segunda-feira, 8 de novembro de 2021


 

WEHMGERICHT I – 5 NOV 2021

(Ou o Verboten Gericht = Tribunal Proibido)

 

Muito se fala da Santa Inquisição,

com seus terríveis interrogatórios,

que tanto mal fizeram até a simplórios,

que nada tinham a dizer em confissão.

Sem dúvida terrível essa organização,

porém seus métodos de tortura peremptórios

não eram exclusivos em tão merencórios

séculos da Baixa Idade Média em duração.

 

Mesmo em países de menos crueldade,

tal como em Portugal, que o Ofício recusava,

a prática da tortura era coisa bem normal,

ao menos a chamada Ordinária, na verdade,

causando dor, mas que ossos não quebrava,

qual a Extraordinária, já bem menos habitual.

 

WEHMGERICHT II

 

Contudo os padres que eram torturadores,

tinham a desculpa, quiçá, da religião,

por mais sadístico o seu coração

e outros também praticavam tais horrores.

Nos século XIV e XV os infelizes estertores

eram causados por profana obrigação,

muito temida e sem ter contestação

a Liga da Corte Sagrada em seus fervores.

 

Havia até mesmo uma certa hierarquia:

Anciães, Juízes, Espiões, Executores

e os Escrivães, sob as ordens do Conselho;

e quanto o tribunal secreto resolvia

os Executores obedeciam a seus autores,

a invadir lares no realizar de um mal parelho.

 

WEHMGERICHT III

 

A Corte Vêhmica tinha do Imperador

autoridade para julgar e executar,

que raramente se queria incomodar

com crimes comuns em tal setor.

Em Dortmund seu poder de julgador,

na Wesphalia, em que podiam convocar

os acusados para em porões interrogar:

raro era aquele que sobrevivia a tal horror.

 

Ainda no século Treze começaram,

em alguns casos indo até o Dezessete,

sendo inocentes ainda torturados;

por religião tais não se desculparam,

só no cível é que seu poder projete,

dos mais arcaicos direitos projetados.

 

WEHMGERICHT IV

 

Dos Freischöffen o costume derivava,

os “Juízes Livres         “ para tal “Corte Secreta”

ou heimliches Gericht, a qual afeta

um outro nome que igual os designava.

O tribunal ainda Stillgericht se chamava,

o “Tribunal Silencioso” de cujas gretas

o medo se espalhava em ondas pretas,

que a multidão inteira apavorava.

 

Quando a Igreja Luterana o proibia,

tal tribunal secretamente se reunia

à revelia a ordenar assassinatos,

mas apesar de tantos desacatos,

no século dezoito ainda persistia

essa Liga, que só o tempo extinguiria.

 

FAREJANDO CARINHOS I – 6 NOV 21

 

Quando amor possui uma vera solidez

de nada importam os percalços no caminho,

a rispidez é acobertada por carinho,

sofrendo apenas temporária palidez.

 

Quando amor se gravou em qualquer tês,

por amizade e por afeto, qual espinho

encravado na alma, pequeninho,

sem causar dor, mas permanente em grês.

 

Então abalos se superam lentamente

e logo cresce uma nova concordância,

sem dar motivos para ampla rachadura

e o anseio antigo se afirma novamente,

talvez com laivo de rancor daquela instância,

mas conservado em permanência pura.

 

FAREJANDO CARINHOS II

 

Pode até se achar subjacente tal rancor,

no despertar de injúrias mais antigas,

mas predominam certezas mais amigas,

que tudo apagam por força do calor.

 

Que amor não é busca e espera de um favor,

nem a guia constante dos aurigas,

é mais refrão guardado nas cantigas,

que dentro dalma se alojam nesse amor.

 

Sem que se esperem sempre horas de alegria,

nem sequer horas de concordante apoio,

seres humanos são falhos e cometem

erros profundos em impulsos de folia,

mas amor sabe separar trigo do joio:

e os bons instantes de novo se repetem.

 

FAREJANDO CARINHOS III

 

Pois amor mútuo é tal qual mútuo perdão

de qualquer erro do par que se desculpa;

no pior dos casos, se atribui a alguma tulpa (*)

essas palavras de escárnio e humilhação.

(*) Companheira interna, de bom ou mau pendor.

 

Que em tal amor recíproca há aceitação,

mesmo no instante da mágoa de uma culpa,

mas que é abrandada pelo favor que exculpa,

sempre pesando o bem maior em gradação.

 

Ai, grande amor, que destoa da paixão:

a esposa é como filha; e seu marido

também se torna em parte filho de sua esposa,

em sentimentos mais gentis que uma emoção,

um dando à outra o quanto lhe é devido

e uma ao outro a demonstrar-se dadivosa...

 

FAREJANDO SOMBRAS I – 7 NOV 21

 

Na solitude da vida quotidiana,

há sempre sombra oculta de mulher,

que seu corpo projetou em dia qualquer,

que um dia se quis e inda a alma inflama.

 

Na melancólica dureza de minha cama,

sem o carinho e companhia que se quer,

braços involvem em um amplexo mistér

esse fantasma que a memória ainda reclama.

 

Não é preciso sofrer separação,

nem necessário que o amor faleça,

a sombra pode se mover no mesmo lar,

 

porém seu corpo mostra alheia projeção,

próxima ausência de que jamais se esqueça,

que um beijo antigo não se pode farejar...

 

FAREJANDO SOMBRAS II

 

Nenhum ósculo haverá que se repita:

um novo beijo só se encontra no futuro,

de forma alguma será algo de seguro

e o beijo antigo já se prende à longa fita

 

da lembrança amontoada que se agita:

corre a memória por esse longo furo

da ampulheta por que escorre o tempo duro,

e ainda o presente em desespero grita,

 

por perceber até que ponto é transitório

e assim o beijo de apenas hora atrás,

que na recordação não se desfaz,

 

se encontra unido nesse sombrio velório

dos dias de ontem e só a sombra espera

de um beijo novo em tal face ainda sincera.

 

FAREJANDO SOMBRAS III

 

Então chegaste e tua sombra projetou-se

contra a parede vazia de meu quarto;

algo ficou de ti, estranho parto:

foi quase um filho que de ti gerou-se.

 

Depois te foste e a sombra conservou-se,

de um resquício de ti meu sonho farto,

breve retalho teu, cinto de esparto,

em que minha solidão dessedentou-se.

 

Guardei tua sombra, em pura exaltação,

outro era o gosto e o cheiro do reboco,

circuncidado por essa esguia rede

 

das próprias fibras de teu coração,

só me restando esse destino louco

de cheirar sombras ao longo da parede...

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