segunda-feira, 12 de outubro de 2020

 

 

AQUILÍFERO I – 2 JUN 2019 (*)

(*) Águia é “Aquila” em latim e o “u” se pronuncia.

 

O Aquilífero, nas legiões romanas,

era o porta-estandarte, ou seja, quem

transportava a sua águia, sempre alguém

de força e resistência sobre-humana,

porque era pesada e lhe reclama

mais robustez que a maioria tem;

era uma honra, sem dúvida, porém

responsabilidade muito vasta e soberana.

 

Se, por acaso, a águia lhe tomassem,

durante algum combate ou a perdesse,

mesmo quebrada, sua pena era a de morte;

e mesmo desmaiado que o encontrassem,

no campo de batalha e ali se evidenciasse

a perda desse emblema, teria essa igual sorte.

 

AQUILÍFERO II

 

Em geral, portava a águia um centurião,

o mais velho de todos na coorte

ou então este designava para o porte

o mais forte legionário em atuação;

o tribuno, comandante da legião,

ao indicar de algum assalto o norte,

dava a ordem aos aquilíferos, de sorte

que dessem esses o sinal para a missão.

 

Se não movesse a águia, toda a tropa

permanecia imóvel no lugar,

pois bem à frente deveria avançar;

e foi assim que conquistaram meia Europa,

por toda parte as águias implantando,

dando o aquilífero a vida em seu comando.

 

AQUILÍFERO III

 

Igual que a águia valia mais que a vida,

também eu tenho aquilífera missão,

medíocre vejo a poesia em relação

ao verso livre em fraqueza concebida,

pois verso livre não é coisa parecida

com soltar linhas sem rimas ou noção,

este requer uma real inspiração,

caso contrário foi só prosa redigida.

 

Por isso eu luto pela forma do soneto,

sou o aquilífero desses quatorze versos,

que cantam loas em elegantes traços

e não perco minha lida em abjeto

render-me a adversários tão dispersos,

mas firmo as hastes dos sonetos nos meus braços.

 

CRIANÇA I – 3 JUNHO 2019

 

A ti dirijo minha alma em canto e dança,

da hoste humana minúsculo recruta,

pois cabe a ti levar adiante a luta

dos ancestrais em ínclita confiança;

se por acaso hoje vives na abastança,

antepassados teus morreram em disputa

com feras e doenças e a conduta

da própria natureza em cruel modança.

 

Não obstante, embora assim sofressem,

para o progresso foram impulsionados,

de cada geração guardou-se a prenda,

para que a ti melhor vida hoje te dessem,

mesmo que nunca sejam contemplados,

salvo na poeira que cobre a antiga senda.

 

CRIANÇA II

 

É bem possível que sejas por demais

pequeno e descuidado em tua vereda,

teu rosto límpido, sua pele igual que seda,

em teu olhar cem visões angelicais;

e destarte, por tais motivos naturais,

ainda não possas compreender a missão leda

que hoje te cabe, contudo te segreda

a voz da raça em murmúrios seminais.

 

Não cabe a ti apenas o proveito

desse arcabouço de civilização,

porém precisas levar avante o archote;

mais que dever, é teu este direito

de acrescentar à antiquíssima missão

e para outra geração deixar teu dote.

 

CRIANÇA III

 

A minha parte eu fiz, deixei escritos

os mil conselhos que deves entender;

se algum de vós se dispuser a ler,

não me perdi nos versos circunscritos,

porém espero que meus ideais benditos

sejam por ti conduzidos a crescer,

que ames a arte e a possas merecer,

qual defensor contra ideólogos aflitos.

 

E que a ciência por ti possa progredir,

para que nutra com real veracidade

melhor as gentes que nos dias passados;

que pela história te deixes influir,

em gratidão pela arcaica humanidade

que te legou sua cultura e seus cuidados.

 

ARQUEÓLOGOS I – 4 JUNHO 2019

 

Quando Schliemann descerrou a antiga Troia,

pelas obras de Homero obcecado,

não foi buscá-la no ponto acostumado

por tradição, sem prova em que se apoia,

mas encontrou tal literária joia

em um lugar bem diverso do afamado

e bem depressa viu seu sonho confirmado

nessa colina faminta igual jiboia,

 

que devorara já sete cidades,

após destruição reconstruídas,

que a humanidade tende a retornar

aos lugares em que tais comunidades

se ergueram em alturas protegidas

e sobre as cinzas novamente se assentar.

 

ARQUEÓLOGOS II

 

Na verdade, essas cidades eram mais:

os arqueólogos posteriores descobriram

vinte e tantos estratos, quando abriram

escavações com modernos materiais.

De Schliemann enganos foram naturais,

de Troia o ponto seus olhos distinguiram,

mas em um estrato errôneo então a viram,

em que um tesouro de obras perenais

 

achou, enfim... Ali chamou somente Helena,

a sua esposa de romântico escolher,

para ajudá-lo esse tesouro a recolher,

cujo transporte para a europeia cena

foi bem difícil, bem mais um contrabando,

pois ouro e joias eles iam transportando!...

 

ARQUEÓLOGOS III

 

Algum repórter viu a máscara de ouro,

funéreos traços de algum rei que não lembrou

e de Agamemnon, por capricho, a apelidou,

uma tolice para seu total desdouro,

que o rei heleno voltou com seu tesouro

e Clitemnestra, sua esposa, o assassinou;

de Príamo o cofre nunca se encontrou,

Troia inteira destruída em mau agouro...

 

Mas a obra de Schliemann foi real:

foi o veraz precursor da arqueologia;

antes dele, só de Pompeia se sabia

e foi seguido por cortejo triunfal,

que de Nínive e Babilônia e até Babel

localizaram os templos e o quartel.

 

ARQUEÓLOGOS IV

 

Depois Cnossos, com o Labirinto arcano

(do Minotauro os ossos não se acharam),

porém Micenas e Tirinto se encontraram

graças ao esforço do Schliemann soberano

e mesmo em Roma os vestígios do Romano

Império sob Mussolini se escavaram

e nas Américas cem templos desfraldaram

das lianas das florestas sem mais dano.

 

Mas não se levam mais estátuas aos museus;

hoje a tendência é mais restauração

e demonstrar como a gente ali vivia,

porque, afinal, antepassados foram teus,

muito mais que os Faraós da tradição,

cujas pirâmides qualquer um contemplaria.

 


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