terça-feira, 8 de agosto de 2023


 

 

DISRITMIA I – 11 JULHO 23

 

Vou empacotar o frio deste verão

e o distribuir no calor que vem do inverno,

cada dia em que eu morrer será eterno

e cada dia de minha vida temporão.

 

Talvez se julgue que uma tal afirmação

e a realidade encontrem-se em alterno,

mas meu imaginar é dom superno

e pouco importa que não concordarão.

 

Ouço dizer que foi a curiosidade

que fez crescer a civilização,

mas eu afirmo que foi a imaginação,

como falou o inventor na realidade:

“Precisamos é olhar para as beiradas

e não para quaisquer ideias consagradas.”

 

DISRITMIA II

 

Tudo quanto para o progresso contribuiu

inicialmente foi por alguém imaginado;

pouco importa que pareça certo ou errado,

se não se preconizou, ideal algum fluiu.

 

Jamais um povo transporia um rio

sem que açgum tronco fosse observado

e um barco a pouco e pouco elaborado,

só quem nadasse ao lado oposto viu.

 

Mesmo a ideia mais básica de todas,

o dominio do fogo pelo humano

foi concebida pela imaginação;

também alguém elocubrou redondas rodas,

ao ver em troncos um cilindro plano,

no início achando grande oposição.

 

DISRITMIA III

 

Existe um provérbio baseado na Escritura,

embora seja rabínico em sua interpretação:

“Tudo que alcança nossa imaginação

já em Deus se encontra em sua mente pura.”

 

Por que não posso dar ouvidos à loucura,

propondo ideias de oposta convicção?

Afinal, até as temperaturas hoje estão

muito diversas das que a memória augura.

 

Não sei se a humanidade é responsável

pelo que chamam de global aquecimento,

talvez tenha só em parte contribuído,

mas aquecimento já houve interminável,

alternando-se com global resfriamento,

quais dinossauros teriam tudo isso concebido?

 

LEUCOPENIA I — 12 JULHO 2023

 

Quando o ar frio se transforma em vento

e já percorre cada canto e biriquete,

gotas de vento a pingar como confete,

gotas de ar em um novo encantamento;

 

quando o ar que se transforma num lamento

que a própria inspiração fervente afete,

as gotas sobem, sem que se projete

sobre a seca terra qualquer renovamento.

 

Escuto há anos sobre La Niña falar,

mas nada ouvia em décadas passadas,

nem seu irmão El Niño quando ali se alterna;

será que foi a própria gente a provocar

o aquecimento dessas águas transtornadas

ou simplesmente se resfria o mar e amorna?

 

LEUCOPENIA II

 

Ouço dizer que dos calores o pior

está afetando os países europeus,

tanto quanto valham esses registros seus

ou até que ponto ocorreu coisa maior.

 

Afinal, já foi a terra bem menor,

em velhos tempos, quando os mares de Deus

cobriam as praias dos atuais ateus,

não foi a própria Groenlândia bem melhor?

 

A Leif Erikson chamam de mentiroso

por chamar de “Terra Verde” aquele gelo,

mas se comprova houve cultivo e criação

durante décadas, até que o inverno tenebroso

tudo cobrisse com seu manto puro e belo,

corpos dos mortos conservando em proteção.

 

LEUCOPENIA III

 

Em livro antigo contemplei fotografias 

desses colonos que o gelo conservou,

até as vestes de um bispo se mostrou:

eram mais prósperos tais antigos dias

 

e pelo estado dos corpos percebias

que sua estatura pouco a pouco se encurtou,

o alimento que encontravam escasseou,

resfriamento global em amplas vias.

 

Também  ocorreram outros resfriamentos,

como o Inverno que derrotou a Napoleão

e aquecimentos em inversa proporção.

Por que afirmar com ferozes argumentos

que é o desmatamento amazonense

o responsável pelo calor que hoje condense?

 

SARCOPENIA I – 13 julho 2023

 

O amor sexual sempre é mais verdadeiro

que esse amor de mãe tão proclamado:

no filho vê seu próprio corpo continuado,

no amor real a entregar-se por inteiro.

 

Nem sempre espera que seja o mensageiro

que a fecunde para o ente desejado;

a biologia causa o evento inesperado

e o resultado nem sempre prende o companheiro.

 

Homem algum partilha tão absolutamente

do corpo da mulher como a criança.

O amor romântico bem mais além alcança,

do coração a brotar mais gentilmente:

por ele o homem a comprometer-se vai,

não é seu corpo que à gestação o atrai.

 

SARCOPENIA II

 

Segundo em penso, quer a Dama Natureza

que toda mulher deseje a gestação,

que seja isto falso muitas me dirão,

mas o seu corpo as impele com certeza.

 

Mesmo que busque um homem que despreza

e saiba o quanto lhe custará a criação

e nem compreenda o que lhe vem ao coração,

é o hormonal que a reveste de beleza.

 

Bem lá no fundo há um laivo de amargor

quando seu útero jamais foi preenchido,

mesmo que o negue com a maior veemência,

para a si mesma afirmar que basta o amor

das amizades e parentela recebido

e a algum animal se dedique com paciência.

 

SARCOPENIA III

 

Já hoje em dia isto se pode contestar,

especialmente nas multidões urbanas,

em que se encontram as teorias mais insanas

sobre as crianças em tanques conservar,

 

após fertilização in vitro praticar,

mas ainda creio que se possam enlutar

os úteros e ovários em seu abandonar,

sem essas carnes que com o ventre irmanas.

 

Não cabe a mim, sendo homem, lhes pregar

e lhes dizer o que devam fazer,

mas sempre achei que é o amor sexual,

mesmo sendo realizado com igual par,

que apenas possa satisfação trazer,

por um serzinho a proteger de todo o mal,

 

SARCOPENIA IV

 

Qualquer criança que se possa ver crescer,

pouco importa se gerada ou adotada,

mas há constância entre os povos entranhada

de algum modo a assim permanecer.

 

Seria a clonagem uma forma de vencer

essa impulsão por natureza consagrada,

em laboratório em que a criança foi gerada,

como se vai cão ou gatinho a escolher?

 

A mim parece que o que nos torna humanos

é justamente ver o que saiu de um ventre,

confiantemente a requerer por proteção

contra a vida e a multidão de danos,

bem mais do que escolher-se dentre

órfãos que vivem sem qualquer aceitação.

 

INGENUIDADE MORTA I – 14 JULHO 2023

 

Quando criança, duzentos filhos pretendia,

 justamente como as bagas da romã;

quase parecia ser pretensão insã,

quando esta atual fraqueza me prendia,

 

quando no leito o dia inteiro ficaria,

até o caminhar sendo tarefa vã,

mil vitaminas a combater malsã

esta moléstia que me acometia,

 

rascunhar versos, ainda três por dia,

sentado na poltrona ou no sofá,

sem saber se um dia a limpo os passaria,

se perante o computador me assentaria,

a desconfiar que bem algum não há

nestes sonetos em que tanto insistiria.

 

INGENUIDADE MORTA II

 

De fato, levei um tombo, mas por sorte,

nada quebrei, só fiquei com sarcopenia

em meu braço direito e também leucopenia

em meus glóbulos brancos, qual revelou o importe

 

de meu sangue, nada que levasse à morte,

mas fiquei com o braço desprovido de energia

para digitar no computador, só conseguia

rascunhar estes sonetos de mau norte.

 

Bem reconheço serem bem inferiores

aos que costumava geralmente rascunhar,

mas somente prossegui por teimosia,

enquanto a esposa e os filhos mais temores

tiveram do que eu, a me obrigar

que inteiramente em repouso ficaria.

 

INGENUIDADE MORTA III

 

Pois contrataram até como acompanhante

o funcionário que era nosso jardineiro,

não me deixando subir a escada,sem primeiro

tocar a campainha em som vibrante!

 

Igual querendo quando eu descia e adiante

teria estar perto de mim e bem ligeiro,

para evitar a minha descida em passo arteiro:

bem humilhando me sinto neste instante.

 

Nem mesmo o banho posso tomar sozinho,

a porta aberta para o corredor

e o bom valete fica ali com o celular,

enquanto eu cumpro tal ato comezinho,

na morta ingenuidade de meu velho ardor,

ainda que eu ache que estão a exagerar!

 

 

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