quinta-feira, 19 de agosto de 2021


 

 

TEIMA DE AMOR I – 10 ago 2021

 

Amor é para mim um sonho longo,

vasto e teimoso, que insiste em retornar

a cada vez que penso em despertar

e rói-me a alma qual fora um camundongo;

amor tem toda a vibração de um gongo,

mas que ao contrário de me entusiasmar,

me prende firme em seu encarcerar,

rufar constante da película de um bongo.

 

É um sonho feito de calmas inquietantes,

que se intromete em largo desfraldar

contra a fronte marejada de suor

e nos captura em derrotas triunfantes,

de hora em hora o seu novo conquistar,

em sua modorra vibrante de estridor.


(Na ilustração, Christina Ricci, a Wandinha

da Família Addams... que cresceu...)

 

TEIMA DE AMOR II

 

Pois se o descrevo assim contraditório,

é que vivi em suas doze mil facetas,

dodecaedro de quinas incompletas,

cada ângulo a retomar, vindicatório

o seu poder sobre mim, esternutório,

sempre que penso dominar-lhe as tretas

e então me impele sobre outras aletas,

em labirinto sagaz e peremptório.

 

Mas nem se pense que de amor me queixo,

mesmo no ergástulo de tais rubros grilhões,

não me interessa quebrantar essas correntes,

inermemente que me domine eu deixo,

a suspirar por cem novos corações,

ainda que os veja não mais que indiferentes.

 

TEIMA DE AMOR III

 

E para que me serviria ser poeta,

se não pudesse às lianas de um amor

entregar-me inteiramente em meu ardor,

até minha frase final estar completa?

Assim me deixo deslizar por cada aleta,

do dodecaedro eu julgo-me senhor,

mesmo sabendo ser meu dominador,

quando de amor novo pretexto me projeta.

 

Porquanto posso enamorar-me sem amar

e ver-me aceito em orgasmos cintilantes

por algum corpo que jamais avistarei;

ou ao invés amar, sem sequer me enamorar

e descrever essas angústias palpitantes

que não senti e nem sei se sentirei!...

 

TEIMA DE CARVÃO I – 11 AGO 21

 

O amor é um carvão que não se apaga,

 um brilho opaco dormindo sob as cinzas;

com leve sopro basta que o atinjas

e um calor, ainda que leve, o rosto afaga.

O amor é uma ternura que se alaga,

sincero sendo ou mesmo quando o finjas,

sendo maldito ou quando inteiro o benzas,

dentro do peito em secular adaga.

 

Melhor amor por amor correspondido,

que contribua a perpetuar a raça,

que amor marchetado de desgraça,

mas que a mente enriqueça em seu vagido,

no infinito redespertar do que mais quero,

tão mais ansiado quanto mais o espero?

 

TEIMA DE CARVÃO II

 

A cada vez que espero, sai a alma

a dar voltinhas ao redor da praça,

mesmo que isso só mencione por pirraça,

de fato a espera vibra como palma,

em um zéfiro caprichoso que me embalma

e me faz contemplar a inteira raça,

os que antes de mim foram à caça,

compartilhando aos pares trechos dalma.

 

Ou pelo menos, as sementes do futuro,

por mais que não passe de palavra,

somente o encontro do deeneá ansioso,

sempre que houver concepção, algo de puro,

porquanto a estrada do porvir nele se lavra,

no mais brutal sempre a haver algo formoso.

 

TEIMA DE CARVÃO III

 

Assim espero, remexendo no borralho

de algo de amor esquecido no passado,

de algo de encanto nunca partilhado

ou que brilhou para esgotar-se em ato falho;

sobre as brasas meu sopro qual um malho,

subindo a poeira, o olfato perturbado:

então espirro e o espírito espantado

cai como brisa a provocar um talho.

 

Pouco importa qual seja essa lembrança

que me provoque tal esternutação,

meiga ou perversa reacende esse carvão

 e cada chama que minha palma alcança

perfura a carne e me traz inspiração,

e em novo verso orquestra a antiga dança.

 

TEIMA VIRAL I – 12 AGO 2021

 

O escudo central de meu ventilador

claramente me lembra um vírus de Covid,

qual em microscópio eletrônico nos incide

esse minúsculo e fatal destruidor.

Tem cinco pás o forte soprador

e é necessário que com calor eu lide,

que ferozmente meu organismo agride:

pelo aparelho até sinto um certo amor.

 

Mas ai de mim! quando a luz é cortada,

pois no calor não consigo fazer nada

e me apavora esse global aquecimento,

mas o pior é que para ele contribuo,

pois cada vez que com o ardor eu suo,

deixo mais quente o ambiente do aposento!

 

TEIMA VIRAL II

 

Será que o vírus de Covid contribui

para aumentar o global aquecimento?

A cada morte que provoca seu portento

certo é que o calor interno não mais flui.

Por outro lado, o equipamento imbui

o ambiente com a energia do momento,

e desse modo o paciente em sofrimento

para o consumo de energia mais influi.

 

Há essa teoria de que a Terra se ressente

de tantos humanos, para Gaia parasitas

e deles busca de algum modo se livrar;

mas nesse caso, como a raça é resiliente

ou serão frágeis essas lutas esquisitas

que a humanidade insiste em superar?

 

TEIMA VIRAL III

 

Até o presente, eu nao me conformei

com quanto dizem desse vírus tão pequeno,

que com sabão se afasta o seu veneno:

como em seu enorme poder então crerei?

Ainda suspeito que esse vírus não é o rei,

pois enfraquece o organismo em seu aeeno,

chama outras causas de poder mais pleno,

em seu auxílio, num processo que não sei.

 

Somente sei que o ventilador me favorece,

com cinco hastes em meus piores meses

e do vírus se proclama inversa prece.

Talvez Gaia tenha raiva é dos Chineses,

já que queimam por lá tanto carvão,

tanta doença ali espalhando com paixão!

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