sexta-feira, 9 de fevereiro de 2024


 

 

AMPLO AMPLEXO I – 17 janeiro 2024

(Sharon Tate, que morreu assassinada)

 

O que é verdadeiro?  É o amor espiritual,

Esse que os medíocres chamam de platônico,

Esse amor mais profundo, amor ctônico,

Que não se atreve a pedir amor carnal?

Em sua expectativa, tem seu toque divinal,

Mas em gemidos de lascívia, é um evento sônico,

Engolfado em si mesmo, é mais icônico,

Que poucos sentem, habilidoso e triunfal.

 

Sempre que te vejo, ao menos em minha mente,

Só imagino qual delícia que seria,

Ansiando em ti o delírio do prazer,

Sob o olhar da solidão mais complacente,

Sei bem o quanto minhalma vibraria,

Mesmo que nunca me possas pertencer.

 

AMPLO AMPLEXO II

 

Abraços são abraços no final,

Por mais duráveis, têm começo e fim,

Por mais egoísta seja ouvir um sim,

Por mais altruísta em proteção do mal,

Pois cada abraço é um amplexo material,

Perfumado como as flores de um jardim,

Que se ressecam e se perdem para mim,

Que se desmanchem no canteiro é natural.

 

Ou como flor que muito mais perdura,

Revestida de importância emocional,

Entre as páginas de um livro tal guardado,

Mas ressecada, sem cor, final agrura

E assim o abraço, por mais sendo triunfal,

Tão irreal quanto a sombra de um pecado.

 

AMPLO AMPLEXO III

 

Por longa seja a duração da espera,

Quando se espera, aguarda-se o possível,

Essa quimera por um tempo inexaurível,

Que tanto pálido ardor no peito gera.

Mas caso a espera acabe, como altera

O sentimento antegozado incrível,

Em nada é igual ao sonho imperecível,

Pois todo abraço é a realidade mera.

 

Já aconteceu e não mais pode ser mudada

Nessa figura de sonho tão buscada,

Esse escrínio variegado e multicor;

Assim não peço teu abraço, minha querida,

Por mais que belo, deixará desiludida

Toda a esperança imaginada com fervor.

 

INTROSPECTIVISMO I – 18 JAN 24

 

O poema é teu, que mo mandaste pelo vento,

Entrou em minhas narinas, porém não nos ouvidos,

Em meu cérebro enraizou versos perdidos,

Sem ser criado por alegria ou desalento.

O poema é teu, nascido em teu tormento,

Só o desaponto em versos malferidos...

Eu os escutei então, despercebidos,

Para depois lhes dar forma e portento.

 

E o poema é dele, que morreu suflando

Suas dores últimas para o respirador,

Em sua agonia deu-lhe restos de calor

Dessa poesia que jamais foi publicando,

Que o poema é vida esgarçada nessa calma,

O poema é a morte ressurreta em tinal palma.

 

INTROSPECTIVISMO II

 

Por minhas narinas entraram seus refolhos,

Sem que ao menos os percebesse assim,

Mas o poema é meu, que só existe em mim,

Depois que o degluti pelos meus olhos,

As minhas mucosas transformadas em antolhos,

Em mim somente encontrou destino e fim,

Cada verso em seu perfume de alecrim,

Cada estrofe recobrada dos abrolhos.

 

Cada soneto me insuflaram os antigos

E não apenas pela cópia dos modelos,

Em minhas narinas se esbatendo como relhos,

Sobreviventes de tantos mil perigos,

Mas meu espírito recolheu os sonhos belos,

Vertendo as fáceis lágrimas dos velhos...

 

INTROSPECTIVISMO III

 

Ou quem sabe?  foi apenas o teu pranto,

No meu momento desta introspecção,

A captar de ti a antiga solidão,

Que espalhaste pelos ares como um manto.

Ou quem sabe? foi a magia de teu canto,

Que permitiste escapar sem proteção,

Nos momentos mais gentís de tua emoção,

Cantando a alma qual novena de algum santo.

 

Só sei que eu captei, vindo do espaço,

Esse perfume que me ressoa nas cocleias,

Que pouco ou nada tem a ver com o olfato,

Frases dolentes que acolhi no meu abraço,

Nesse arcobotante constritor das epopeias,

Que se espalhou em mim ao teu contato.

 

REITERAÇÃO I – 19 JANEIRO 2024

 

Ainda embora tenha já te escrito tanto,

Mal reconheço que de fato me empolguei,

Frações apenas de mim então lancei,

Por mais chorasse, nunca mostrei meu pranto,

O que mostrei foi muito mais o canto

Que brotou de minhalma e que plantei

Profundamente – dentro ao solo o enraizei,

Paródia minha de tudo quanto é santo.

 

Nem é que nada te quisesse revelar,

Mas há coisas que se trancam na garganta,

Sem querer nunca sair e nem me espanta

Não ter a força para o amor esternutar,

Soltando apenas o que dissolve minha saliva,

Na maior parte o puro ideal da mente esquiva.

 

REITERAÇÃO II

 

Nem sei se algum dia lerás o quanto escrevo,

Somente sei que o quanto guardo não lerás;

Se escapasse de mim o canto mais veraz,

Exporia para ti bem mais que devo.

Destarte o sonho que em minhalma cevo,

Será a parte que nunca encontrarás,

E se a encontrares, quiçá te assustarás

De quanta mágoa dentro do peito levo.

 

Mas se mostrasse a ti, tanto imporia,

Que teu coração podia até assolar

E o mais possível é que te espantaria:

Não deixarias que essa agonia singular

Se acrescentasse àquela que jazia

Já em teu seio feminino a germinar.

 

REITERAÇÃO III

 

Mas essas coisas que não digo, não escondo,

Simplesmente rccusam-se a sair,

Eu pigarreio, mas não consido transmitir,

Entre as amígdalas  eu as flagro pondo

E o meu amor por ti eu vou repondo

E como estrela o vejo a reluzir,

Porque minha língua passa a perquirir,

É por si mesmas que se vão pospondo.

 

Mas bem queria minha úvula esvaziar

E transmitir-te inteiramente o canto

Que pelo céu da boca, em meu espanto,

Mais desejara para ti lançar,

Que sua vibração pudesse em ti zunir!

Por mais que saiba nada possa transmitir...

 

EXUMAÇÕES I – 20 JANEIRO 2024

 

O corpo de meu pai não puderam exumar,

Inteiro estava dentro do ataúde,

Em mim causando certa surpreza rude,

Os funcionários sem chegar a se espantar.

“Isso não é qualquer coisa singular,

Nem é estranho que depois o corpo mude

E de toda a sua carne se desnude

E logo em ossos  se vá aniquilar.”

 

“Mas agora que foi exposto ao ar ambiente,

Em um mês ou dois só restará o esqueleto,

Suas roupas qual em cabide penduradas,

Que muitos outros já se encontrou frequente,

Sem nada de magia ou de secreto,

O ar parado deixa as carnes conservadas.”

 

EXUMAÇÕES II

 

“Só não se pode aproveitar a sepultura,

Como é costume para alguém mais colocar,

Quando os primeiros ossos poderíamos ensacar,

Outro ataúde a engavetar na fenda escura.

Será preciso nessa situaçao bem dura

Uma outra catacumba se alugar...”

É desse modo que o cemitério irá lucrar,

De novas mortes a ocorrência bem segura.

 

Porém passado o tempo em segurança,

Outros restos serão também ali guardados,

Serão os ossos nos cantos colocados.

Mas até quando nossa memória alcança,

Não vimos almas a serem sepultadas,

Tão só as sementes de corpos resguardadas.

 

EXUMAÇÕES III

 

Se por acaso um féretro se abrisse,

Mostrando o corpo de um padre ou de uma freira,

Proclamação de milagre seria bem certeira

E santidade talvez então se conferisse.

Em esquifes de vidro mesmo diz-se

Que se guardam em igrejas, qual a verdadeira

Prova de que a carne se conservara inteira

Por qualquer bênção que Deus lhe conferisse.

 

Os Franciscanos só no chão são enterrados,

Do mesmo que que em algumas ordens

Também as freiras têm igual tratamento,

Em humildade assim sendo sepultados,

Sem qualquer margem para propagar desordens

De que seus corpos devam ser beatificados.

 

EXUMAÇÕES IV

 

Mas essa dúvida de fato é inexistente,

Falam as Escrituras só da ressurreição

Do corpo espiritual em exaltação,

São Paulo nesse ponto é bem veemente,

Mas é costume e não se mostra à gente

Ser bem mais simples realizar a cremação,

De cada alma a facilitar a floração:

Guardar os corpos traz renda permanente!

 

Antigamente se buscava a proximidade

De cada altar, para garantir sua proteção,

Os poderosos sepultados sob o chão

Dessas igrejas antigas e mesmo hoje é verdade,

Que reis e nobres possam assim ser conservados,

Pelos que rezam a serem pisoteados!

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