quinta-feira, 13 de janeiro de 2022


 

 

COMPLEXIDADE I – 10 JAN 2022

 (Annette Stroyberg e Vittorio Gassman)

Ficamos sós e não me atrevo a nada,

temendo tanto de novo te afastar!

Enquanto teu olhar fica a sondar,

o meu esconde a vista atribulada.

 

Tal indiferença a penas conquistada,

treliça das pestanas a ocultar,

muxarabis meu sonho a marchetar,

nesta ilusão da espera esfacelada.

 

Tão longe estás, embora assim tão perto!

Mas o pior é que chego a te tocar

qual não sentisse por ti qualquer desejo,

embora tenha ainda o peito aberto

pelo lêiser que vem de teu olhar,

sem me animar a pedir sequer um beijo.

 

COMPLEXIDADE II

 

Coisas assim ocorrem com frequência

se participamos de solidão a dois;

mas não se trata de solidão apenas, pois

até falamos na mais plena anuência.

 

Antes ocorre é a tua intermitência:

certo momento estás presente, mas depois

a minha esperança simplesmente róis,

minhas questões são para ti impertinência.

 

E então retornas, como se nada houvesse,

mas onde guardo então minha segurança?

Seguem-se os gestos de carino sem mudança,

mas por trás deles minha incerteza cresce,

sinto apenas material nossa aliança,

qual breviário murmurado ao invés de prece.

 

COMPLEXIDADE III

 

Parece às vezes ser proposital

a tua maneira de ser inesperada,

sem dos caprichos poder saber mais nada,

o teu controle sobre mim desnatural.

 

Depois eu penso que de fato é natural

essa tua mutação tão costumada,

como se houvesse a meu lado outra deitada,

sem interesse qualquer de fazer mal.

 

E enquanto dormes, fico a meditar,

tens todo o valor do mundo para mim,

sem precisares te valorizar assim...

Mas por estranho que seja o teu amar,

certo estou que quanto existe é todo meu,

do mesmo modo que permaneço apenas teu.

 

VARIABILIDADE I – 11 JAN 22

 

Uma coisa é a nudez até sagrada,

bem diversa da impudicídia desonrosa;

há quem se exiba de forma vergonhosa,

não traz desejo, até repele um quase nada.

 

A nudez de uma mulher é pomba alada,

quando desnuda se faz pundonorosa,

de seu corpo não mais do que orgulhosa,

qual a sentir-se qual mulher realizada.

 

Pois esse tipo de nudez é inocente,

no endeusamento de um laço entesourado,

na expressão do rosto entronizdo,

que assim se exponha perante toda a gente,

pelo prazer de ao vento expor a pele,

pelo calor do sol que a carne vele.

 

VARIABILIDADE II

 

Outra atitude já é muito diferente:

há a mulher que se exibe com maldade,

querendo apenas seduzir a humanidade,

nudez pretende que excite totalmente.

 

Eu não consigo admirá-las plenamente:

não se oferecem em um ato de bondade,

mercadoria é sua carne na verdade,

o seu preço proclamando claramente.

 

Porém, de fato, será que culpa existe?

Uma mulher pode ser pura totalmente,

sem a menor intenção de prostituir-se;

e afinal, a realidade que persiste

é o reflexo da luz superveniente:

se é só um reflexo, por que não vender-se?

 

VARIABILIDADE III

 

Tudo pensado, não havendo comprador,

 qual o valor de tel mercadoria?

Somente a imagem é que alguém cobiçaria,

veste o corpo de novo em pundonor.

 

E que lhe importa o que faça o possuidor

dessa luz apenas que seu corpo refletia?

Talvez apenas com sex-appeal se mostraria,

na propaganda de um produto sem valor.

 

Talvez de alguém seja objeto de desejo,

quiçá elemento de qualquer decoração...

Com o reflexo da luz, vende o seu pejo?

Ou esse é um ato real de caridade

para quem vive em triste solidão,

sem jamais querer tocá-la na verdade?

 

VIRGINDADE I – 12 JAN 2022

 

Dizem que no Egito faraônico não havia

uma palavra a traduzir por “virgindade”,

entre a menina, a mulher e a puberdade,

nenhuma ênfase por certo recebia!

 

A vida então bem pouco duraria,

reprodução a requerer velocidade,

vivendo os pobres na maior promiscuidade:

como alguém virgem se conservaria?

 

Bem ao contrário, entre seus escravos,

os Hebreus, era a virgem apreciada,

mas se esperava fosse em breve desposada,

como uma abelha, a produzir os favos

de cera e mel da nova geração,

mediante o preço de sua defloração.

 

VIRGINDADE II

 

Eu realmente não sei seja verdade

a afirmação de constantes carnavais,

múltiplos corpos nessas bacanais,

mas não apenas por prazer ou iniquidade.

 

Mas garantia da proliferalidade,

cada ventre se expondo a muitos mais,

que uma semente através desses rituais

se implantasse de qualquer virilidade.

 

É certo que os hieróglifos não nos contem,

mas sendo a vida tão breve e tão difícil

para aquela multidão de camponeses,

é improvável que tais atos remontem

a essa frequência muito além do crível:

nem hoje existem carnavais todos os meses!

 

VIRGINDADE III

 

Mas certamente a ênfase se achava

numa eficaz e saudável gravidez,

que transmitisse dos Egípcios a grês,

cuja frequência constante se buscava.

 

Só entre os nobres possivelmente se encontrava

algum ritual aceito mesmo em honradez,

honrando a deusa que a colheita fez

e que constantes regas demandava.

 

Mas o normal sempre foi a poligamia,

que a semente do Faraó multiplicasse

e a aristocracia vigorosa conservasse.

Tal palavra talves até mesmo se dizia,

porém as múmias permanecem mudas,

sob suas faixas ressecadas e desnudas.

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