pressinto

pelo seu nome atribulado de Absinto,

me causaria um dano derradeiro.

 

Em vez das águas do mar, caiu inteiro

dentro em meu coração, no qual eu sinto

a sua amargura total, tornando extinto

esse terço de meu sangue aventureiro,

 

que essa bênção-maldição de minha poesia

me prende junto à pena diariamente,

como a trombeta que ditou minha pena

 

e não mais saio empós a fantasia,

só me recolho na profusão da mente,

que essa terceira trombeta me envenena.

 

POEMALIPSE IX – 21 NOVEMBRO 23

 

Veio outro anjo a soprar trombeta quarta,

para secar em mim a luz do sol,

para apagar da luz o seu anzol,

enquanto a luz da estrela já se aparta

 

e de minha vida escureceu, bem farta,

a terça parte da existência do crisol

que dizem purifica e traz escol,

pois toda a escória do ouro ele descarta,

 

e desse modo tirou terço de mim,

a minha malícia e angústias mais secretas,

na forja altiva de maior sublimação,

 

porém fez permanecer em meu confim

toda a saudade das horas mais diletas,

em que pecava na maior satisfação!

 

POEMALIPSE X

 

Quando a quinta trombeta se escutou

e o meu abismo se abriu em cinza e lava,

dele surgiu a multidão escrava

de exércitos de ardor que libertou

 

os gafanhotos a quem o anjo dotou

com caudas de escorpiões e assim estava

toda a minhalma em tal textura brava,

que a horda inteira a mim atormentou

 

saindo assim em brasa outros poemas,

contra o mundo e contra a vida a protestar

e que nas minhas gavetas quis guardar,

 

mesmo fossem alguns preciosas gemas,

na religião do engaste de minhas taras,

mescla de angústia e de mil mágoas raras.

 

POEMALIPSE XI

 

Mas da sexta  trombeta ao ribombar,

em mim trotearam os quatro cavaleiros,

suas armaduras forjadas por armeiros

em fogo e enxofre acidulando a rebrilhar

 

cabeças crocodilianas a ostentar

os cavalos em que montavam os guerreiros,

com caudas de serpentes bem certeiros

açoites para meu sonho estraçalhar

 

e a terça parte de minhas ilusões

que ainda me restavam, extirparam,

só me sobrando o orgulho e minha vaidade;

 

foi nesse então que iniciei digitações

e meus versículos lentamente se mostraram,

em timidez buscando a humanidade.

 

POEMALIPSE XII

 

E no troar da sétima trombeta,

o dia marcando de meu julgamento,

não dos méritos de amor ou sentimento,

porém dos versos que a tua visão completa,

 

nas reações com que meu ser te afeta,

dos risos breves do entretenimento,

da interpolação de cada pensamento,

das formas novas que minha mente excreta.

 

Não sei ainda qual o tenebroso dia

da ira, em que a cólera domina,

mas sei que és tu que a mim irás julgar

 

e decidir se há valor qualquer nessa poesia,

enriquecida por ti sua própria sina

ou se ao contrário, só irás me condenar.

 

 

 

 

POEMALIPSE I  (1º mai 11)

 

Sinceramente, espero não descer

a qualquer tumba e nem tampouco ao Averno,

por mais que seja fácil ao inferno

deixar que a alma possa descender.  (+)

 

Já basta para mim esse escorrer

dos humores do corpo para o externo...

Prefiro muito mais ter duplo inverno,

que corpo e alma possam proteger...

 

Mas desde sempre pedi a cremação,

para depois que daqui tiver partido:

que seja o corpo em chama consumido,

 

como já foi, afinal, o coração,

queimado tantas vezes na vaidade

da inútil queimação de minha saudade.

 

(+) Facilis descensus Averni -- Vergílio, citado por Dante Alighieri.

 

POEMALIPSE II

 

De certo modo, percebo como azia

essa ânsia voraz de que padeço,

em cuja poeira quase me enlouqueço,

dentre a faina semanal de minha poesia.

 

Não que me queixe.  A vida é bem vazia

quando tenho de pagar do ócio o preço:

dos momentos angustiosos não me esqueço,

fica a memória enrolada em desvalia...

 

São prendas de minhalma, no afinal,

de muitas coisas começadas mal

e só muito lentamente corrigidas...

 

Os dons que recebi sobrenadaram,

porém os meus defeitos perduraram

por longos anos de noites mal dormidas.

 

POEMALIPSE III – 19 novembro 2023

 

Bem cedo eu aprendi a ler mil versos,

sem me sentir capaz de outros fazer.

Contudo, quando a mim faziam ler

versos mal-feitos, de imperfeitos terços,

 

depressa ia encontrar os sons dispersos,

para imperfeitas rimas desfazer,

a métrica e a cesura entretecer,

em ritmos dos tipos mais diversos.

 

Foi pela música que assim eu comecei:

compunha melodias religiosas

e nelas colocava fios de rosas,

 

em versos livres que fácil adaptei

às circunvoluções dessa harmonia,

com que meu Deus louvar eu procurei...

 

POEMALIPSE IV

 

Depois, ao editar um jornalzinho,

representando da paróquia o boletim,

vi-me forçado a redigir, assim,

breves sonetos leves, de mansinho...

 

Quando o pároco cansado, coitadinho,

já quase meia-noite, um poema, enfim,

me pedia preparar, sem alfenim,

sobre um trecho da Bíblia, com carinho,

 

escolhido por ele... Era um soneto

para a primeira página, que era

sempre do pároco real obrigação.

 

E lá fazia eu, sem grande afeto,

os versos simples, em conclusão da espera

dos tipógrafos a cargo da missão...

 

POEMALIPSE V

 

Foi assim que recebi da língua o dom,

aos poucos se alinharam os sonetos,

das rimas descobri locais secretos,

meu Dom de Línguas revelou-se bom

 

para tanger dentro da mente o som

mais adequado para versos mais diletos,

da métrica e das rimas nos afetos,

no melhor ritmo de agradável tom

 

e como Irmão Parmenas assinava,

um dos sete diáconos iniciais,

por bem poucos conhecido no ademais;

 

quiçá para a humildade eu assinava,

talvez o meu orgulho me atiçasse,

às críticas que a mim mesmo eu iniciasse.

 

POEMALIPSE VI – 20 NOV 2023

 

Tocou sua trombeta meu primeiro anjo

e sobre mim seu vaso derramou,

o fogo sobre a mente se espalhou,

meu sangue refluiu como o de arcanjo

 

e meus dedos se tornaram em alfange,

no recorte de palavras a granel,

em mil imagens doces como o fel,

amargo o mel que esta minhalma tange.

 

Pois rebrotaram em versos de esplendor,

bem mais terrestre do que divinal,

não só do espírito vive o ser mortal,

 

é pela carne que descobre o amor,

o Irmão Parmenas se foi com sua tonsura,

deixando em mim não mais que um rastro de ternura.

 

POEMALIPSE VII

 

Veio o segundo anjo e sua trombeta

tocou, trazendo sobre mim montanha,

ardendo em chamas, com força tamanha,

que o mar da mente, ante a visão secreta,

 

se transformou em sangue nessa meta

de transmutar-se em verdadeira sanha

de versos escrever, que não se acanha

de lançar aos corações sua feroz seta.

 

Porém morreu a terça parte de minha vida,

perante o choque do vasto meteoro

e se esvaiu, no vapor de seus miasmas,

 

levando o meu desejo de vencida,

em troca dos poemas em que afloro

os sonhos castos desses mil fantasmas.

 

POEMALIPSE VIII

 

Quando a trombeta soprou o anjo terceiro,

morreu em mim um terço que pressinto

pelo seu nome atribulado de Absinto,

me causaria um dano derradeiro.

 

Em vez das águas do mar, caiu inteiro

dentro em meu coração, no qual eu sinto

a sua amargura total, tornando extinto

esse terço de meu sangue aventureiro,

 

que essa bênção-maldição de minha poesia

me prende junto à pena diariamente,

como a trombeta que ditou minha pena

 

e não mais saio empós a fantasia,

só me recolho na profusão da mente,

que essa terceira trombeta me envenena.

 

POEMALIPSE IX – 21 NOVEMBRO 23

 

Veio outro anjo a soprar trombeta quarta,

para secar em mim a luz do sol,

para apagar da luz o seu anzol,

enquanto a luz da estrela já se aparta

 

e de minha vida escureceu, bem farta,

a terça parte da existência do crisol

que dizem purifica e traz escol,

pois toda a escória do ouro ele descarta,

 

e desse modo tirou terço de mim,

a minha malícia e angústias mais secretas,

na forja altiva de maior sublimação,

 

porém fez permanecer em meu confim

toda a saudade das horas mais diletas,

em que pecava na maior satisfação!

 

POEMALIPSE X

 

Quando a quinta trombeta se escutou

e o meu abismo se abriu em cinza e lava,

dele surgiu a multidão escrava

de exércitos de ardor que libertou

 

os gafanhotos a quem o anjo dotou

com caudas de escorpiões e assim estava

toda a minhalma em tal textura brava,

que a horda inteira a mim atormentou

 

saindo assim em brasa outros poemas,

contra o mundo e contra a vida a protestar

e que nas minhas gavetas quis guardar,

 

mesmo fossem alguns preciosas gemas,

na religião do engaste de minhas taras,

mescla de angústia e de mil mágoas raras.

 

POEMALIPSE XI

 

Mas da sexta  trombeta ao ribombar,

em mim trotearam os quatro cavaleiros,

suas armaduras forjadas por armeiros

em fogo e enxofre acidulando a rebrilhar

 

cabeças crocodilianas a ostentar

os cavalos em que montavam os guerreiros,

com caudas de serpentes bem certeiros

açoites para meu sonho estraçalhar

 

e a terça parte de minhas ilusões

que ainda me restavam, extirparam,

só me sobrando o orgulho e minha vaidade;

 

foi nesse então que iniciei digitações

e meus versículos lentamente se mostraram,

em timidez buscando a humanidade.

 

POEMALIPSE XII

 

E no troar da sétima trombeta,

o dia marcando de meu julgamento,

não dos méritos de amor ou sentimento,

porém dos versos que a tua visão completa,

 

nas reações com que meu ser te afeta,

dos risos breves do entretenimento,

da interpolação de cada pensamento,

das formas novas que minha mente excreta.

 

Não sei ainda qual o tenebroso dia

da ira, em que a cólera domina,

mas sei que és tu que a mim irás julgar

 

e decidir se há valor qualquer nessa poesia,

enriquecida por ti sua própria sina

ou se ao contrário, só irás me condenar.

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